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A LINGUAGEM IMAGÉTICA E A REPRESENTAÇÃO DO REAL

No documento Movimentos de autoria nas aulas de inglês (páginas 88-91)

Áreas como divulgação científica, marketing, publicidade, cinema, dança, teatro já compreendem o valor da linguagem imagética. A publicidade, por exemplo, explora isso muito bem, atraindo a atenção das pessoas em relação aos produtos e serviços que estão sendo

veiculados na esfera social. Assim também para representar cenas da vida real ou fictícias em filmes, seriados e apresentações de peças em geral. Ou seja, a linguagem imagética faz parte da nossa vida, tem grandes chances de chamar nossa atenção, constituindo assim uma forma de discurso bastante importante. Pêcheux (2010), no livro O papel da memória, afirma que a publicidade

utiliza a imagem em complementaridade com o enunciado lingüístico para apresentar – tornar presentes – as qualidades de um produto e conduzir assim o leitor a se recordar de suas qualidades, mas também a fazê-lo se posicionar em meio ao grupo social dos consumidores desse produto; a se situar, a se representar esse lugar (2010, p. 28).

Pêcheux fala de uma relação da imagem com o linguístico, mas não só, permite pensar o modo como este discurso, em seu conjunto, interfere na vida social. Nesse sentido, entendemos que a imagem, aliada ao texto, se constitui como um meio de veicular a publicidade, sendo uma porta de entrada na promoção da qualidade de produtos e serviços. Guimarães (2013), em seu texto Linguagem verbal e não verbal na malha discursiva, fala sobre a natureza híbrida do discurso publicitário, afirmando que

O movimento do olhar que transita do visível ao nomeado e vice- versa reflete a estratégia fundamental do discurso da propaganda, ou seja, o intento de persuadir o leitor a crer na veridicção da imagem e, por conseguinte, o despertar do desejo de compra do produto anunciado. (2013, p. 126).

A imagem é, assim, utilizada pela publicidade e também por outros meios que citamos acima, como complementação ao texto verbal, de modo que ambos conversem entre si e, nessa relação que estabelecem, consigam “transmitir uma mensagem” ao leitor. No caso da publicidade, essa junção entre texto e imagem se apresenta de maneira bastante articulada, de modo que a mensagem o convida a comprar o produto e a imagem constitui-se como o despertar do desejo de compra, na medida em que busca representar o produto tal como ele existe verdadeiramente, ou senão manipulá-lo para ganhar o cliente.

Esse jogo entre a imagem e a palavra interfere, conforme afirmou Pêcheux, na posição que o leitor irá ocupar em meio ao grupo social de um produto, o que significa dizer que a propaganda realizada sobre esse produto, dadas as características da linguagem verbal e da linguagem imagética, irá contribuir para que o leitor forme uma opinião a respeito, compre o produto ou tenha uma opinião contrária a ele. Nesse entendimento, podemos dizer que a publicidade utiliza de enunciados linguísticos (linguagem verbal) e não linguísticos

(linguagem imagética) para aproximar-se do público-alvo e obter resultados positivos em relação à qualidade dos produtos e serviços veiculados.

Essas duas formas de linguagem, verbal e imagética, aparecem na maioria das vezes juntas, complementando-se, na esfera social, no entanto, nem sempre nos damos conta do modo como entendemos ambas, como um discurso só, sem fazer distinção do que é da imagem e do que é da palavra. Isso acontece porque, embora façamos uso desses dois tipos de linguagem com frequência, não podemos negar que a linguagem verbal é extremamente valorizada em nossa sociedade, presente desde cedo em nossa aprendizagem da escrita, leitura, fala, sendo encontrada em livros, cadernos, bulas, receitas, artigos, manuais, etc. Assim, mesmo a linguagem imagética também marcando presença em nossa vida remotamente, bem antes da aprendizagem da escrita, não poucas vezes ela parece invisível e inaudível.

Nesse sentido, a linguagem verbal parece ocupar mais espaço em nossa vida que a linguagem não verbal, porém ambas são utilizadas em nosso dia a dia e se constituem como elementos importantes em qualquer modalidade social. Conforme o LD Português: A Arte da Palavra (2009), “Estamos tão acostumados com as linguagens não verbais no nosso cotidiano que às vezes nem as percebemos. Mas elas estão em toda a parte, como no código de trânsito, na dança, na música, nos desenhos e pinturas e até [...] na moda e no vestuário” (2009, p. 19). A linguagem não verbal, ou imagética, nesse sentido, faz parte do nosso meio e fazemos seu uso constantemente no cotidiano, nos gestos, movimentos, expressões faciais, melodias, mesmo que, muitas vezes, desconsideremos que tudo isso é também uma linguagem.

Nas aulas de Língua Portuguesa, essa questão aparece marcada por distinções precisas, quando o professor explica que há dois tipos de linguagem: verbal e não verbal. No espaço da sala de aula, a linguagem não verbal é trabalhada por meio de imagens de anúncios, histórias em quadrinhos, figuras, e o aluno é motivado a ler a imagem, escrever sobre o que ela significa, para que consiga interpretá-la.

Na visão de Souza T. (2001), “A palavra fala da imagem, a descreve e traduz, mas jamais revela a sua matéria visual” (2001, p. 06), uma vez que palavra e imagem são, ambas, opacas. Nos termos da autora, “A palavra não pode ser a moeda de troca das imagens” (2001, p. 06). Para Souza, nesse caso, solicitar ao aluno a descrição de uma imagem implica reduzi-la à linguagem verbal, pois por mais que o aluno escreva sobre a imagem, não conseguirá alcançar tudo o que ela representa, em sua materialidade.

Compreendemos, por outro lado, que nunca haverá, de fato, uma língua que traduza ou descreva a imagem, pensando também numa relação de espelho, mas isso também

acontece na produção de sentido da linguagem verbal, porque nunca vamos chegar ao sentido que o autor quis imprimir ao escrever uma crônica, por exemplo, vamos, nesse caso, lidar com efeitos de sentido.

Nesse entendimento, quando Souza afirma que a palavra fala da imagem, a descreve e traduz, a autora trabalha, aqui, o imaginário da língua como reflexo do real. Em A língua Inatingível (2004), Gadet e Pêcheux afirmam que “o real da língua reside naquilo que nela faz Um, a assegura no Mesmo e no Idêntico e a opõe a tudo o que da linguagem cai para fora dela” (2004, p. 30).

Nesse sentido, entendemos que o real é o que é, no mundo e, não conseguimos atingi-lo, mesmo se descrevermos a imagem, pois não será ela mesma, idêntica, haja vista que aqui trabalhamos com efeitos de sentido. Nesse caso, a imagem perde, porque sempre vamos perder. A palavra vai ser sempre precária, insuficiente para reproduzir o real, porque o real não é descrito em palavras como num espelho. Nunca vai ter uma troca que não vá ser afetada por esse simbólico da língua, que sempre vai correr atrás do real, porém nunca vai completá- lo, alcançá-lo.

Podemos dizer que a imagem, assim como o texto verbal, simboliza o real, pois se constitui como uma “representação” desse real, que é inatingível. É a materialidade de cada texto funcionando em seu conjunto que vai marcar uma diferença ou outra entre o verbal e o imagético. Ou seja, ensinar esses dois modos de funcionamento para o aluno, como coisas separadas, não ajuda a pensar os efeitos de sentido de um texto, ou mesmo sua produção.

Com isso, entendemos que o imagético traz, sim, inúmeras possibilidades de tornar um estudo de segunda língua mais atrativo, todavia não se pode pensá-lo em distinção ou oposição ao verbal, pois ambos se relacionam. Pensando nisso, traremos, a seguir, as contribuições da linguagem imagética para a produção de sentidos e constituição do sujeito autor num segundo idioma.

No documento Movimentos de autoria nas aulas de inglês (páginas 88-91)