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Capítulo 2 – O Processo de Integração Regional em África

2.2.1. A Integração africana e o Pan-africanismo

Para uma melhor compreensão da problemática da integração regional no continente africano, torna-se importante, desde logo, conhecer como sucedeu o processo de integração política no continente, num plano suprarregional. Assim, em primeira mão, importa analisar como foi fundada a Organização da Unidade Africana (OUA) e, de seguida, como ocorreu a transformação desta na União Africana (UA).

Com efeito, para se perceber quais as origens da União Africana, importa realçar e compreender o movimento que ficou conhecido como Pan-africanismo, surgido nos finais do século XIX, e criado com o objectivo último de combater a subjugação política do povo negro e os vestígios da escravatura. A crença fundadora desse movimento consistiu na partilha comum dos povos negros no que tocava às suas culturas, aos seus problemas e objectivos. Era imperioso que a partir desta base os negros se unissem para atingir esses mesmos objectivos comuns. O Pan-africanismo tornou-se, assim, numa forte alavanca na luta pela independência dos povos africanos. Facto é que a imposição colonial em África jamais fora aceite pelos povos africanos de forma passiva, concitando resistências fortes em algumas partes do continente (AYITTEY, 2010). Fora do continente, assistia-se a uma escalada da resistência contra a escravatura o que, a par da causa colonialista, veio a culminar na criação do movimento pan-africanista durante o século XX.

Figuras como Henry Silvester Williams, Edward Wilmot Byden, W.E.D. Du Bois ou Marcus Garvey, verdadeiros promotores de conferências, de palestras e de debates vários na década de 1900, tiveram como principal escopo o de dar uma voz ao povo negro, impulsionando assim o movimento negro, sobretudo nos Estados Unidos, fazendo vingar no seio do movimento pan-africanista uma firme vontade de apoiar a causa da libertação do continente africano. Com este impulso inicial, passou a desenvolver-se na filosofia pan-africanista duas correntes na luta pela causa africana: desde logo, fortaleceu-se o Pan-africanismo Continental que viria a constituir-se na frente mobilizada para impulsionar a unidade dos estados e povos em África, via união política ou da cooperação; e por outro, fortificou-se a Diáspora Pan-africana que

retinha os ideais originais do pan-africanismo ligados à solidariedade entre os negros e descendentes africanos, fora do continente (AYITTEY, 2010, p. 89).

Entretanto, uma onda de acontecimentos acelerou as independências dos povos africanos. Assim é que, a partir de 1945, personalidades pan-africanas como Kwame Nkrumah, George Padmore e Julius Nyerere iniciaram um processo de tomada de consciência e de luta em prol de uma maior justiça social, pela liberdade de imprensa, pela liberdade de expressão e por uma democracia parlamentar para todo o continente. Este processo de consciencialização e de luta levou a que, em 1957, o Gana se tenha tornado no primeiro país independente da África subsaariana e Kwame Nkrumah no seu Primeiro-Ministro. Com a independência do Gana, Nkrumah entendeu continuar com a mesma visão pan-africana na luta pela libertação dos restantes povos africanos do jugo colonial, defendendo e fazendo comungar a idea- sentimento assente na afirmação de que a independência do Gana estaria incompleta se os restantes povos africanos não alcançassem o mesmo estatuto.

Para dar impulso a este objectivo, Nkrumah apontou George Padmore para criar um Secretariado Pan-africano, como um dos núcleos do governo ganense. Este Secretariado levou à criação da União Política Continental entre 1958 e 1961, crucial para o advento das independências africanas que se seguiram. Assim é que, a partir de 1960, 17 países africanos ganharam a sua independência e, até finais de 1963, cerca de 80% do continente africano já era independente. O objectivo principal de Nkrumah era o de estabelecer uma União de Estados da África com base numa estrutura de poder centralizador, não obstante o facto desta ideia ir contra o que muitos líderes dos novos países africanos defendiam.

Durante as conferências pan-africanas que ocorreram na década de 1960, num contexto de Guerra Fria, as atenções estavam centradas na intensificação da luta política para a libertação do jugo colonial, não se tendo levado a questão do desenvolvimento económico para o cerne dos debates e da luta política de então, apesar da sua extrema importância para o continente. Na realidade, os dirigentes dos novos estados independentes limitaram-se a concentrar as suas atenções e forças na resolução dos problemas ligados às questões territoriais, tais como aquelas que eram

impostas pela necessidade de unificação de grupos étnicos e regionais, de fortalecimento dos seus partidos, de posicionamento político frente às suas oposições, de segurança contra golpes de estado, etc. (ASANTE, 2010).

Com este pano de fundo, cedo, começaram a sugir tensões que decorriam da questão de saber como deveria ser encarado o futuro do movimento integracionista do continente africano. Em 1961, países como o Gana, Guiné, Egito, Mali, Marrocos, Líbia e Governos como o argelino no exílio formaram o que ficou conhecido como o “Grupo Casablanca”, enquanto outras antigas colónias francesas, juntamente com a Nigéria, a Etiópia, a Libéria e a Serra Leoa constituíram o que, então, os seus fundadores chamaram de “Grupo Monróvia”. Resumidamente, o “Grupo Casablanca” defendia uma forte união política, inspirando-se nos Estados Unidos da África, conclamados por Nkrumah. Esse grupo militava pelos ideais do Pan-africanismo, do socialismo e do não-alinhamento, defendendo um desenvolvimento económico centralizado em nome da honra africana. O “Grupo de Monróvia”, por sua vez, tendia para a defesa de uma confederação flexível de estados africanos, soberanos e independentes, com base na cooperação voluntária no âmbito da cultura e da economia. Os seus membros temiam que as suas soberanias fossem postas em causa e, em nome da integridade territorial, defendiam a não ingerência nos assuntos internos de cada estado (ASANTE, 2010).

Assim é que, em Maio de 1963, representantes de 32 nações africanas (da África do Norte e da África subsaariana) encontraram-se em Adis Abeba (Etiópia) e fundaram a “Organização para a Unidade Africana” (OUA) com base numa federação de estados africanos independentes e seriamente comprometidos em estabelecer uma extensa cooperação a nível continental (AYITTEY, 2010).

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