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2. COMPREENDENDO A INTERDISCIPLINARIDADE, O TRABALHO COLABORATIVO E OS

2.1. Interdisciplinaridade

2.1.4. A interdisciplinaridade na escola

Para discutir o tema interdisciplinaridade no ambiente escolar torna-se necessário compreender a dupla visão que tem sido gerada em torno das finalidades da interdisciplinaridade. Segundo Lenoir (1998), uma das visões sobre os fins da interdisciplinaridade apresenta um enfoque conceitual ou acadêmico e a outra, um enfoque instrumental.

Na perspectiva conceitual ou acadêmica do fato, a atenção está voltada para a ordem filosófica e epistemológica, cuja finalidade se volta para uma definição única para interdisciplinaridade, buscando a unificação do saber. A segunda perspectiva, segundo Sinarcur (1983), defende ser a interdisciplinaridade “a integração social do conhecimento, [é o] atual elemento constitutivo do poder, e o poder se interessa essencialmente pelo saber aplicável, capaz de, sozinho, guiar-se dentro da formulação de programas que articulem seu exercício” (SINARCUR, 1983 apud LENOIR, 1998, p. 46). Desta forma, a interdisciplinaridade pode ser vista como uma prática particular que direciona e tende a solucionar os problemas da existência cotidiana atual (FOUREZ, 1992 apud LENOIR, 1998).

Lenoir (1998), apoiado nas ideias de Apostel e Vanlandschoot (1994), afirma que essas duas visões apresentam aspectos continentais sendo que a primeira perspectiva tem influência europeia e a instrumental tem marcas anglo-saxônicas. Ambas tem sido motivo de preocupação e caminham com a questão interdisciplinar desde o desenvolvimento da ciência durante o século XVII. Os princípios europeus sobre a interdisciplinaridade são relevantes,

porém a perspectiva instrumental tem prevalecido (KLEIN, 1998). No entanto, na avaliação de Lenoir (1998), no ambiente escolar vale manter as perspectivas epistemológicas e práticas para evitar que o estudo seja apenas idealista ou do tipo técnico-instrumentalista.

O estudo dos dois enfoques nos proporcionou a compreensão da interdisciplinaridade como prática escolar, além disso, torna-se necessário compreender a diferença entre a interdisciplinaridade científica e escolar, entender o termo interdisciplinaridade na educação escolar considerando diferenças entre os princípios epistemológicos e os pedagógicos dessa e estudar as unidades didáticas integradas como perspectiva para prática interdisciplinar.

Segundo Lenoir (1998) e Fazenda (1996) a interdisciplinaridade escolar difere da interdisciplinaridade científica. O foco da interdisciplinaridade escolar é educativo, cujos princípios, propósitos de estudos e as práticas corroboram para o processo de aprendizagem, considerando os conhecimentos dos alunos e sua identidade. A interdisciplinaridade escolar pode ser, “objeto de pesquisa, ensinado e praticado” (LENOIR, 1998, p. 50). Essa organização e objetivos se diferenciam dos conhecimentos característicos da ciência.

Em suas pesquisas Lenoir (1998) apresentou algumas distinções entre a interdisciplinaridade científica e escolar no que tange às finalidades, os objetos de estudo, as modalidades de aplicação, o sistema de referência e as consequências que sucedem.

A finalidade da interdisciplinaridade científica abrange “a produção de novos conhecimentos [científicos] e a busca de respostas às inúmeras necessidades sociais pelo estabelecimento de ligações entre as ramificações da ciência, pela estrutura epistemológica” (LENOIR, 1998, p. 52). Enquanto isso a finalidade da interdisciplinaridade escolar é a “difusão do conhecimento (favorecer a integração de aprendizagens e conhecimentos) e a formação de atores sociais” (LENOIR, 1998, p. 52), tecendo possiblidades e impulsionando integração no processo de aprendizagem e conhecimento escolares. Dessa forma, no ambiente escolar a interdisciplinaridade pode ser compreendida como sendo constituída em um conjunto de três planos, a saber: curricular, didático e pedagógico.

A interdisciplinaridade curricular requer

[...] uma incorporação de conhecimento dentro de um todo indistinto, a manutenção da diferença disciplinar e a tensão benéfica entre a especialização disciplinar, que permanece indispensável, e o cuidado interdisciplinar, que em tudo preserva as especificidades de cada componente do currículo, visando assegurar sua complementaridade dentro de uma perspectiva de troca e de enriquecimento (LENOIR, 1998, p. 57).

Nesse nível, temos a sistematização do currículo, delimitando o lugar, os objetivos e o planejamento das disciplinas. Porém, uma escola na qual o currículo contenha essas características não garante que a interdisciplinaridade escolar seja concretizada, além disso, merece ser ressaltada a necessidade de atentarmos para a interdisciplinaridade didática.

A interdisciplinaridade didática se “caracteriza por suas dimensões conceituais e antecipativas e trata da planificação da organização e da avaliação da intervenção educativa. Assegurando uma função mediadora entre os planos curriculares e pedagógicos [...]” (LENOIR, 1998, p. 58). A interdisciplinaridade didática tem como finalidade articular os conhecimentos curriculares a serem ensinados e sua inserção nas situações de aprendizagem, ou seja, tem-se o planejamento do trabalho interdisciplinar, considerando as especificidades das disciplinas. Esse nível ainda não parece ser o bastante para que aconteça a interdisciplinaridade escolar.

Assim, sugere-se o terceiro plano que resulta do trabalho interdisciplinar desenvolvido nos dois níveis anteriores. Neste nível temos a “atualização em sala de aula da interdisciplinaridade didática” (LENOIR, 1998, p. 59), considerando os

[...] aspectos ligados à gestão da classe e ao contexto no qual se desenvolve o ato profissional de ensino, mas também as situações de conflitos tanto internos quanto externos às salas de aula, tendo por exemplo o estado psicológico dos alunos, suas concepções cognitivas e seus projetos pessoais, o estado psicológico do professor e suas próprias visões (LENOIR, 1998, p.58-59).

Pode-se observar que a interdisciplinaridade pedagógica descreve a prática pedagógica interdisciplinar desenvolvida na sala de aula de forma a ponderar até mesmo suas implicações.

A interdisciplinaridade científica e a escolar, no que se refere ao objeto, se diferem na ideia de disciplina. A primeira tem por objeto a disciplina científica no qual os elementos de conhecimentos são bem específicos, apresentando uma lógica de estruturação interna com a finalidade de avançar em determinado área específica por meio da pesquisa. Enquanto que na interdisciplinaridade escolar o objeto de estudo é a disciplina escolar, essa, por sua vez, utiliza conhecimentos produzidos na disciplina científica, não representa cópias e nem mesmo o resultado de uma transposição didática (LENOIR, 1998), mas envolve os conhecimentos de forma didática com intuito de levar os alunos à aquisição de conhecimentos específicos.

Em relação às modalidades de aplicação, a interdisciplinaridade científica tem seu foco na pesquisa e retrata o conhecimento científico como referência, se diferenciando da

interdisciplinaridade escolar, que tende ao ensino e formação do aluno, em que o sistema de referência é o aprendiz e sua relação com o conhecimento (LENOIR, 1998).

Já no sistema referencial, a interdisciplinaridade científica busca retornar à “discip lina na qualidade de Ciência”, enquanto que na interdisciplinaridade escolar tem-se um retorno à disciplina como conteúdo escolar, de forma que o sistema referencial não se limite às ciências (LENOIR, 1998).

Por último, temos a consequência que sucede os estudos. Na interdisciplinaridade científica, a consequência “conduz à produção de novas disciplinas segundo diversos processos e as realizações técnicos científicas” (LENOIR, 1998, p. 52), distinguindo-se da interdisciplinaridade escolar que conduz ao “estabelecimento de ligações de complementaridade entre as matérias escolares” (Ibid. p. 52).

Essas diferenças correspondentes às práticas interdisciplinares no ambiente científico e escolar apontam detalhes importantes da interdisciplinaridade escolar, que fomenta e contribui para o encaminhamento de uma proposta pedagógica interdisciplinar.

Tendo como foco uma proposta pedagógica interdisciplinar, considera-se importante compreender o termo interdisciplinaridade na educação escolar, pois essa expressão recebe diferentes significados desde os princípios epistemológicos até aos pedagógicos. Ambos envolvem conceitos confusos e muitas vezes complementares.

Para Thiesen (2008), no campo da epistemologia, “toma-se como categorias para seu estudo o conhecimento em seus aspectos de produção, reconstrução e socialização; a ciência e seus paradigmas; e o método como mediação entre o sujeito e a realidade” (THIESEN, 2008, p. 545). Já na perspectiva pedagógica, argumenta-se principalmente sobre as questões de ensino, de prática, de aprendizagem e de currículo escolar.

Dessa maneira, a interdisciplinaridade escolar necessita estar embasada em conjecturas epistemológicas que possibilitem traçar os objetivos educacionais e as dimensões formativas que os alunos precisam aprimorar ou até mesmo desenvolver.

Nessa perspectiva, serão apontados e abordados pontos essenciais que sustentam e fundamentam a prática interdisciplinar no âmbito escolar com a finalidade de justificar e mostrar relevância da proposta e do desenvolvimento dessa pesquisa.

Para discutir sobre a prática interdisciplinar, considera-se importante atentar para a organização e a condução de um ensino denominado por Santomé (1998) por unidades didáticas integradas, que se caracterizam como prática interdisciplinar representada por uma ação educativa.

As unidades didáticas integradas abarcam os conteúdos de um conjunto de disciplinas que compõem o currículo escolar objetivando a ligação entre os diferentes conhecimentos presentes em cada uma dessas e apoia o processo de ensino e aprendizagem em uma visão global do conhecimento do aluno (SANTOMÉ, 1998). Porém, para a implantação das unidades didáticas integradas, torna-se necessário a elaboração de um currículo integrado, que procure

[...] abranger os conteúdos de um determinado número de disciplinas ou áreas de conhecimentos durante um período considerável, pelo menos de um ano letivo, e deve ser planejado de tal forma que não gere lacunas importantes nos conteúdos a serem assimilados pelos estudantes (SANTOMÉ, 1998, p. 222).

Assim, para a construção de um novo currículo que contemple as características citadas acima, apoiadas nas ideias de Santomé (1998), seria necessário romper com a concepção do currículo isolado, descontextualizado e fragmentado, que representam empecilhos na construção e desenvolvimento de vínculos que possibilitam a sua organização com foco na realidade.

Segundo Santomé (1998), um novo currículo nasce do desejo e de anseios políticos de quebrar os velhos paradigmas ou concepções que nos acompanham, mas precisa ficar evidente e considerar que “existem classes de conhecimento e que cada uma delas é reflexo de determinados propósitos, perspectivas, experiências e valores humanos” (SANTOMÉ, 1998, p. 100).

Respeitando as diferenças e as finalidades dos conhecimentos disciplinares, as unidades didáticas integradas podem ser efetivadas nos diversos níveis da educação escolar (SANTOMÉ, 1998). No planejamento das unidades didáticas integradas, precisam estar presentes alguns itens como: diagnóstico do nível de desenvolvimento dos alunos e organização das tarefas de ensino. Neste último item deverá conter as metas educacionais; seleção do tópico a pesquisar; elaboração de um plano de pesquisa; seleção de tópicos de pesquisa; plano de pesquisa, de recursos e materiais adequados; agrupamentos de alunos; organização do desenvolvimento do estudo; redação e apresentação das conclusões do desenvolvimento dos estudos realizados pelos alunos e avaliação dos alunos (DAMIS, 2006).

Com tais características, a unidade didática integrada permitirá que se tenha uma inter- -relação entre conteúdos escolares considerando a importância de cada disciplina e proporcionando o aperfeiçoamento das práticas mais complexas.

A prática interdisciplinar como ação educativa, que pode ser estabelecida por meio das unidades didáticas integradas, encontra-se presente na proposta de pesquisa, cujo foco é o ensino de Função do 1° grau por meio da interdisciplinaridade, tendo como objetivo explorar uma dinâmica não associada a memorização, pois, para interdisciplinaridade,

[...] ensinar matemática é, antes de mais nada, ensinar a “pensar matematicamente”, a fazer uma leitura matemática do mundo e de si mesmo. É uma forma de ampliar a possibilidade de comunicação e expressão, contribuindo para a interação social, se pensada interdisciplinarmente (FAZENDA, 2003, p. 62).

Para que consigamos essa abordagem interdisciplinar citada por Fazenda e com as características discorridas nesse item, acredita-se ser importante o trabalho colaborativo entre professores, alunos e gestão escolar. Assim, no próximo tópico será dissertado sobre a importância do trabalho colaborativo.