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A influência da emissão antrópica do dióxido de

No documento Educação em mudanças climoambientais (páginas 54-59)

Apesar dos estudos de Arrhenius, o consenso dos especialistas era de que o homem e o CO2 não tinham relação com um provável aquecimento da at-

mosfera, mas em 1938 o engenheiro e inventor Guy Stewart Callendar (1898 -1964) pensava de forma diferente. Embora não sendo meteorologista profissi- onal ou cientista, Callendar tinha interesse amador no clima, passando muitas horas reunindo estatísticas do tempo como um hobby.

Mesmo sendo membro, porém sem credenciais acadêmicas, corajosamente Callendar se apresentou diante da Real Meteorological Society em Londres, para falar sobre o clima mostrando números que indicavam o aquecimento glo- bal. Na visão de Callendar, o principal agente causador do aquecimento era as

atividades antrópicas, que durante séculos fez uso da combustão dos recursos fósseis e lançava continuamente CO2 na atmosfera (FLEMING,2007).

O trabalho de Callendar sobre a variação da composição atmosférica ao longo dos períodos geológicos foi significativo. Para sustentar a hipótese do aquecimento da temperatura da Terrra, Callendar calculou: o uso mundial de combustíveis fósseis; os reservatórios estimados de carbono; a absorção do dió- xido de carbono pela biosfera e oceanos; além de compilar medições históri- cas que mostraram um aumento nas concentrações de CO2 atmosférico (FLE-

MING, 1998). Segundo Callendar (1938), 150 bilhões de toneladas de CO2

foram lançadas na atmosfera, durante o último meio século, representando um aumento de 6% nas concentrações desse gás entre 1900 e 1936. Dos seus da- dos, apenas uma pequena parte foi considerada defeituosa, porque seus registros foram obtidos pela comparação entre diferenças de estações vizinhas (IPCC,

2007a).

Especulações e boatos algumas vezes rondam as atividades científicas. Pró- ximo aos anos de 1940 circulava uma grande quantidade de suposições sobre a mudança do clima. Climatologistas e meteorologistas já tinham ouvido muitas ideias vistosas mas pouco utilitárias e nesse sentido, o trabalho de Callendar era inovador. Os seus números e sua teoria proporcionaram um original desa- fio intelectual, real e contemporâneo, pois estudos das eras do gelo estavam em um passado remoto sem uma pesquisa palpável e aparentemente sem nenhum interesse prático (WEART, 2004).

Além da originalidade, os argumentos de Callendar traziam à tona conside- rações de muitos especialistas em mudança climática, de pesquisas em publica- ções antigas e obscuras com medições de CO2 indicando que o nível desse gás

na atmosfera havia subido um pouco desde o início do século XIX. O trabalho de Callendar trazia um problema da Terra para a Terra, muito embora ele tenha pensado como Arrhenius e outros que o aquecimento global seria uma coisa boa para a humanidade ajudando culturas a crescer em abundância (WEART,

2004).

A mudança na opinião de vários cientistas em concordar com Callendar foi lenta e começou a ocorrer quando ele produziu, em 1941, outro artigo tratando de uma revisão das medições espectroscópicas das bandas de absorção do CO2.

Ao longo de duas décadas, Callendar focou seu trabalho na relação entre o dióxido de carbono atmosférico e a temperatura do planeta, influenciando e servindo de referencial teórico para futuras pesquisas. A figura 5 do trabalho de Callendar explicita a evolução da mudança da temperatura de superfície da Terra com absorção de CO2 pela atmosfera.

Figura 5 – O gráfico de Callendar

Fonte: (CALLENDAR,1938)

Após a segunda guerra mundial, o estudo do clima ficou sendo desenvolvido com mais ênfase para fins militares. A Guerra Fria exigia pesquisas militares com diversas finalidades: segurança nacional exigindo a previsão e o controle do clima, hegemonia econômica na produção de inteligência, tecnologia e fa- bricação de armas. Uma tensão provocada por um possível conflito nuclear, suas consequências catastróficas como ondas de frio, calor e a possibilidade do clima ser usado como arma de guerra, através da semeadura de nuvens, eram preocupações recorrentes (ONÇA, 2011).

Um bom exemplo do militarismo climático foi o investimento em pesquisa de computação, que era destinada aos lançamentos de satélites meteorológicos e à elaboração de sistemas de defesa nacional como o Nilo Azul, desenvolvido pelo Departamento de Defesa norte-americano. O Nilo Azul era empregado para testar a sensibilidade do clima em grandes perturbações, incluindo possí- veis intervenções soviéticas direcionadas à guerra nuclear ou ambiental (FLE-

MING,1998). Como se vê, a situação de medo gerada pela Guerra Fria resultou em alguns frutos tecnológicos ligados ao clima.

Outra influência militar foi na meteorologia que se desenvolveu no início do século XX e se intensificou durante as guerras mundiais, com a criação de alguns grupos de pesquisas e empresas do ramo. Com o fim da segunda guerra mundial, muitas delas corriam o risco de ficar inoperantes, então o governo americano decidiu intervir e financiar a pesquisa básica, através de um novo Escritório de Pesquisa Naval. Tal incentivo motivou o desenvolvimento de al- gumas áreas de conhecimento ligadas à mudança climática, a exemplo da Física, das Geociências e da Meteorologia com atenção especial. Motivos não faltavam ao governo para o estudo do clima: a dinâmica dos ventos, previsão do tempo, nuvens, produção de chuva e consequente aumento da produtividade agrícola (FLEMING, 1998; WEART,2004).

Um pesquisador que teve financiamento militar e usou dos resultados dos trabalhos de Callendar foi o físico canadense Gilbert N. Plass. Plass fez parte de um grupo experimental na Johns Hopkins University, que estava estudando a radiação infravermelha apoiado pelo Escritório de Pesquisa Naval. Depois, Plass mudou para a Califórnia com o objetivo de pesquisar armamentos relaci- onados à absorção de calor infravermelho, mas, à noite, escrevia sobre o efeito estufa (WEART, 2004). Nessa época, a tecnologia computacional de ponta era militar, e Plass tinha acesso a ela. Com novos dados e longos cálculos, Plass afirmou que a temperatura média global iria aumentar “à taxa de 1,1°C por sé- culo”, por causa da atividade humana. O trabalho de Plass apontou que, num futuro próximo, o acúmulo de CO2 na atmosfera iria se tornar um sério pro-

blema climático. Segundo Plass (PLASS, 1956, p.387),

Se ao final deste século, as medições mostrarem que as quantidades de dióxido de carbono na atmosfera subiram apreciavelmente e ao mesmo tempo a temperatura continuar a subir pelo mundo, estará firmemente estabelecido que o dióxido de carbono é um importante fator de mu- danças climáticas.

Contudo, os argumentos de Plass não convenceram alguns cientistas, mas ele apresentou a problemática do aquecimento global para um tempo próximo e com consequências negativas, ao contrário do que pensava Arrhenius e Callen- dar.

2.2.1

O dióxido de carbono no ar e no mar

Charles D. Keeling13 realizava grande parte de suas pesquisas no campo, em belas paisagens com montanhas e rios fazendo do monitoramento do nível de CO2 ao ar livre um trabalho agradável. Influenciado pela obra de Plass, Kee-

ling procurou aumentar a precisão das medidas do nível de CO2 na atmosfera

(WEART, 2004; FLEMING, 1998). Keeling construiu seu próprio aparelho de medida e investigou por meses o nível de CO2 contido no ar, nas proximida-

des da Califórnia e da Antártida, e para sua surpresa os locais mais inabitados apresentaram o mesmo nível (KEELING, 1960).

As medições iniciadas por Keeling em 1958, com alta precisão na concen- tração de CO2 atmosférico, constituem uma série importante que documenta a

mudança da composição atmosférica até o ano de 1998. Essa série representa um marco de singular valor, evidenciando o efeito das atividades humanas so- bre a composição química da atmosfera global (WEART, 2004; IPCC, 2007a). Suas medidas do ciclo de carbono global feitas em Mauna Loa no Havaí têm precisão suficiente que propicia aos cientistas separarem as emissões antrópicas daquelas devidas ao ciclo anual natural da biosfera. O trabalho de Keeling con- tribui para demonstrar que existe uma mudança de longo prazo, na troca sazonal de CO2 entre a atmosfera, a biosfera e os oceanos (WEART,2004).

O estudo sobre o carbono avançava e novas técnicas como a detecção por radiocarbono surgiram. O químico Austríaco Hans Suess, perito em radiocar- bono, detectou em 1955 um valor baixo de carbono antigo da queima de com- bustíveis fósseis na atmosfera (IPCC, 2007a). O oceanógrafo Americano Roger Revelle se uniu a Suess, em dezembro de 1955, para estudar o carbono nos oce- anos. Em 1957, os dois escreveram o artigo descrevendo e explicando o com- portamento em larga escala do CO2 antropogênico nos oceanos e na atmosfera

(WEART, 2004).

Nesse trabalho, Revelle e Suess mostraram como e por que os oceanos pos- suem um estoque total de carbono (36 mil Gt), valor que em média é 50 vezes maior do que o estoque atmosférico (730 Gt) (REVELLE; SUESS, 1957). Re- velle e Suess calcularam o ritmo de aumento das concentrações atmosféricas

de CO2 de 2% a 10% por século. Mantida essa tendência, o resultado é um

aumento de 20% a 40% no final do século em comparação às concentrações pré-industriais. Para reforçar esse contexto, existiam ainda as ideias correlaci- onadas ao aquecimento global, como a explosão populacional de Keeling e a crescente industrialização apontada pelo geoquímico Harrison Brown, que re- latou a inserção de uma quantidade colossal de gases estufa no planeta. Tais ideias eram conhecidas por Revelle, que as corroborou escrevendo (REVELLE; SUESS, 1957, p.19),

Os seres humanos estão agora realizando um experimento geofísico em grande escala de um tipo que não poderia ter acontecido no pas- sado, nem ser reproduzido no futuro.

As descobertas foram colaborativas e acumulativas. Revelle14e Suess, como Arrhenius, Callendar, Plass e muitos outros, contribuíram para a descoberta do aquecimento global (WEART, 2004; FLEMING, 1998). Seus esforços e in- teresses fizeram emergir uma preocupação que poderia ter ficado ocultada por décadas, se não houvesse tanta dedicação. Obviamente existiu ajuda de fatores extras, como o investimento militar com largos financiamentos desde a década de 1940 e o próprio desenvolvimento da mídia, cada vez com mais alcance e influência. Assim, os financiamentos para o setor climoambiental foram se alar- gando e se estendendo para outras esferas sociais, a exemplo da política, pes- quisa, ambientalismo, sustentabilidade e educação ambiental (WEART, 2004;

FLEMING, 1998).

No documento Educação em mudanças climoambientais (páginas 54-59)