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1. A mercantilização da educação e a expansão do ensino superior

1.2. A mercantilização do ensino

As reformas educacionais ocorridas no Brasil nas décadas de 1960 e 1970 tiveram o objetivo de aplicar o modelo empresarial com clara tendência tecnicista atendendo às exigências do mercado capitalista em desenvolvimento efetivando acordos entre Brasil e Estados Unidos – chamados acordos MEC-Usaid (Ministério da Educação e Cultura e United State Agency for International Development). Chamado de Aliança para o progresso, por ele o Brasil recebia assistência técnica e cooperação financeira e desenvolve uma reforma educacional atrelada ao modelo econômico instituído pela política norte americana para a América Latina (Matos,

2008). De acordo com Dos Santos (2012), a política educacional prescrita pelos setores hegemônicos do capital, tem determinado o modelo de educação para cada continente, país ou região por meio de imposições de organismos internacionais como OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), PREAL (Programa de Promoção da Reforma Educativa na América Latina e Caribe). Por meio deles são estabelecidas políticas de controle do desempenho escolar, do trabalho docente, sob pretexto de avaliar a qualidade. Na verdade, segundo Dos Santos, este tipo de processo investe contra a autonomia do trabalho pedagógico, atribui o fracasso ao docente e alega que o mercado é o único capaz de formular, implementar e avaliar o trabalho pedagógico.

De acordo com Silva Junior e Sguissardi (2001), no processo de mercantilização do campo educacional, o financiamento, num primeiro momento é assumido pelo capital coletivo, na figura do Estado – seu representante – devido o alto custo desse investimento e a impossibilidade de os clientes adiantarem proventos para isto. Num segundo momento, o setor de ensino passa a ser explorado pelo capital de serviço. São empresas educacionais que exploram o setor. O setor de serviços tende a se reorganizar segundo a racionalidade do modo capitalista de produção, seja na diminuição do custo de produção da mercadoria força de trabalho, seja na dimensão das empresas de ensino. Neste momento, o ensino superior torna-se mercadoria e tende a reificar-se4. Educação como objeto de troca, mercadoria vendida a preço baixo. Os autores mostram que nos anos 1980 percebia-se a alta concentração de IES (Instituição de Ensino Superior) isoladas, majoritariamente privadas, nas regiões Sul e Sudeste, diversamente do que ocorria nos estados do Norte, Nordeste e Centro oeste, onde predominavam as IES públicas, evidenciando a estreita relação entre essa categoria IES e nível de renda ou poder aquisitivo da população. Mas, mesmo as classes com baixo poder aquisitivo são um mercado importante, desta forma é necessário criar estratégias de acesso a esta parcela da população. Dentre estes recursos está a concepção da educação como panaceia para resolução de todos os problemas sociais, não

4Conceito desenvolvido por Lukacs. Do alemão Verdinglichung que signfica transformar uma

ideia em uma coisa. É uma operação mental que consiste em transformar conceitos abstratos em realidades concretas ou objetos. Na teoria marxiana o conceito designa uma forma particular de alienação, característica do modo de produção capitalista. Implica a

importando a forma como ela se dá, o que importa é obter o título, o diploma. Este discurso compôs e compõe reportagens de mídia que ressaltam a importância de elevar a escolaridade da população, incluir as crianças abaixo de sete anos na escola e torná-la ‘atraente’ para o adolescente. É importante ressaltar que aqui não há real preocupação com o conhecimento, mas com índices e com abertura de mercado.

Um dos recursos ideológicos para atender à necessidade de abrir novos mercados na educação superior foi a difusão da idéia de que o diploma neste ensino faria toda diferença na vida dos trabalhadores. A ideologia da educação como panaceia é apontada por Neves e Fernandes (2002) como mais uma estratégia a serviço do neoliberalismo. Esta ideologia prega a ilusão de que quanto mais treinada e educada for a força de trabalho, melhor o desempenho da economia, mais qualificados os empregados e mais justa a distribuição de renda. Ocorre também a ideologia da empregabilidade, difundindo a ideia de quanto mais capacitado o trabalhador, maiores suas chances de ingressar e ou permanecer no mercado de trabalho. Este discurso aparece claramente nas propagandas de faculdades particulares que se direcionam aos trabalhadores, e do próprio governo, incentivando o FIES (Financiamento do Ensino Superior). Seduzida por essas ideologias, a classe trabalhadora investe mais efetivamente na melhoria dos seus padrões de escolarização. Como o Estado foca suas ações no ensino fundamental e médio, e ainda assim de forma ineficiente, a concorrência nos processos seletivos das universidades públicas fez e faz com que boa parte dos trabalhadores precisasse custear seus estudos em nível superior. Atualmente, existem diversas formas de acesso ao ensino superior. O governo federal criou o Sisu (Sistema de Seleção Unificada) que é o sistema informatizado do Ministério da Educação por meio do qual, instituições públicas de ensino superior oferecem vagas a candidatos participantes do Enem5

(Exame Nacional do Ensino Médio). Este tem por objetivo avaliar o desempenho do estudante ao fim da escolaridade básica. Podem participar do exame alunos que estão concluindo ou que já concluíram o ensino médio em anos anteriores. O Enem é utilizado como critério de seleção para os estudantes que pretendem concorrer a uma bolsa no Programa Universidade para Todos (ProUni).

5Fonte: Ministério da Educação. Recuperado de:

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=183&Itemid=310 Acessado em 04/05/2012.

Além disso, cerca de 500 universidades já usam o resultado do exame como critério de seleção para o ingresso no ensino superior, seja complementando ou substituindo o vestibular. Este último é o método tradicional nas instituições particulares, geralmente composto de prova com questões objetivas e redação. O que ocorre na prática é que o vestibular das instituições públicas é extremamente concorrido, com cursos com mais de 200 alunos por vaga, diferentemente do que ocorre com o das IES particulares. Desta forma, o aluno que estudou em escola publica, dificilmente consegue ser admitido em instituição publica, e acaba buscando uma particular, seja usando os programas governamentais para financiamento do curso (FIES – Fundo de Financiamento Estudantil), ProUni ou arcando pessoalmente com as despesas.

Pode-se pensar inclusive, se o investimento precário no ensino básico e médio não serve aos interesses mercadológicos, visto que este estudante mal preparado, submetido à ideologia dominante e pobre não faria concorrência com alunos de escolas particulares no disputado vestibular para as universidades públicas, se tornando o “cliente“ ideal das faculdades particulares.

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