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3 CAMINHOS METODOLÓGICOS

4.3 A INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

Após o período diagnóstico, foi realizada a intervenção pedagógica, com a finalidade de experienciar de que modo o trabalho com a temática de gêneros poderia modificar as opiniões e atitudes verificadas nas crianças.

Seguindo sugestões de orientação acadêmica, foram trabalhados livros infantis ligados a gêneros na Educação Infantil: “Meninos de Verdade”, de Manuela Olten, “Anton e as Meninas”, de Könnecke Ole e “Faca sem Ponta, Galinha sem Pé”, de Ruth Rocha.

Após a leitura do Livro Meninos de Verdade, cuja história representa o padrão sexista acerca de gênero e retrata os medos infantis, as crianças foram convidadas a opinar. Ao perceberem que, na história, os meninos também demonstraram medo, a ponto de buscarem proteção junto à irmãzinha, as opiniões já começaram a mudar em relação à resistência entre gêneros e as falas sexistas começaram a desaparecer, demonstrando que as crianças, tomavam atitudes e opiniões próprias, criticando as atitudes dos personagens.

O segundo livro, Anton e as Meninas, cuja história fala um menino individualista, machão e que nunca interagia com meninas, até que se machucou e foi acolhido pelas meninas, num movimento de integração.

Para essa atividade, as crianças já estavam mais atentas, interessadas para saber o contexto e a história contada, demonstrando atitudes compreensivas e dando opiniões em relação ao personagem principal.

A atividade de discussão do enredo perdurou por muito tempo, pois as crianças queriam colocar suas opiniões e solicitaram por muitas vezes a repetição da leitura.

Devido ao grande interesse pela história de Anton e suas amigas, realizou-se, dias depois, uma representação da história por meio de marionetes, no parque.

Durante essa atividade, outra turma de crianças, de outras salas de que estavam a brincar no parque, se distanciaram dos brinquedos e permaneceram atentos, ouvindo o desenvolver da história. Todos se animaram e ficaram calmos e atentos para o desenrolar da história, menos o Carequinha, que foi o único a falar que meninos não choram e que ele não chora.

Isso gerou uma grande discussão, na qual a maioria discordou de Carequinha, já que, horas antes, um deles (menino), havia caído ao correr no parque e se desequilibrar, e chorou. Aquele episódio foi tomado como exemplo e serviu de motivação para questionar sobre a pretensa força masculina e sua proibição por demonstrar fragilidade e sentimentos.

Apesar de todo o esforço da turma que argumentou e citou exemplos, Carequinha permaneceu irredutível.

O terceiro livro, “Faca sem Ponta, Galinha sem Pé”, gerou um desconforto no grupo, pois as crianças se incomodaram com os nomes dos personagens, casal de irmãos chamado Joana e Pedro que, ao passarem por baixo de um arco-íris, tiveram seus gêneros invertidos e passaram a viver situações de menino e menina em corpos trocados.

Isso gerou desconforto, pois as demais crianças passaram a rir das crianças cujos nomes eram homônimos em relação aos personagens, utilizando-se de expressões machistas, de certa forma, discriminatórias.

Também foram realizadas brincadeiras dirigidas de roda, nas quais houve sempre um momento de conversa para perceber opiniões e construções realizadas pelas crianças em relação à temática. Isso foi realizado porque, de acordo com Auad (2006, p. 50), “os jogos e as brincadeiras podem traduzir como as relações de gênero entre as crianças são construídas e, ao mesmo tempo, como se fabricam meninas, meninos, homens e mulheres”.

Foi possível perceber que, ao final das atividades que aplicadas com a turma, houve uma mudança nas opiniões e nos comportamentos que outrora eram discriminatórios, aumentou o clima de descontração entre elas e o diálogo se tornou um meio de solução de conflitos.

Também as brincadeiras se tornaram cada vez mais frequentes entre meninos e meninas integrados.

A brincadeira cria zona de desenvolvimento proximal da criança que nela se comporta além do comportamento habitual para sua idade, o que vem criar uma estrutura básica para as mudanças da necessidade e da consciência, originando um novo tipo de atitude em relação ao real. Na brincadeira, aparecem tanto a ação na esfera imaginativa numa situação de faz-de-conta, como a criação das intenções voluntárias e as formações dos planos da vida real, constituindo-se assim, no mais alto nível do desenvolvimento pré-escolar (VYGOTSKY, 1984, p.117). Um exemplo de como tais intervenções didáticas podem surtir efeito pode ser dado a partir da narrativa com o trabalho com a cantiga “Tororó”.

Nessa atividade, a pesquisadora cantou a música convidando as crianças a entrarem na roda, pelo próprio nome, alternando menino e menina. Com isso, todos se divertiram, porque ficavam em ordem, esperando a chamada para entrar na roda e acabavam por também convidar os colegas, independentes do gênero, para brincar:

“Ô, Luluzinha, ô Luluzinha entrará na roda ou ficará sozinha. Sozinha eu não fico nem hei de ficar porque tenho “Bolinha” para ser meu par”.

Nos jogos simbólicos, agora com meninos e meninas juntos, o papel do pai passou a ser representado por uma figura masculina que interagia com os demais participantes de forma tranquila, dialógica. O diálogo passou a ser uma forma de solucionar conflitos e ser uma ponte para atitudes de respeito, sem exclusões ou rejeição.

Do mesmo modo, a distribuição das crianças na classe também sofreu intervenção, já que a docente pesquisadora passou a solicitar que as crianças sentassem em mesas mistas e isso ocorreu de forma natural, a cada dia com menos resistência.

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