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CAPÍTULO II METODOLOGIA DE PESQUISA

2.1 A natureza da pesquisa

O tema que nos propomos analisar faz parte da área humana do conhecimento, estando inserido no campo social, o que nos permite adotar um método cujo delineamento seja de natureza interpretativista ou qualitativa. De acordo com Davis (1995, p. 432):

A pesquisa qualitativa, de interesse corrente para os pesquisadores da área de aquisição de segunda língua, tem suas origens na filosofia, na teoria e nos métodos da antropologia e foi na sequência adotada por educadores na exploração de questões associadas à aprendizagem114.

114 qualitative research [...] that is of current interest to researchers in the SLA field has its origins in the

philosophy, theory, and methods of anthropology and subsequently has been adopted by educators in exploring issues associated with learning

Essa abordagem ainda é, nos dias de hoje, de interesse corrente daqueles que se preocupam com a área de aquisição de segunda língua, estando presente em trabalhos de pesquisadores brasileiros que se preocupam com o aspecto da oralidade em língua estrangeira, como, por exemplo, Borges-Almeida (2009), Ducatti (2010) e Fernandes (2011).

Lazaranton (1995, p. 459) pondera que não há uma única abordagem qualitativa, mas uma ‘variedade de abordagens alternativas’. A autora destaca o seguinte:

A literatura em Linguística Aplicada tende a ocultar essas abordagens qualitativas em uma tentativa de fazer uma distinção entre tradições de pesquisa qualitativa e quantitativa, discutindo suas atribuições (ou temas) [...] Infelizmente, o fato de as fontes da Linguística Aplicada não definirem e nem delinearem os tipos de pesquisa qualitativa causa uma certa ambiguidade e confusão em termos de compreensão sobre o que conta ou não como pesquisa qualitativa. (LAZARANTON, 1995, p. 460) 115

Para esta investigação preferimos adotar o termo pesquisa interpretativista. Esse é o mesmo termo utilizado por Erickson (1986). Embora considerada como sendo um dos vários sinônimos de pesquisa de abordagem qualitativa, o argumento de Erickson ao adotar essa terminologia nos parece bem convincente. As razões que o levaram a essa escolha são as seguintes:

(a)É mais inclusivo do que muita das outras (e.g.; etnografia, estudo de caso); (b) evita a conotação de definir essas abordagens como essencialmente não quantitativas (uma conotação carregada pelo termo qualitativa), uma vez que alguns tipos específicos de quantificações podem em geral ser empregados nos trabalhos; e (c) possui uma característica chave comum a várias outras abordagens – seu interesse central de pesquisa é o

115 The applied linguistics literature, however, tends to blur these qualitative approaches and attempts instead

first to distinguish between qualitative and quantitative research traditions themselves and then to discuss their attributes (or themes) [...] Unfortunately, because these applied linguistics sources do not all define and delineate types of qualitative research, some ambiguity and confusion remains in terms of understanding what counts as qualitative research and what does not.

significado humano da vida social e sua elucidação e exposição pelo pesquisador. (ERICKSON, 1986, p. 119) 116

Pesquisas interpretativas têm sido utilizadas pelas ciências sociais há praticamente um século. Também denominada de pesquisa de campo, essa abordagem envolve participação de longo prazo no cenário de pesquisa, registro cuidadoso dos acontecimentos através de documentação variada e subsequente análise dessa documentação. Por fim, escrevem-se relatórios com descrições detalhadas, utilizando-se vinhetas narrativas e citações retiradas de entrevistas gravadas e/ou transcrições de áudio e vídeo. As descrições de natureza mais geral também complementam esses relatos. Tais descrições têm como suporte quadros analíticos, tabelas de resumo e estatísticas descritivas.

Outra questão que merece ser abordada é o fato de que os métodos interpretativos são vistos, às vezes, como sendo radicalmente indutivos. A esse respeito Erickson (1986, p. 121) pondera o seguinte:

É verdade que categorias específicas de observação não são determinadas de forma prévia ao cenário de pesquisa pelo observador participante. Também é verdade que o pesquisador sempre identifica questões conceituais antes de entrar no cenário de pesquisa. No campo de pesquisa, indução e dedução estão em diálogo constante. Como resultado, o pesquisador persegue linhas intencionais de questionamento enquanto está em campo, mesmo que os termos específicos de questionamento, em resposta ao caráter distintivo dos eventos ocorridos no campo de pesquisa, possam mudar. Os termos específicos de questionamento também podem ser reformulados em resposta

116 (a)It is more inclusive than many of the others (e.g.; ethnography, case study); (b) it avoids the connotation

of defining these approaches as essentially non quantitative (a connotation that is carried by the term qualitative), since quantification of particular sorts can often be employed in the work; and (c) it points to the key feature of family resemblance among the various approaches – central research interest in human meaning in social life and in its elucidation and exposition by the researcher.

às mudanças de percepção e compreensão, por parte do pesquisador, dos eventos e sua organização durante o tempo gasto no campo de pesquisa. 117

Essa citação de Erickson descreve não apenas o que ocorreu principalmente no início da nossa pesquisa, como também parece revelar a essência da natureza de pesquisas de abordagem qualitativa em geral. É aqui que o mote presente na abertura deste capítulo parece fazer sentido. Deslocar-se para um campo de pesquisa como uma folha em branco à espera de que ela seja preenchida essencialmente pelo conteúdo encontrado em campo pode resultar exatamente no que diz o mote: podemos estar olhando para as informações e ao mesmo tempo não enxergá-las, por simplesmente não saber o quê estamos buscando.

Em pesquisas de natureza interpretativa, alguns questionamentos ajudam-nos a compreender melhor o objeto de pesquisa. A título de ilustração, apresentamos um questionamento que revela a ‘invisibilidade da vida diária’: o que está acontecendo aqui? À primeira vista tal pergunta parece trivial. Porém, ela não o é, pois a vida diária se apresenta a nós de forma altamente invisível (provavelmente por causa de sua familiaridade e suas contradições que as pessoas não querem ver). Não necessariamente conseguimos observar a padronização de nossas ações enquanto as estamos realizando. Por isso a pesquisa de campo auxilia tanto os pesquisadores quanto os professores a tornar o ‘familiar em estranho’ e dessa feita, interessante novamente.

O que almejamos com a presente pesquisa é exatamente ter consciência do que estamos procurando, tornando o ‘familiar em estranho’, o inconsciente em consciente, e assim podermos caminhar com maior sustentação em direção a uma formação profissional mais consistente do professor de línguas.

117 It is true that specific categories for observation are not determined in advance of entering the field setting as

a participant observer. It is also true that the researcher always identifies conceptual issues of research interest before entering the field setting. In fieldwork, induction and deduction are in constant dialogue. As a result, the researcher pursues deliberate lines of inquiry while in the field, even though the specific terms of inquiry may change in response to the distinctive character of events in the field setting. The specific terms of inquiry may also be reconstructed in response to changes in the fieldworker’s perceptions and understandings of events en their organization during the time spent in the field.

Embora nas metodologias de pesquisa de base interpretativa o que prevalece são as análises qualitativas, não podemos deixar de lançar mão de aspectos quantitativos, pois eles nos auxiliam na interpretação dos dados em geral. Allwright e Bailey (1991), por exemplo, advogam em favor de uma metodologia híbrida:

[...] vemos muito valor em investigações que combinam elementos objetivos e subjetivos, quantificando somente aquilo que pode ser utilmente quantificado e utilizando procedimentos de coleta e análise de dados onde esses são propícios. (ALLRIGHT; BAILEY, 1991, p. 67)118

Esse hibridismo vem sendo comumente utilizado por pesquisadores brasileiros que abordam, embora de outra perspectiva, o mesmo tema retratado em nosso trabalho. Veja-se, por exemplo, os trabalhos de Borges de Almeida (2009), Ducatti (2010) e Fernandes (2011). O argumento utilizado por Allright e Bailey (1991) e mais a reiteração do uso desse hibridismo em pesquisas recentes, e que abordam o mesmo tópico aqui presente, respaldam a utilização de aspectos quantitativos em nosso trabalho.

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