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4. OCUPAÇÃO DO CERRADO PIAUIENSE

4.1. A influência do agronegócio na ocupação do cerrado piauiense

De acordo com Câmara (1996), a expansão da cultura da soja foi a principal responsável pela introdução do conceito de agronegócio no país, não só pelo volume físico e financeiro envolvido, mas também pela necessidade da visão empresarial de administração da atividade por parte dos produtores, fornecedores de insumos, processadores da matéria-prima e negociantes, de forma a manter e ampliar as vantagens competitivas da produção. Entretanto, essa expansão se deu de forma excludente, onde a visão capitalista se fez presente e a mão-de-obra foi utilizada como mecanismo de exploração.

Na visão de Monteiro e Ferreira (2010), a estratégia de ocupação dos cerrados desempenhou um papel importante nas decisões do governo federal, pois consistia em alternativa para prosseguir com o Projeto Brasil Grande Potência. Com esse objetivo, realizou investimentos em infraestrutura, instituiu programas de crédito subsidiado, incentivou a extensão rural e a pesquisa através da EMBRAPA, transformando, assim, os cerrados no maior produtor de grãos, onde teve maior destaque a soja e a pecuária extensiva destinada à exportação (MONTEIRO e FERREIRA, 2010).

As figuras que seguem ilustram a o aumento da produção agrícola em grande escala, com o uso de tecnologias. De fato, há um grande avanço na produtividade, evidenciando o papel da tecnologia nessa aceleração da exploração dos solos no país. Deve-se destacar, no entanto, que esse modelo de exploração traz no seu bojo uma série de consequências ao ambiente natural, como apontam Cunha et al. (2008), quando afirma que a expansão da agricultura tem sido feita com uso intensivo de agrotóxicos, fertilizantes e corretivos, irrigação sem controle, monoculturas e culturas em grande escala, uso inadequado de fatores de produção, traduzido, neste caso específico, no emprego de alta tecnologia química e pesada mecanização. Tanto a cultura em larga escala quanto a monocultura, excluem os representantes da agricultura familiar, que não dispõem de recursos para aquisição de grandes quantidades de terras e das tecnologias necessárias para a inserção nesse processo produtivo. Trata-se de um modelo excludente, que acirra cada vez mais a

concentração de capital em uma minoria privilegiada que compõe a classe dos empresários do agronegócio.

Figura 4: Evolução da produção de grãos 1960-2010

Fonte: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA, 2010).

Os interesses da elite sobressaem nesse processo de ocupação, onde a busca pelo acúmulo exacerbado de capital desconsidera qualquer possibilidade de se colocar em primeiro plano o desenvolvimento das potencialidades locais com a participação ativa dos habitantes já existentes, conforme apontado por Elias (2008),

Novas regiões produtivas agrícolas, as quais denominamos de

arranjos territoriais produtivos agrícolas. [...] Tal realidade acirra a

funcionalização dos espaços agrícolas e leva à difusão de especializações territoriais produtivas, denotando-se inúmeras seletividades,seja da organização da produção, seja da dinâmica do próprio espaço agrícola. A formação destas regiões produtivas agrícolas obedece aos interesses dos agentes hegemônicos que estão à frente de tais processos, empresas agrícolas nacionais e multinacionais, e isso significa que não seguem necessariamente às divisões políticas administrativas estabelecidas, nem mesmo aos interesses locais, regionais ou mesmo nacionais (ELIAS, 2008, p 02).

E nessa perspectiva, esses arranjos produtivos agrícolas beneficiam diretamente grupos minoritários da elite, deixando sem alternativas as pessoas vulneráveis do ponto de vista socioeconômico, que ficam sujeitos a trabalhar em condições precárias e recebendo, como salários, valores irrisórios em comparação aos lucros obtidos pelas empresas agrícolas. Isso é consequência do modelo econômico predominante nas últimas décadas no Brasil, apresentado por Elias (2008), como um modelo de inserção passiva do país à economia e consumo globalizados, cujo objetivo maior é atrelar as áreas e

setores econômicos considerados mais competitivos do país à dinâmica do mercado mundializado.

E, como se observa na Figura 5 abaixo, em 2010, o setor do agronegócio já mantinha uma significativa participação no mercado internacional, atendendo, assim, os anseios dos capitalistas, que estão voltados para a obtenção de lucros.

Figura 5: Principais destinos das exportações do agronegócio Brasileiro

Fonte: MAPA (2010).

De modo geral, os interesses predominantes na ocupação do cerrado brasileiro convergem para a busca de acúmulo de capital e da inserção do país no mercado exterior. Porém, de acordo com Monteiro e Ferreira (2010), tal ocupação “ocorreu de forma diferenciada em função das distintas especificidades institucionais, econômicas e políticas do Brasil, inclusive com relação aos biomas”. A década de 1970 marcou o início da ocupação e uso dos Cerrados piauienses, tal como foi colocado acima e que foi possível pelos condicionantes naturais e arranjos institucionais dos Estados nacional e estadual, embora tenha sido efetivada somente nos anos de 1990, com a implantação de um significativo pólo agrícola moderno centrado na produção de grãos, especialmente, soja (MONTEIRO e FERREIRA, 2010).

Para Leal (2013), o agronegócio e toda a sua cadeia produtiva visam à ampliação de capital e sua reprodução, desconsiderando histórias de grupos sociais existentes naquele espaço selecionado pelo capital, utilizando estes como mera condição para extrair mais valia. É nessa perspectiva que se pode afirmar que a simples geração de um ou outro emprego pelas grandes empresas que se instalam em municípios para exploração da terra não significa oportunidade real de emprego e melhoria da qualidade de vida da comunidade local, pois a maioria dos empregos são oferecidos em condições precárias, pelos quais se pagam baixos salários.

Na visão de Reydon e Monteiro (2012), a ocupação do cerrado piauiense, ao invés de corrigir o padrão de ocupações com grandes propriedades, como as ocorridas no restante do País, as reproduziu de forma mais acentuada. Isso ocorreu, sobretudo, devido à decisão do Governo do estado do Piauí em tornar a região um significativo pólo de agricultura comercial, e por isso incentiva o uso de mecanismos estatais de financiamento à agropecuária e institui políticas de favorecimento à obtenção de suas vastas áreas de terras disponibilizadas através da Companhia de Desenvolvimento do Piauí (COMDEPI) a preços ditos “simbólicos” (REYDON e MONTEIRO, 2006).

Na década de noventa, com a soja já consolidada no cerrado dos estados vizinhos –Maranhão e Bahia, o sudoeste do Piauí se transformou na nova fronteira da agrícola da cultura da soja no Brasil (REYDON e MONTEIRO, 2006). E a presença de corporações multinacionais exportadoras de grãos, grandes produtores agrícolas, agências bancárias, de insumos, entre outros, colocam as cidades dos fronts agrícolas em contato direto com os grandes centros econômicos nacionais e internacionais (FREDERICO, 2009). Todos esses fatores contribuíram para uma ocupação concentrada, que privilegiou os detentores de maior poder aquisitivo, deixando excluídos aqueles em condições econômicas desfavoráveis, como se observa no subcapítulo a seguir: