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5. ANÁLISE SISTEMÁTICA DOS JULGADOS ACERCA DA DEFINIÇÃO DE MERCADO

5.3. A INCONSISTÊNCIA NA DEFINIÇÃO DO MERCADO RELEVANTE NO ÂMBITO DO

5.3.1. A inconsistência na análise do mercado relevante na dimensão do produto

Observando os cenários e argumentos trazidos nas discussões acima mencionadas, num primeiro momento, parece que a definição do mercado relevante na dimensão do produto tanto é factível por uma abordagem mais restrita, por matriz de geração (hidrelétrica, termelétrica, eólica, etc.), quanto por uma visão mais generalista, somente como geração de energia elétrica, sendo ambas possíveis e justificáveis. Dentre os argumentos apresentados nos votos acima mencionados que justificariam a definição do mercado relevante na dimensão do produto de acordo com a matriz energética, isto é, argumentos que evidenciariam que uma termelétrica não compete com uma hidrelétrica, destacam-se:

- o sistema de contratação dos leilões de energia nova: as diretrizes e a sistemática dos leilões de energia nova no Ambiente de Contratação Regulado – ACR, definidas pelo MME, para os leilões realizados até o ano de 2008, estabelecem formas de contratação diferenciada entre fontes, de forma que as usinas hidrelétricas (UHE) foram contratadas através de contratos por quantidade de energia elétrica, enquanto que as usinas termelétricas (UTE) foram contratadas por contratos por disponibilidade de energia elétrica.

- os prazos de contratação nos leilões de energia nova são diferenciados por fonte.

- o preço inicial ou preço-teto nos leilões de energia nova é diferenciado por produto, isto é, por fonte.

- a estrutura de custos de geração é diferenciada por fonte.

- as termelétricas são despachadas pelo ONS em situações de contingência, ou seja, em situações em que as hidrelétricas estariam incapacidades de serem despachadas devido a condições hidrológicas de pouca chuva.

Assim, no âmbito nos leilões de energia nova do Ambiente de Contratação Regulada (ACR), sob a ótica da oferta, haveria justificativas para a diferenciação do mercado relevante na dimensão do produto por fonte.

Por sua vez, os argumentos que justificariam a definição do mercado relevante na dimensão do produto como geração de energia elétrica, numa abordagem mais ampla de mercado, poderiam ser elencados como:

- ainda que nos leilões de energia nova o tipo de contratação seja diferenciado por fonte de geração, isto é, contratos por quantidade de energia elétrica para usinas hidrelétricas e contratos por disponibilidade de energia elétrica para as usinas termelétricas, o tipo de remuneração de cada tipo de contrato estaria atrelado aos custos de geração típicos de cada matriz energética. Desta forma, as usinas termelétricas receberiam seu custo de capital fixo para que ficassem disponíveis ao ONS e seu custo variável, denominado de Custo Variável Único (CVU), quando

efetivamente incorressem em geração. Tanto o vendedor de energia proveniente de usina

hidrelétrica quanto de usina termelétrica, ao contratar energia e não entregá-la, estariam sujeitos às mesmas Regras de Comercialização de Energia Elétrica, tendo que recorrer ao mercado spot ou mercado de curto prazo no âmbito da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) ou comprar contratos por quantidade.

- no âmbito dos leilões de energia nova do ACR, o mercado comprador é único, ou seja, é composto pelo universo das distribuidoras do SIN que declararam sua necessidade de compra de energia ao Ministério de Minas e Energia (MME), para atendimento ao seu mercado consumidor. Tal fato resulta na conclusão de que sob o ponto de vista da demanda é indiferente a fonte geradora de energia elétrica.

Postos os argumentos apresentados pelos conselheiros do CADE em seus votos, bem como pela SEAE, que justificariam cada uma das duas abordagens possíveis, passemos nos parágrafos seguintes a fazer uma análise crítica do que foi exposto buscando encontrar uma direção única de abordagem, de forma a encontrar quais argumentos se sobrepõe ao demais.

Dentre as justificativas apresentadas para a segmentação do mercado relevante por matriz energética, as mais relevantes se apoiam na sistemática de contratação dos leilões de energia nova nos anos de 2007 e 2008, anos em que surgiram as maiores discussões, principalmente em virtude dos atos de concentração envolvendo a Petrobrás.

Sobre tal argumento, cabe notar que as usinas termelétricas envolvidas nos atos de concentração em que a Petrobrás aparece como parte envolvida são todas usinas construídas e instaladas, sendo titulares de autorização. Considerando que os órgãos do SBDC optaram por adotar os critérios dos leilões de energia nova, no âmbito do ACR, fica evidente que tais empreendimentos, por seu status de usina existente não poderiam participar como vendedores dos leilões de energia nova, se não vejamos.

De acordo com o Edital dos leilões de energia nova que ocorreram à época, os empreendedores apresentaram projetos de usinas à Empresa de Pesquisa Energética (EPE), frise-se aqui “projetos”, que em sequencia divulgava quais empreendimentos estavam habilitados tecnicamente a participar do certame. Assim, os vendedores com empreendimentos habilitados tecnicamente de um lado e as distribuidoras de outro, se inscreviam para participar do leilão, pré- qualificando-se para aportar as garantias financeiras de participação.

Constata-se aqui um equívoco de interpretação por parte do CADE ao utilizar os critérios dos leilões de energia nova para definir o mercado relevante em atos de concentração envolvendo usinas em operação comercial, já implantadas.

Ademais, as usinas termelétricas da Petrobrás por se tratarem de empreendimentos já implantados e operando comercialmente, estariam aptas a participar, à época, por exemplo, do 5º Leilão de Energia Existente (A-1, realizado no ano de 2006). Segundo os termos do Edital do Leilão (Edital nº 006/2006), dentre os requisitos que os vendedores deveriam atender para participar do certame estavam ser agente titular de concessão, permissão ou autorização para gerar, importar ou comercializar energia elétrica. Cabe destacar que não havia menção a distinção por fonte, por exemplo, ou seja, não havia restrição ou distinção por fonte para participar do certame, sendo a única condição ser uma “energia existente”. Ademais, todos os vendedores que se sagravam vencedores do certame, deveriam celebrar um Contrato de Comercialização de Energia Elétrica no Ambiente Regulado (CCEAR), na modalidade quantidade de energia, frise-se independente da fonte e com período de suprimento de 08 anos, com início de suprimento em 01/01/2007.

Percebe-se que o critério de segregação do mercado relevante baseado somente no sistema de contratação dos leilões de energia nova mostra-se equivocado visto que os atos de concentração envolvendo o segmento de geração de energia analisados pelo Conselho envolvem

empreendimentos que estão em operação comercial e que podem ter sua energia negociada tanto nos leilões de energia existe, no âmbito do ACR, ou ainda no ACL, não se justificando dessa forma, tal segregação por fontes. Por sua vez, os leilões de energia nova do ACR são direcionados à projetos de usinas que serão futuramente implantadas.

Ademais, as diferenças de contratação entre as fontes nos leilões de energia nova se baseiam no fato de se tratarem de projetos que serão implantados. Daí o fato de o prazo de suprimento e implantação ser diferenciado, levando-se em conta que um empreendimento hidrelétrico possui prazo e custos de implantação diversos de um empreendimento térmico.

Outro ponto relevante é que no Ambiente de Contratação Livre (ACL) tanto as fontes hidrelétricas como as termelétricas com quaisquer tipos de combustível, competem pelos mesmos consumidores em todos os submercados, com contratos na modalidade por quantidade de energia. Por todo o exposto e diante da atual regulamentação vigente do setor, entende-se que o mercado relevante na dimensão do produto para atos de concentração envolvendo empresas do segmento de geração de energia elétrica deve ser definido como geração de energia elétrica e não deve haver segmentação por matriz energética.