• Nenhum resultado encontrado

A informação educativa vs informação-espectáculo

CAPÍTULO III INFORMAÇÃO EM TELEVISÃO

3.3. A informação educativa vs informação-espectáculo

Por princípio ético a informação televisiva tem como tarefa fornecer um relato imparcial e verídico dos principais acontecimentos do país e do mundo. Segundo Veruska Góis (2010, p.9) “o pressuposto da cobertura jornalística corresponde a alguns direitos constitucionalmente garantidos: o direito à livre expressão e à informação”. Se por um lado, os meios de comunicação são livres para transmitir nas suas grelhas de programação, por outro lado, ao cidadão deve ser assegurado o acesso a uma informação democrática.

Contudo, a lógica empresarial e de negócio dos próprios meios de comunicação social onde um dos principais objectivos é o lucro comercial leva a que a informação e a imagem sejam tratadas como mercadorias. Estas devem por isso ser apelativas para um maior consumo. Com efeito, Francisco Cádima (1999, p.115) argumenta que “em termos de informação, o alinhamento clássico dos telejornais fragmentou-se, recorrendo com alguma frequência ao mais puro tablóidismo. Por vezes, os telejornais aparentam dar mais relevo ao «social» mas quase sempre numa perspectiva não contextualizada, explorando casos e misérias humanas”.

Para James Curran e Jean Seaton (1997) deve ser o serviço público a relatar as notícias de forma imparcial e a cobrir devidamente os assuntos públicos. Desta forma, as audiências são verdadeiramente informadas para exercer os seus direitos e deveres enquanto cidadãos de um sistema democrático. “Pelo contrário, os meios de comunicação conduzidos para o mercado têm tendência para escolher as notícias a favor do entretenimento e oferecem «info-entretenimento» em vez de análises informativas e seguem agendas privadas e partidárias” (Curran,J&Seaton,J, 1997, p.396).

30 Para Nilza de Sena (2007, p.5129) é a informação televisiva de serviço púbico que deve assegurar uma informação competitiva mais “sóbria, equilibrada, plural e autónoma que evite o populismo por mais compensador que este seja em termos publicitários e comerciais, já que contraria a sua própria lógica conceptual”.

Adriano Duarte Rodrigues (1980, p.26) sugere que "os meios de comunicação social tendem, a partir de um certo limiar de saturação, a converter as mensagens em puro espectáculo e a desmobilizar efectivamente as pessoas”. Para este autor, os noticiários devem retirar do seu alinhamento grande parte das notícias trágicas onde o drama humano é explorado até à saturação, pois só assim o telespectador voltará a ver os telejornais como um produto informativo e educativo. Devem existir programas específicos que não os telejornais que separem informação e espectáculo confinando o drama humano a espaços que lhe estão destinados.

Para Carla Cruz (2008), apesar de já se ter ultrapassado o mito da neutralidade e da objectividade absolutas no tratamento noticioso, a televisão a nível informativo continua a ter uma responsabilidade social acrescida, visto que, a imagem mostra os factos aliados aos sons. É, neste sentido, que a televisão “determina as formas de orientação da atenção pública, a agenda de temas dominantes, a hierarquização da relevância destes temas e a capacidade de descriminação temática que os indivíduos manifestam” (Saperas,1993, p.49).

Na opinião de Nuno Brandão (2008), a informação televisiva deve desvalorizar as tendências de promoção do impacto da imagem choque, da visão mercantilista e de espectáculo e valorizar o bem social e o progresso cívico. No actual jornalismo televisivo prevalece a “encenação dos efeitos das notícias sobre a análise das suas causas; a encenação da informação que toma o lugar da contextualização das suas notícias; e as visões simplistas da realidade, nas quais a «forma» se sobrepõe aos seus «conteúdos», e a dimensão «ritualista» dos seus telejornais se sobrepõe ao seu «valor informativo»” (Brandão, 2008, p.5131). Devido às fronteiras actuais entre informação e espectáculo serem muito ténues, é necessário assumir uma ideia correcta de racionalidade (importância da cultura jornalística e relevância na estrutura e selecção dos valores-notícia) no actual jornalismo de modo a permitir um verdadeiro exercício de cidadania.

Para João Canavilhas (2001, p.8), o telespectador quer o acontecimento “embrulhado em papel de espectáculo e os empresários televisivos vibram graças ao crescimento de audiências que isso lhes proporciona”. Sendo a matéria-prima, ou seja, a informação igual em todos os canais, torna-se necessário mostrar diferentes perspectivas desse mesmo assunto e por isso a informação torna-se assim num espectáculo que procura no sensacionalismo e na rapidez, os ingredientes que fazem subir as audiências, nem que isso seja conseguido à custa de imprecisões.

31 Canavilhas (2001) defende que a espectacularização da notícia resulta no domínio da informação-espectáculo na televisão que dá prioridade ao insólito, ao excepcional e ao chocante. Para isso recorre a vários elementos de espectacularização: selecção de dramas humanos (desde a exploração dos sentimentos mais elementares como os de insatisfação das necessidades básicas nomeadamente as fisiológicas e as de segurança às emoções sentidas pelos indivíduos a quando da reportagem ou do directo); aposta na dramatização (exploração dos gestos, da expressão facial e verbal); e manipulação de imagens com recurso a efeitos visuais através da montagem e da pós-produção.

Para este mesmo autor, a informação-espectáculo está formatada em determinados eixos que a tornam “falaciosa e especulativa” (Canavilhas, 2001, p.8). Esses eixos determinam-se no sensacionalismo (misturando ingredientes como sangue, sexo, dinheiro, o aparentemente inesperado, o falso exclusivo e o surpreendente, a informação-espectáculo obtém a fórmula que faz subir audiências); na ilusão do directo (a maximização da emoção é transmitida via informação em tempo real); na uniformização (o directo aposta nas imagens colhidas em bruto, restando apenas liberdade para comentários e a falta de referências conduz à uniformização do comentário e à redundância, já que o acontecimento é apenas o momento); e por fim, nos efeitos perversos da informação-espectáculo (o julgamento "à priori", ou seja, a informação ao ser mais rápida do que a Justiça, faz com que o telespectador seja induzido a efectuar o seu próprio juízo, fazendo com que o próprio julgamento de determinada situação fique desde logo condicionado).

Canavilhas (2001, p.9) conclui que a necessidade de informar mais rapidamente e com mais pormenor leva à “incansável procura de factos que faz com que alguma informação se assemelhe perigosamente a uma farsa”. As inovações tecnológicas permitem que a duração de um noticiário seja uma volta ao mundo com a demonstração de imagens de desgraças, cadáveres, escândalos e catástrofes. As notícias resumem-se aos factos e os enquadramentos sociopolíticos caem para segundo plano, o que faz com que informação- espectáculo vença assim a informação-educação.

Já na perspectiva de Dominique Wolton (1990), o público filtra, selecciona, rejeita e assimila apenas a informação que lhe convém. A partir deste postulado, este mesmo autor defende que uma vantagem da informação-espectáculo poderá ser a forma como ela transmite ao telespectador os limites do aceitável. Em vez de criar um hábito, a repetição de determinadas imagens poderá alertar para o excesso. Existe assim uma tomada de consciência de que as televisões estarão no limiar do permitido pelo telespectador.

Na dicotomia da informação como produto credível e informação alicerçada no espectáculo é preciso repensar o papel do jornalismo na sociedade pós-moderna, onde os valores estéticos de sedução imperam no mercado consumidor. É necessário “deixar de

32 lado a estética do hiper-real, a tragédia no jornalismo pós-moderno e reinserir os factos nos seus contextos políticos, económicos e sociais” (Bill, 2010, p.6). Atender aos desejos do público restringe o jornalismo a um mero produto a ser consumido e não mais como um meio de comunicação, interpretação e intervenção na realidade, ou seja, “é preciso fazer o caminho inverso e desespectacularizar o jornalismo, voltando a centrá-lo nas questões da sociedade e não do indivíduo” (Bill, 2010, p.7).

Anelise Rublescki (2009) reforça a ideia de que o jornalismo pós-moderno, na sociedade espectáculo prevalece a lógica da publicidade, do lucro e do entretenimento sobre a linguagem, a informação e o texto jornalístico. No jornalismo pós-moderno tudo é imagem, interactividade, fragmentação. A estética da imagem toma o lugar do texto e do argumento. Configura-se um jornalismo voltado para o público mas não se assegura a responsabilidade social pelos meios de comunicação de massa e “a sociedade – seduzida - consome o próprio espectáculo, sobram aplausos, faltam críticas” (Rublescki, 2009, p.9).

33

Documentos relacionados