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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.2 A INTEGRAÇÃO CURRICULAR E A FORMAÇÃO HUMANA INTEGRAL

O ensino médio, última etapa da educação básica, constitui-se em um direito social e subjetivo, vinculado a todas as esferas e dimensões da vida, devendo contribuir para que os estudantes entendam, de forma crítica, a sociedade em que vivem e a sua relação com a natureza (FRIGOTTO, 2005). Nesse sentido, não se trata apenas de dominar os conhecimentos científicos e tecnológicos, faz-se necessário, também, que o ensino médio contribua para a formação de cidadãos éticos, críticos, criativos e conscientes do mundo em que vivem, de tal forma que tenham condições de agir de forma responsável na sociedade.

A possibilidade de integração entre formação geral e técnica no ensino médio, visando a uma formação integral do ser humano é “[...] condição necessária para a travessia em direção ao ensino médio politécnico e à superação da dualidade educacional pela superação da dualidade de classes” (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p. 45). Trata-se de desenvolver “[...] os fundamentos das diferentes ciências que facultem aos jovens a capacidade analítica tanto dos processos técnicos que engendram o sistema produtivo quanto das relações sociais que regulam a quem e a quantos se destina a riqueza produzida” (FRIGOTTO, 2005, p. 74).

Para compreendermos o que é integrar, devemos remeter este termo não apenas à forma de oferta do ensino médio articulado com a educação profissional, mas também como um tipo de formação plena, que possibilite ao educando a compreensão das partes no seu todo ou da unidade no diverso (CIAVATTA, 2005; 2014). A integração expressa uma concepção de formação humana integral, compreendida a partir de três conceitos estruturantes: a) o trabalho, como princípio que organiza a base unitária do ensino médio; b) a ciência, que apresenta os conhecimentos que fundamentam as técnicas; e, c) a cultura - síntese da formação geral e da formação específica por meio das diferentes formas de criação existentes da sociedade (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2004). Esses três conceitos estruturantes - trabalho, ciência e cultura - devem estar inseridos em todas as dimensões da vida.

Um projeto de ensino médio integrado ao ensino técnico tendo como eixos o trabalho, a ciência e a cultura, deverá buscar a superação da dualidade entre a formação geral e a formação profissional, deslocando o foco de seus objetivos do mercado de trabalho para uma

formação humana, laboral, cultural e técnico-científica (RAMOS, 2005; CIAVATTA; RAMOS, 2012). A articulação entre a educação profissional técnica de nível médio e o ensino médio, na forma integrada, sugere que a educação geral se torne parte inseparável da educação profissional em todos os campos onde se dá a preparação para o trabalho, focando-o como princípio educativo (CIAVATTA, 2005).

Ciavatta e Ramos (2012) explicam que o trabalho como princípio educativo afirma-se

[...] como fundamento da concepção epistemológica e pedagógica que visa a proporcionar aos sujeitos a compreensão do processo histórico de produção científica, tecnológica e cultural dos grupos sociais considerada como conhecimentos desenvolvidos e apropriados socialmente, para a transformação das condições naturais da vida e para a ampliação das capacidades, das potencialidades e dos sentidos humanos. Ao mesmo tempo, é pela apreensão dos conteúdos históricos do trabalho, determinados pelo modo de produção no qual este se realiza, que se pode compreender as relações sociais e, no interior dessas, as condições de exploração do trabalho humano, assim como de sua relação com o modo de ser da educação (CIAVATTA; RAMOS, 2012, p. 31-32).

Nesse sentido, partindo de uma concepção ético-política, Frigotto (2005) explica que o trabalho deve ser entendido como princípio educativo pelo fato de que os seres humanos são “seres da natureza” (FRIGOTTO, 2005, p. 60) e que essa relação possibilita a sua existência e permanência no mundo. O autor ressalta a importância de se socializar, desde a infância, que a tarefa de prover a subsistência, e outras esferas da vida pelo trabalho, é comum aos seres humanos, de forma a conscientizar meninos e meninas de que todos fazem parte desse processo, a fim de se evitar que possam explorar e viver do trabalho dos outros.

O currículo integrado organiza o conhecimento e desenvolve o processo de ensino- aprendizagem de forma que os conceitos sejam apreendidos como sistema de relações de uma totalidade concreta que se pretende explicar/compreender (BRASIL, 2007). Nessa perspectiva, Ramos (2005), explica a proposta de integração aqui defendida:

[...] possibilitar às pessoas compreenderem a realidade para além de sua aparência fenomênica. Sob essa perspectiva, os conteúdos de ensino não tem fins em si mesmos nem se limitam a insumos para o desenvolvimento das competências. Os conteúdos de ensino são conceitos e teorias que constituem sínteses da apropriação histórica da realidade material e social pelo homem (RAMOS, 2005, p. 114).

Partindo de tal proposta, a autora apresenta dois pressupostos filosóficos que fundamentam a organização curricular na perspectiva acima apresentada: o primeiro deles é a concepção de que o homem é um ser histórico social que age sobre a natureza, produzindo conhecimentos

como “síntese de transformação da natureza e de si próprio” (RAMOS, 2005, p. 114). Nesse sentido, “[...] o trabalho é a mediação ontológica e histórica na produção do conhecimento” (RAMOS, 2005, p. 114). O segundo, parte do princípio de que “[...] a realidade concreta é uma totalidade, síntese de múltiplas relações” (RAMOS, 2005, p. 114). Decorrente dos dois pressupostos analisados, a autora destaca um terceiro princípio, que busca “compreender o conhecimento como uma produção do pensamento pela qual se apreende e se representam as relações que constituem e estruturam a realidade objetiva” (RAMOS, 2005, p. 115).

Compreender o currículo integrado como aquele que se baseia na compreensão do real como totalidade histórica e dialética significa entender que o ensino médio, integrado à educação profissional, deve ter como objetivo central a formação de pessoas que compreendam a realidade em que vivem e que possam, também, atuar como profissionais (RAMOS, 2005). Assim, a organização de um currículo que seja realmente integrado possibilita a formação do indivíduo em suas múltiplas capacidades: trabalhar, viver coletivamente e agir, de forma autônoma, ética e responsável sobre a realidade, de forma a contribuir para a construção de uma sociedade mais justa e fraterna (ARAUJO; FRIGOTTO, 2015).