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O comprometimento É acompanhado de uma certeza. Aqui Röhr (2012, 2013) questiona, qual a natureza desta certeza, se não estamos situados na lógica empírica? É uma certeza baseada na intuição. Constata ser a intuição historicamente uma questão polêmica, desde Sócrates ao ouvir a voz interior de um daimonion, responsável por preservar sua alma de atos que lhe prejudicassem, a inspiração divina na idade

média. Seleciona, portanto, referenciar Bergson, para caracterizar as capacidades intuitivas, e Jaspers para exemplificar estas, na prática.

Existem alguns entraves na percepção da intuição. Primeiramente, intuição não pode ser confundida com desejo. Ela deve estar livre de justificativas de interesse próprio, e assim abre a possibilidade de não ser as manifestações dos nossos desejos. Como citamos no exemplo do aluno que não deseja ir para aula e “intui” que o professor não estará presente.2Em segundo lugar, o quanto a razão objetiva nega as informações

da intuição. Röhr (2013) exemplifica que podemos intuir não ir ao Banco, mas não vemos razão para isso, o clima está ensolarado, o tempo disponível. Ao chegarmos no banco, o sistema está “fora do ar”. Mesmo com os entraves, não conseguimos negar a capacidade intuitiva presente no ser humano.

Existem casos em que até sensações físicas ou determinadas emoções acompanham a intuição. Estas não raras vezes, são até confundidas com a própria intuição. Trata-se, de fato, de fenômenos que acompanham a intuição e que podem ser indicativos valiosos na identificação de um processo intuitivo. A própria intuição, porém, é um fenômeno mental. (RÖHR, 2013, p.58)

Desta forma, a intuição é uma capacidade possível de ser desenvolvida. As neurociências já comprovam que determinadas áreas do cérebro são responsáveis pelos processos intuitivos. A intuição situada na dimensão mental pode desenvolver-se a partir de estímulos. Uma forma de expressão da intuição, é sobre o mundo dos fatos, grandes cientistas como Albert Einstein, obtiveram descobertas originárias de intuições. Mas, a intuição também se expressa em áreas menos densas da realidade.

A intuição é uma habilidade vivenciada na dimensão mental, que proporciona ações diante de alguns propósitos desta dimensão, como vimos no mundo dos fatos. Através da dimensão mental, a intuição também “detecta” realidades mais sutis, e certezas que não podem ser comprovadas exteriormente ao ser. Röhr (2013) afirma que a intuição é a única via de percepção da realidade espiritual. A intuição, portanto, indica um conteúdo existencial, espiritual através do intelecto. A dimensão mental estrutura a forma de expressar a intuição, um formato próximo, porque explicação plena nunca teremos.

É na companhia de Bergson e Jaspers que Röhr (2013) desenvolve o con- ceito de intuição, e sua relação com os valores espirituais. Röhr (2013) narra um evento na história de Jaspers3 , o seu primeiro encontro com Gertrud, do qual já

mencionamos no corpo deste trabalho4. O fundamental desse encontro, é que Jaspers

possuía mínimas informações sobre Gertrud, e ainda assim algo repercute em seu estado de ânimo ao vê-la ainda de costas.

2 Conferir na introdução deste trabalho.

3 Röhr identifica a coerência entre um fato da vida de Jaspers e a visão de intuição defendida por

Bergson, mas não entre a visão de Jaspers sobre a intuição e a abordagem de Röhr. Jaspers, influenciado por Kant, entende a intuição como fenômeno ligado apenas às realidades aparentes, dos eventos imanentes.

Jaspers está vivenciando uma intuição. Esta confirmada no decorrer de sua existência. Como já pudemos relatar em sua biografia, o casal sofreu situações-limite da perseguição nazista, da qual lembramos, Jaspers tinha a escolha de deixar sua esposa de origem judia e salvar-se do extermínio, já que ele era considerado “alemão legítimo”. Ele nega abandonar Gertrud, e os dois só confirmaram seu amor existencial5.

Numa situação sem esperança concreta de salvação, Jaspers escreve no dia 02/05/42: Meu coração fala silencioso e confiável no seu fundo: eu pertenço a ela. Deus quer, quando a vontade de homens ( e não a atuação da natureza) atinge a um dos dois de forma destrutiva, que os dois sejam atingidos. Não se pode separar a vida, à força, aquilo que está ligado eternamente, que nasceu de uma única origem em para o outro. . . . (idem, p.60). (RÖHR, 2013, p. 64)

Röhr (2013) conclui que o que foi intuição no primeiro encontro, revelou-se fundamento incondicional da vida em conjunto. E este amor orientou a filosofia de Jaspers, ele vive as cifras da transcendência graças à sua relação com Gertrud, e essa força movente é a base do seu filosofar. Essa narração da intuição de Jaspers se relaciona com a definição de intuição para Bergson:

Chamamos, aqui, intuição a simpatia pela qual nos transportamos para o interior de um objeto para coincidir com o que ele tem de único e , consequen- temente, de inexprimível. (BERGSON apud RÖHR, 2013, p.65)

O autor evidencia que Jaspers não tinha a intenção de intuir algo, mas ocorreu. Portanto, a intuição não depende da intenção, essa é uma pequena distinção entre a vivência de Jaspers e a conceituação de Bergson.

Constatamos, de início, uma diferença entre a experiência de Jaspers e a defi- nição de Bergson. Bergson pensa nessa definição numa atitude ativa; procura ativar a capacidade intuitiva para captar o interior de um objeto. Jaspers não tinha de forma alguma, a intenção de intuir algo, quando entrou na sala onde se encontrava sua futura esposa.(RÖHR, 2013, p. 65)

A relação principal que se estabelece entre o exemplo e a definição de intuição, é que por um instante, Jaspers percebeu estar no interior de um objeto, da relação com Gertrud.

A principal característica encontra-se precisamente nesse fato: entrar numa ligação direta com o objeto. “Intuição significa pois, primeiramente consciência imediata, visão que quase não se distingue do objeto visto, conhecimento que é contato e mesmo coincidência“ ( RÖHR, 2013, p.66)

Ao ser confirmada a intuição de Jaspers no decorrer da sua história, Röhr (2013) indica mais uma característica bergsoniana da intuição: a “duração interior”. Jaspers no decorrer de oito anos de situação-limite, poderia ter se divorciado de mentira, ou aceitado o suicídio de Gertrud. A intuição do primeiro instante gerou uma duração

interior, uma certeza pelo qual Jaspers sempre volta, ao fundo transcendente que a intuição tocou. Estava na “contunuidade indivisível do fluxo da vida interior“.6

A duração interior, porém, é difícil de ser continuada. A reflexão bergsoniana aponta que os conhecimentos exteriores são fáceis de apreensão, aplicar regras gerais é uma habilidade crescente. Sobre a intuição, nos direcionamos ao nosso interior, que revela a tensão de conhecer cada vez mais a nós mesmos.

Diante do exposto até aqui, incluir a dimensão espiritual na educação encontra o desafio de lidar com a intuição. O processo intuitivo é intransferível (RÖHR, 2013). A tarefa pedagógica de inclusão da espiritualidade também se volta para integralidade das dimensões.

As dimensões são interligadas, o quadro descreve-as em círculos pontilhados, que representa tanto a impossibilidade de limite entre elas, quanto o espaço de fluxo de interação entre todas. Podemos identificar que as situações educacionais abrangem a possibilidade de trabalhar por todas as dimensões. A Educação Física não é apenas movimentação corporal, nem Arte apenas história. A partir do esporte valores éticos são estimulados, e a arte também mobiliza emoções e conteúdos existenciais.