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3 O POSICIONAMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

3.1 A importância da pesquisa empírica para a análise das decisões

Quando se estuda o Direito na seara acadêmica, tende-se a se debruçar sobre inúmeras teorias, doutrinas e interpretações de dispositivos legais que, no cotidiano dos tribunais e da prática jurídica em geral, são encontrados de formas diversas. Diante dessa dupla realidade, percebe-se que o Direito se tornou uma ciência do dever-ser, mas que deve haver o seu envolvimento com a prática, tendo em vista que ele foi criado com o fim de solucionar problemas de pessoas reais, aplicado através do exercício do poder jurisdicional pelos juízes e tribunais.

Nesse contexto, Garapon (1997) ressalta que não é a inexistência de normas, mas a construção de um direito extremamente abstrato e ideal que gera uma anomalia em sua efetivação no campo prático, visto que se torna algo inaplicável,

sendo a causa para o distanciamento do que é previsto nos livros e até mesmo nas normas para o que é vivenciado nos tribunais.

Quanto à abstração do Direito, ela se torna bastante evidente no dia a dia da prática forense, uma vez que, ao propor uma ação, o advogado ou defensor, algumas vezes, tem que contar com a sorte para que ela seja distribuída para uma jurisdição em que o juiz tenha um pensamento favorável à sua tese e, assim, possa obter êxito, pois, caso seja destinada a outro magistrado com convicções diferentes, seus argumentos não serão acolhidos.

No que se refere à pesquisa empírica, esta era, até a década de 1970, pouco explorada no ambiente acadêmico do direito, que tendia a priorizar a teoria pautada no conhecimento doutrinário e normativo. Todavia, somente veio a adquirir mais força entre os anos 80 e 90, em virtude das grandes mudanças no âmbito jurídico, que teve como marco a Constituição Federal de 1988, e no político-social, com a transição da ditadura para a democracia. Outra forte contribuição para o desenvolvimento da pesquisa no Direito associada às ciências sociais foi a consolidação do seu financiamento pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), bem como a criação, em 1992, do Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito (CONPEDI), o qual passou a realizar, anualmente, um congresso nacional com o fim de incentivar a socialização das pesquisas realizadas pelos pós-graduandos em Direito (HORTA; ALMEIDA; CHILVARQUER, 2014).

A fim de esclarecer o que se entende por pesquisa empírica, cumpre trazer a definição de Epstein e Gary (2013), segundo os quais, embora seja comum que esse método seja associado à coleta de dados de campo, através de análises estatísticas ou quantitativas, ele é muito mais abrangente que essa definição. “A palavra ‘empírico’ denota evidência sobre o mundo baseada em observação ou experiência. Essa evidência pode ser numérica (quantitativa) ou não-numérica (qualitativa); nenhuma é mais ‘empírica’ que a outra”, pontuam (2013. p. 11).

Desse modo, o que torna uma pesquisa empírica é a sua realização por meio de observações de dados, que refletem os fatos ocorridos no mundo, que “podem ser históricos ou contemporâneos, ou baseados em legislação ou jurisprudência, ou ser o resultado de entrevistas ou pesquisas, ou os resultados de pesquisas auxiliares arquivísticas ou de coletas de dados primários” (EPSTEIN; GARY, 2013, p. 11-12).

O presente estudo se propõe a realizar uma pesquisa empírica baseada na obtenção de dados jurisprudenciais, com a análise de todas as decisões proferidas pelo STJ brasileiro entre 2007 e 2017 sobre os casos de sequestro de crianças e adolescente no âmbito internacional. Para isso, foram colhidas informações no site oficial do aludido tribunal e se delimitou o período estudado, considerando que o primeiro caso que chegou ao STJ relativo ao tema após a ratificação, pelo Brasil, da Convenção sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional por meio do Decreto Lei nº 3.413, de 14 de abril de 2000, ocorreu em 2007, sendo um dos mais emblemáticos e com maior repercussão pela mídia o caso do menino Sean Goldman, sobre o qual será feita uma análise mais detalhada nos tópicos a seguir.

Diante do exposto, constata-se que, apesar de não existir previsão para que uma pesquisa empírica-jurisprudencial seja desenvolvida de forma mecânica e universal, prima-se, neste estudo, pelo uso dos instrumentos principais para o desenvolvimento desse tipo de pesquisa (PALMA; FEFERBAUM; PINHEIRO, 2012).

Dentre os mecanismos utilizados, sobressaem-se os seguintes: a) recortes jurisprudenciais, que se percebe com a delimitação do tema, do tribunal e do período a ser pesquisado; b) composição da amostra, realizada com a extração de dados do site oficial do STJ, obtendo-se o número de 11 decisões em Recursos Especiais proferidas durante o período de 10 anos, suficientes para uma análise aprofundada sobre o posicionamento adotado pela aludida instância jurídica; c) variáveis de pesquisa, que funcionam como filtros para obtenção das respostas que se pretende com a pesquisa. No presente caso, tem-se como exemplo a idade das crianças envolvidas nas disputas internacionais, o tempo de permanência no Brasil até a propositura da ação de busca e apreensão, a ocorrência de perícia psicossocial no processo, o número de extradições para o país de residência habitual, entre outras; d) organização dos dados coletados, que se deu através da utilização de gráficos. Os números obtidos foram devidamente analisados, não só quantitativamente, mas também qualitativamente (PALMA; FEFERBAUM; PINHEIRO, 2012).

Com isso, através da fixação de parâmetros para análise, busca-se verificar se o STJ, ao atuar nesses casos, tem primado por decisões apegadas ao que está previsto na Convenção de Haia (1980), que determina o retorno imediato de infantes residentes no estrangeiro e que foram trazidos para o Brasil sem autorização de um dos genitores, ou se há uma preocupação com os detalhes de cada caso concreto e

a realização de perícias psicológicas e sociais com a finalidade de resguardar o melhor interesse das crianças e adolescentes envolvidos.

3.2 Mapeamento da experiência do Superior Tribunal de Justiça brasileiro