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Breve resenha histórica da Análise de Conteúdo

CAPÍTULO V METODOLOGIA ADOPTADA

5.1. Análise de Conteúdo

5.1.1. Breve resenha histórica da Análise de Conteúdo

A análise de conteúdo, como instrumento científico, tem sofrido evoluções e apresenta um percurso histórico:

- A arte hermenêutica e da retórica: a hermenêutica relaciona-se com a arte de interpretação de textos sagrados, com mensagens misteriosas, de significação profunda, que interessam desvendar. A retórica relaciona-se com a prática de observação de um discurso, de um conteúdo, estudando “as modalidades de expressão mais propícias à declamação persuasiva” (Bardin,1979, p.14);

- Pesquisa realizada na Suécia em 1640, pesquisa realizada por B.Boubon entre 1888 e 1892 e pesquisa realizada por Thomas e Znaniechi entre 1908 e 1918: a primeira foi realizada sobre hinos religiosos com objectivos de analisar os diferentes temas religiosos, os seus efeitos, os seus valores e a sua complexidade estilística. A segunda pesquisa incidiu sobre uma parte da Bíblia, o “Êxodo”, com objectivo de efectuar uma classificação da temática das palavras-chave, ilustrando a expressão das emoções e das tendências da linguagem. A terceira pesquisa teve como objectivo o estudo da integração dos emigrantes polacos na Europa e nos E.U.A, baseando-se na análise de documentos oficiais e pessoais;

- Século XX e a Escola de Jornalismo da Colômbia: nesta época a análise de conteúdo conhece progressos significativos, com esta escola a elaborar os primeiros estudos quantitativos de jornais, que obedecem a determinados critérios científicos. Estes critérios relacionam-se com “um inventário das rubricas, segue-se a evolução de um órgão de imprensa, mede-se o grau de sensacionalismo dos artigos, comparam-se os semanários rurais e os diários citadinos. Desencadeia-se um fascínio pela contagem e pela medida (superfície dos artigos, tamanho dos títulos, localização na página)” (Bardin, 1979, p.15);

- Primeira Guerra Mundial: estudo de propaganda de Lasswell nos anos 20: esta época marca a realização de estudos relativos a mitos e símbolos políticos e também sobre a propaganda, defendendo-se a medição e quantificação dos elementos que aparecem nos documentos;

- Segunda Guerra Mundial (anos 30-40): nesta altura acentua-se o desenvolvimento da análise de conteúdo com o governo americano a criar incentivos para estimular estudos na área com objectivo de desmascarar jornais que utilizavam propaganda subversiva. Para isso utilizaram-se processos de despistagem, nomeadamente, referenciação dos temas

45 favoráveis ao inimigo e percentagem destes em relação ao conjunto de temas; comparação entre o conteúdo do jornal incriminado com o das emissões nazis destinadas aos E.U.A; comparação de duas publicações suspeitas (Today´s Challenge e Forum Observer) com duas publicações cujo patriotismo era evidente (Reader´s Digest e Saturday Evening); análise de favoritismo/desfavoritismo de vários livros e periódicos em relação aos dois temas seguintes “A União Soviética vence” e “As doutrinas comunistas são verdadeiras”. Neste período, a análise de conteúdo incidia ainda em duas áreas - literatura, com análise do romance autobiográfico Black Boy de Richard Wright em 1947, onde se efectuou uma análise estatística dos valores contidos na obra e na psico-sociologia com a análise das Cartas de Jenny analisadas por Baldwin Allport Paige onde foi efectuada uma análise de estrutura de personalidade;

- Anos 40/50: segundo Berelson (1952) a análise de conteúdo é uma técnica de pesquisa que visa a descrição objectiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto da comunicação. O contributo de Berelson (1952) marca a preocupação em trabalhar com amostras reunidas de maneira sistemática, a interrogar-se sobre a validade do procedimento e dos resultados, a verificar a fidelidade dos codificadores e até medir a produtividade da análise. É o período significativo de uma prática com uma metodologia nascente, onde as exigências de rigor e de objectividade pressentidas adquirem um carácter obsessivo, susceptível de encobrir outras necessidades ou possibilidades;

- Anos 50/60: nesta altura assiste-se à expansão das aplicações da análise de conteúdo, acentuando-se o debate entre análise quantitativa e qualitativa. A análise quantitativa busca a descrição ou frequência de determinadas características e a análise qualitativa tem como objectivo a noção de inferência, ou seja, a dedução que se retira dos fenómenos;

- A partir de 1966: a generalização do uso do computador veio potenciar o desenvolvimento e a utilização da análise de conteúdo. O computador veio permitir o tratamento de grandes quantidades de dados de uma forma rápida. A partir desta altura, a análise de conteúdo desenha os seus últimos contornos para se transformar efectivamente numa técnica de pesquisa sistemática (no sentido em que fornece apenas algumas informações sobre um dado fenómeno e não uma exposição exaustiva sobre o mesmo, tendo em vista a generalização das conclusões) de mensagens dependentes do modo científico.

Hoje em dia, há uma certa unanimidade quanto ao carácter quantitativo da análise de conteúdo. Assim, as características desta técnica podem resumir-se à: quantificação, objectividade e sistematização da informação, isto é, a organização dos dados brutos, conferindo-lhes um significado através da interpretação.

46 No entanto, apesar das definições de análise de conteúdo já aqui apresentadas revelarem uma certa polémica quanto às potencialidades da técnica, particularmente no que diz respeito às dicotomias conteúdo manifesto/conteúdo latente ou denotação/conotação nas suas entrelinhas, e apesar da análise de conteúdo ser, como já dissemos, uma técnica marcadamente quantitativa, não devemos esquecer que todo o conteúdo manifesto deve ser reportado ao seu contexto próprio. Devemos, portanto, procurar ir para além da denotação, extrapolando, como disse Daniel Riffe (1998), da comunicação para o seu contexto. É nesta procura pela contextualização que consiste o acto de inferência, como afirmam Krippendorf (1980) ou Laurence Bardin (1979). Também Hugo Silvestre e Joaquim Araújo (2011, p.206) defendem que a análise de conteúdo “permite que as categorias emerjam dos dados, reconhecendo a importância do contexto”.

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