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A junção conclusiva sob perspectivas textuais

3 A articulação de orações no português escrito do Brasil: a junção conclusiva

3.1 A articulação de orações

3.1.2 A junção conclusiva sob perspectivas textuais

Nesse tópico serão abordados, principalmente, aspectos semânticos que caracterizam a junção conclusiva, visto que os sintáticos foram insuficientes para definir esse tipo de construção.

“Segundo a doutrina tradicional e ortodoxa, as orações coordenadas se dizem independentes e as subordinadas, dependentes. Modernamente, entretanto, a questão tem sido encarada de modo diverso. Dependência semântica mais do que sintática observa-se também na coordenação, salvo, apenas, talvez, no que diz respeito às conjunções e, ou, nem. Que independência existe, por exemplo, na oração “ portanto não sairemos.”? Independência significa autonomia, não só na função, mas também de sentido. A comunicação de um sentido completo só se fará com o auxílio de outro enunciado:” Está chovendo, portanto não sairemos.” (GARCIA, 1967:16)

As conjunções coordenativas que expressam causa, conseqüência e conclusão, legitimamente, não ligam orações de mesma natureza, tanto é certo que a que vem por qualquer delas encabeçada não goza de autonomia sintática. Em suma, coordenação gramatical e subordinação psicológica.

Um exemplo de falsa coordenação é o que se verifica no raciocínio dedutivo em que as orações de logo, na segunda premissa e na conclusão, são absolutamente dependentes da primeira premissa.

1ª premissa: Todo homem é mortal, 2ª premissa: ora, Pedro é homem, conclusão: logo, Pedro é mortal.

Guimarães (1976) faz um estudo semântico das conjunções do português. Descreveremos a seguir o estudo direcionado de uma conjunção prototipicamente conclusiva: logo.

Esse autor analisa o juntor conclusivo prototípico logo a partir de dois princípios: - a articulação tema/comentário entre as orações;

- a dependência ou não entre as orações. Diremos aqui que as orações são dependentes ou não-dependentes. Isto porque, do ponto de vista enunciativo, não se pode pensar numa independência absoluta entre orações.

Maria comprou um carro, logo vendeu a casa.

As orações não são totalmente independentes. Dizer que Maria comprou um carro tem a ver com a conclusão que daí se tira. E, sem dúvida, deve-se considerar logo vendeu a casa como parte dependente da primeira oração.

Guimarães, testando e analisando a conjunção logo, considera-a como coordenativa, pois apresenta a não-dependência entre as orações desenvolvidas e a especificação da articulação tema/comentário.

Guimarães (1987) também diz que logo exige que o locutor apresente a oração inicial como algo “certo”, para assim poder tirar uma conclusão como irrefutável, para o que é obrigatório o uso do modo indicativo do verbo.

Nesse estudo também se considera a possibilidade de substituição de logo por outros juntores conclusivos.

Maria comprou um carro, portanto/por isso vendeu a casa.

Porém nem todos os juntores desta espécie se comutam, como *Maria comprou um carro, então vendeu a casa. Mas se tomarmos a linguagem oral e coloquial esse tipo de construção é comum de ocorrer.

Um outro fato abordado sobre os juntores conclusivos é que estes também podem ligar parágrafos, capítulos, termos e não só orações. Vejamos os exemplos abaixo em que há a junção de dois predicativos (termos) por meio da conjunção portanto (a) e a junção de dois parágrafos por meio do juntor logo (b).

a) “... ser mais fidedigno, portanto, mais verdadeiro.”

b) “...os países europeus, de modo geral, são contrários à importação de transgênicos exatamente porque se sentem inseguros sobre os efeitos para a saúde humana e animal desse tipo de organismo.

Logo, se um país (no caso o Brasil) tem condições, como tem, de produzir sementes naturais, fica com um vasto mercado à sua disposição já que não terá a concorrência dos norte-americanos (formidáveis produtores), porque cerca de um terço da produção dos Estados Unidos já é transgênica, inaceitável, portanto, para os padrões europeus.

Não parece haver, pois, motivo nenhum para precipitar decisões na área dos transgênicos...”(PB- Mat-FSP:08/07/00:p.2:28-51)

Também o modo de uso das conclusivas varia conforme o discurso.

“No discurso cotidiano representa-se a sustentação das conclusões ou por uma voz genérica, ou pela “convicção” do eu. No discurso científico representa-se a sustentação das conclusões na verdade das proposições enunciadas, e procura-se ocultar o evento da enunciação,

Pezatti (1998) considera a possibilidade que a construção conclusiva sustenta de, além de exprimir nexo semântico de causa-conseqüência, exprimir uma relação de inferência entre as proposicões, em que a primeira é uma premissa e a segunda, a conclusão.

Quando se é rico, têm-se muitos amigos. Pedro é rico, tem, pois, muitos amigos.

Nesse estudo dos juntores conclusivos, a autora toma a conjunção prototípica logo como base para analisar as unidades adverbiais que estão em vias de se gramaticalizarem com legítimas conjunções.

A prototipicidade de logo é comprovada por alguns critérios que definem as conjunções:

- não apresentar mobilidade no interior da sentença que inicia; Narciso é uma flor, logo pertence ao reino vegetal. *Narciso é uma flor, pertence, logo, ao reino vegetal. - não poder ser precedido de outra conjunção, como a aditiva;

*Narciso é uma flor, e logo pertence ao reino vegetal.

- poder coordenar termos, como as conjunções coordenadas e, ou e mas;

Você está sentindo sua emoção, daí ser mais fidedigno, logo mais verdadeiro. - não aceitar focalizadores, como advérbios de inclusão/exclusão, hedges e clivagem;

*Narciso é uma flor, é logo que pertence ao reino vegetal. - não ser possível a inversão das orações coordenadas pelos juntores;

*Logo pertence ao reino vegetal, Narciso é uma flor.

Com base nesses critérios de identificação de legítimas conjunções conclusivas, serão analisados os outros juntores pertencentes a este paradigma: por isso, então e, portanto.

As orações coordenadas por esses três juntores também não invertem suas posições, dando assim caráter coordenativo a esses operadores.

Porém uma característica comum verificada nesse três diferentes juntores que reforça o caráter adverbial dos mesmos é a possibilidade que eles apresentam de se deslocar para várias partes das orações.

Narciso é uma flor, pertence, por isso, ao reino animal.

O juntor portanto está próximo a gramaticalizar-se como conjunção coordenativa, pois, na maior parte de suas ocorrências, pode ser substituído por logo, coordena termos, rejeita focalizadores, não permite inversão das orações por ele ligadas, porém, confirmando ainda sua função adverbial, esse juntor pode ser precedido pela conjunção e.

Já o juntor por isso conserva ainda muitas marcas circunstanciais de justificativa e não de conclusão, visto que em alguns casos não é possível a substituição de por isso por logo. Outras características que reforçam o caráter adverbial desse juntor é que ele pode ser precedido por e, aceita focalizadores e não liga termos.

Por fim o juntor então está em vias de gramaticalizar-se como conjunção conclusiva, embora ainda mantenha algumas funções locativas e temporais. Esse juntor, reforçando sua característica adverbial, pode ser precedido pela conjunção e e não coordena termos, porém pode já ser considerado como conjunção conclusiva, pois se comporta como o protótipo logo e está sendo freqüentemente usado para exprimir conclusão.

Para melhor visualização dos juntores que estão às vias de gramaticalizar-se como legítima conjunção conclusiva e quais estão mais próximos desta categoria gramatical, apresentaremos gráfico que segue:

advérbio--- conjunção por isso → --- → então → --- → portanto → --- → logo