• Nenhum resultado encontrado

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.5 A metáfora na educação

Gregory Merchant (1992, apud. Cortazzi & Jin (1999), conduziu um estudo com alunos de graduação e pós-graduação cujo objetivo era coletar símiles relacionadas ao professor, aos alunos e ao processo de aprendizagem. O autor sugeriu em seu estudo que símiles refletiam metáforas sobre como esses alunos vêem, por exemplo, o papel do professor. Dentre as símiles que apareceram no estudo estão: professor é como autoridade (juiz, policial, diretor de prisão), professor é como cuidador (pai, médico), professor é como diretor (de um filme, condutor de orquestra), professor é como alguém capturado (prisioneiro), professor é como anfitrião de festa, professor é como alguém em julgamento (alguém esperando veredicto, membro do júri, tribunal), professor é como um árbitro e professor é como um agente de mudança.

Em 1999, Cortazzi & Jin realizaram uma pesquisa transcultural com estudantes de inglês de vários países, dentre eles, China, Líbano, Japão, Inglaterra, Turquia e Irã, em que eles deveriam completar a seguinte frase: “um bom professor é...”21. Destacamos os resultados a título de informação, salientando, como os autores, que se trata de um estudo envolvendo culturas distintas, o que pressupõe que as metáforas produzidas são resultado de frames culturais variados, e que, conforme já preconizado por Lakoff & Johnson (1980 [2002]), podem refletir formas diferentes de se conceptualizar um objeto. Os resultados obtidos por Cortzazzi & Jin mostram as seguintes metáforas conceptuais: PROFESSOR É AMIGO (melhor amigo, amigo rigoroso, amigo gentil, amigo em que se pode confiar, verdadeiro amigo), PROFESSOR É PAI/MÃE (pais compreensivos, pai-mãe rígidos, pai-mãe pacientes) PROFESSOR É GUIA, PROFESSOR É FONTE DE CONHECIMENTO, PROFESSOR É OBJETO (âncora); PROFESSOR É COMIDA (fruta suculenta, comida fresca, pão), PROFESSOR É REMÉDIO e PROFESSOR É ARTISTA.

Na obra intitulada Metáfora, Sardinha (2007) dedica um capítulo para investigar as metáforas da escola. Em um dos pontos, o autor aborda o livro Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire (1970). Sardinha (op. cit) argumenta que tanto a concepção tradicional de Freire sobre educação e a sua proposta de mudança são expostas por meio de metáforas. Optamos por

selecionar 3 metáforas conceptuais apontadas por Sardinha que se encontram mais relacionadas ao escopo deste trabalho: ALUNO É RECIPIENTE, EDUCAÇÃO É UM BANCO e PROFESSOR É DEPOSITANTE.

A narração de que o educador é o sujeito, conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em “vasilhas”, em “recipientes” a serem “enchidos” pelo educador. Quanto mais vá “enchendo os recipientes” com seus “depósitos”, tanto melhor o educador será. Quanto mais se deixem docilmente “encher”, tanto melhores alunos serão. (FREIRE, 1970, p. 66)

O educador é visto como alguém que transmite o conhecimento para o aluno, que funciona como recipiente para onde o conteúdo é depositado/transferido. A metáfora conceptual proposta é ALUNO É RECIPIENTE. Dentre as manifestações linguísticas dessa metáfora destacamos algumas, entre aspas, no trecho supracitado. Essa metáfora parece ser amplamente difundida nas escolas ainda hoje, gerando uma falsa noção de que o melhor professor é aquele capaz de inserir mais conteúdo no recipiente. O melhor aluno é aquele que consegue acumular (e usar) mais dados.

A ideia de depositar conhecimento também aparece na metáfora EDUCAÇÃO É COMO UM BANCO.

Eis aí a concepção bancária da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de “receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los”. Desta maneira, a educação se torna um ato de “depositar”, em que os educandos são “depositários” e o educador, “depositante”. (FREIRE, 1970, p. 66)

Observamos no trecho acima, o domínio fonte banco, que é uma instituição financeira, além de ser uma empresa – em que cada um tem uma função definida – mapeado para o contexto educacional. Professores são depositantes, alunos depositários e a escola, o banco. O frame RELAÇÕES DE TRABALHO, que será discutido no capítulo Análise dos Dados, fornece elementos que subsidiam a metáfora EDUCAÇÃO É UM BANCO. Citamos, a partir do trecho destacado, que o professor é um funcionário da escola, que é representada pela instituição bancária, onde as transações financeiras acontecem. Neste enquadramento, o professor é visto como aquele que passa o conhecimento, um recurso valioso semelhante ao dinheiro, para o aluno, que o recebe e o mantém seguro, guardado.

A análise feita por Sardinha (2007) da obra de Freire se atém a outras metáforas e, por conta da natureza do presente trabalho, conceptualizações relacionadas ao orientador, optamos por nos concentrar nas metáforas que retratam a figura do professor, do aluno e da escola, pois acreditamos que os dados coletados de nossa pesquisa reflitam uma concepção de educação que

está presente na cultura e é difundida amplamente na nossa sociedade e na forma como alunos veem a figura do professor ao longo de sua trajetória estudantil.

Antes de mais nada, o orientador é um professor, e, como tal, no enquadre da educação bancária seria o detentor de conhecimento, tendo a tarefa de transmiti-lo ao aluno.

Em segundo lugar, como professor, há um desequilíbrio de poder na relação inevitavelmente hierárquica. E, portanto, acreditamos que muito das representações (que geram expectativas) em relação ao professor seriam replicadas na relação orientando-orientador.

No entanto, é nossa hipótese que a relação orientando-orientador tem especificidades não contempladas na relação professor-aluno, pela tarefa própria que emerge da “orientação”, a produção de um trabalho acadêmico e pela característica da orientação, enquanto processo que se dá entre o aluno (orientando) e o professor (orientador).

A contribuição específica desta pesquisa está justamente na busca de, através do estudo das metáforas que emergem dos dados gerados, compreender a natureza das representações desta relação tão importante na formação de pesquisadores no contexto brasileiro.

No próximo capítulo, trataremos dos procedimentos metodológicos que nortearam esta pesquisa.

Documentos relacionados