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4.3 Recursos Audiovisuais: As vinhetas de abertura do programa

4.3.1 A Leitura das Vinhetas Primeira Versão (1977)

As imagens da vinheta iniciam-se com um fundo colorido, que divide a tela em duas cores: azul cobalto para a parte dominante da base superior do vídeo até uma linha sinuosa de cor azul celeste, mais clara que é a predominante. O verde fortemente matizado adquire brilho ao se aproximar da base inferior do vídeo, enquanto é acrescido de amarelo para tornar-se verde-limão. O fundo faz referência a uma paisagem vista em plano panorâmico e conta ainda com seis desenhos de diminutas árvores dispostas em uma linha sinuosa ao longo da cor verde. O conjunto nos leva a imaginar uma paisagem paradisíaca onde certamente se encontra “O Sítio do Picapau Amarelo”. O nome do programa vem sob a forma de uma logomarca e caracteriza-se por uma fonte branca em caixa alta, estilo bold arredondada. As letras já montadas com o nome completo do programa acentuam a palavra “sítio”, que aparece maior, na proporção dois para um em relação ao conjunto “Picapau

Amarelo”. Isso já demonstra o sentido que o produtor dessas imagens pretende atribuir ao programa: uma narrativa que deve levar o espectador para um lugar diferente do urbano, pois “sítio” é antagônico a cidade. A entrada da imagem verbal também se refere a uma aproximação com o receptor. O processo de montagem faz a imagem verbal entrar de forma ascendente ao plano de fundo e depois se deslocar em direção ao receptor até estourar o primeiro plano da tela. Esse efeito de ângulo de câmera fechado será uma constante durante toda exibição do filme de forma a instaurar um encontro e propor um diálogo entre a imagem e o espectador. Segundo Jacques Aumont, o ângulo de câmera fechado “..transforma o sentido de distância, levando o espectador a uma proximidade psíquica e uma intimidade extrema...”(AUMONT, 2001, p. 141.). Isso materializa a superfície da imagem em muitos momentos, acentuando a curiosidade já latente na criança que aprecia a aproximação de tudo que vê. É o gesto de levar à boca tudo o que tem curiosidade de experimentar. Após a retirada da imagem verbal com o nome do programa, sobre um fundo de paisagem, desenvolve-se o crescimento de uma flor, cor de abóbora, que envolve a tela toda em um mesmo movimento de ângulo de câmera fechado visto com o logotipo. Assim que aparecem as informações sobre a obra de Monteiro Lobato e os produtores do roteiro, o fundo reaparece. Nesse instante, desloca-se a forma de um cometa, estrela cadente no céu. A estrela no céu, interpretada como aquela do presépio cristão, tem uma leitura culturalmente baseada no nascimento de Cristo. É sempre interpretada como um bom presságio. A estrela é também desejo e fantasia. Vinda do céu, parece trazer as histórias do sítio. Denota uma ligação entre o divino e o terreno, entre a fantasia e a realidade. Essa imagem prepara o espectador para as próximas figuras folclóricas que aparecerão logo a seguir. A cor do cometa é branca, como as nuvens em dia claro. A estrela de seis pontas tem a forma da estrela de Davi, personagem bíblico do Velho Testamento cristão. Sua forma ganha o fundo em uma entrada horizontal contrária ao sentido de leitura ocidental. Esse procedimento remonta novamente ao texto bíblico, reforçando a passagem onde se lê: uma estrela surgiu no oriente. Seu movimento é interrompido logo depois de atingir o centro geométrico da tela. Dessa forma, garante o espaço para a montagem do pássaro, o Picapau, que surge apenas na tela e toma o lugar da cauda do cometa de forma que, de onde está, seu bico toca ou beija a estrela em um gesto de carinho, coomo se ali acontecesse o processo da passagem da fantasia, que a estrela trouxe, para o universo da paisagem à qual o pássaro pertence.

Seguem-se os movimentos de expansão da forma do pássaro. Aparecem bandeiras ao lado da estrela, entre as hastes de uma borboleta. O pássaro desaparece. As bandeiras são aquelas das festas juninas, muito utilizadas no interior brasileiro em quase todos os estados. A

borboleta com pintas nas asas transforma-se em um boi, o bumba-meu –boi, que agora tem as bandeiras e a estrela entre seus chifres. Isso nos remete à cultura do povo brasileiro por que nos lembra uma das maiores festas folclóricas do norte e nordeste brasileiro. A imagem do saci particulariza-se por tirar estrelas do cachimbo. Mantém-se descentralizado enquanto os caracteres do elenco desenrolam na tela. Há ainda uma seqüência de bandeiras que aparecem, formando como uma grande festa de cores e imagens folclóricas que irão se materializar nas histórias do sítio. A festa termina com a imagem sapeca de um mico que cruza a tela, agora no sentido da leitura e desenvolvendo uma parábola ascendente, como o movimento de brinquedo que balança no parque. A imagem aparece como que invadindo a tela para brincar naquela festa montada com cores e imaginação. Sua segunda aparição é em linha reta, organizando a leitura e o fim da vinheta tem a imagem do mico que estoura a tela em um ângulo de câmera fechado, deixando latente sua forma de construção, ou seja, um desenho feito sobre um suporte de papel e pintado com pigmento sólido (lápis ou giz). Assim não deixa dúvidas sobre o caráter fantástico das imagens, viés pelo qual se desenrola todo programa.

Esses recursos têm, ainda, a função de arraigar as imagens ao mundo mágico da criança, permitindo, não só uma compreensão e um uso, como também frui-las no contexto da imaginação.

As imagens da vinheta procuram colocar perante os olhos da criança alguns fragmentos de fauna, flora e folclore brasileiro. Ambiente imediato ou longínquo, como um chamado à fantasia. O objetivo é que a criança jogue com as imagens da realidade apresentadas e construa, a partir disso, sua própria cosmovisão. É bom lembrar que a criança recebe imagens da realidade, mas não a própria realidade.

4.3.2 A LEITURA DAS VINHETAS