• Nenhum resultado encontrado

5 A TÉCNICA DA PONDERAÇÃO NA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS ENTRE PRINCÍPIOS

5.1 A NECESSÁRIA DISTINÇÃO ENTRE PRINCÍPIOS E REGRAS

Para a teoria dos direitos fundamentais, é muito importante a distinção entre regras e princípios, por constituir a base jusfundamental e por ser uma chave para solução de problemas centrais da dogmática daqueles direitos. Sem ela, explica Robert Alexy, não pode existir uma teoria adequada dos limites, sequer uma teoria satisfatória da colisão1.

Uma corrente de pensamento atribui aos princípios a característica de se oporem às normas. Alexy, por sua vez, considera que as regras e os princípios são resumidos debaixo do conceito de norma. Tanto as regras como os princípios são normas porque ambos dizem o que deve ser. A distinção entre regras e princípios é qualitativa entre dois tipos de normas2. Gomes Canotilho segue a orientação traçada por Alexy, Dworkin e outros3.

Explica Robert Alexy que princípios tem de ser concebidos das garantias diretamente estatuídas pelas disposições jus fundamentais4, enquanto as regras surgem da determinação de condições de precedência, como resultados de ponderações.

Essencialmente o debate vincula-se à aplicabilidade ou não dos princípios para a solução dos casos concretos e para a máxima efetividade do direito vigente. Os juristas tradicionais identificam a falta de efetividade à prescrição meramente principial e a produção de efeitos no mundo das relações sociais à prescrição jurídica normativa.

Segundo Robert Alexy, o ponto decisivo para a distinção entre regras e princípios é que os últimos são normas que ordenam a realização de algo na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes. Assim, os princípios são mandados de

otimização, que estão caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferentes

graus, o que depende das possibilidades reais, ou fáticas, e jurídicas5. Encontram-se na Constituição Federal brasileira de 1988 normas que podem ser classificadas como princípios

1 ALEXY, Robert. Teoría de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Políticos y

Constitucionales, 2002, p. 82.

2 Ibidem, p. 82-83.

3 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003, p.

1160.

4 Robert Alexy extrai da decisão do caso Lüth, de 1958, a noção de que os direitos fundamentais são titulados

como princípios. (ALEXY, Robert. Constitucionalismo Discursivo. Tradução de Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado: 2007, p. 72-73).

5 Idem, Teoría de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2002,

ou como regras e esta distinção é importante para quando se indaga se mesmo os direitos fundamentais que não receberam do Constituinte normatividade suficiente são auto- aplicáveis.

Princípios traduzem mandados de otimização com força constitucional, atribuindo um dever aos poderes públicos de extraírem das normas a maior eficácia concreta possível. Os direitos fundamentais caracterizados como regras constituem-se em ordem de execução e obediência vinculada6. Nesta ordem de idéias cumpre fundamental papel a teoria da ponderação de princípios constitucionais para lhes conferir efetividade.

Thomas Bustamante explica que dizer que uma norma é um mandado de otimização estabelece o dever de realizar um estado ideal de coisas na máxima medida possível, sem descrever, antecipadamente, os comportamentos necessários para tanto. São normas às quais se pode aderir em maior ou menor extensão, sendo possível cumprir em diferentes graus o comando em questão; em cada colisão entre princípios constitucionais, a forma de otimização será diferente, em razão das condições fáticas e normativas do caso concreto7.

As possibilidades fáticas são avaliadas, no caso concreto, diante dos fatos. O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras opostos, funcionando como cláusula de exceção a carga de argumentação em relação a um deles, afastando os demais, total ou parcialmente8.

Por outro lado, as regras são normas que somente podem ser cumpridas ou não. Havendo uma norma válida, deve-se fazer exatamente o que ela exige; nem mais nem menos9. As regras contêm determinações no âmbito do fática e juridicamente possível10.

6 SCHÄFER, Jairo Gilberto. Direitos fundamentais: proteção e restrições. Porto Alegre: Livraria do Advogado,

2001, p. 59.

7 BUSTAMANTE , Thomas. Princípios, regras e a fórmula de ponderação de Alexy: um modelo funcional para

a argumentação jurídica. Revista de Direito Constitucional e Internacional. São Paulo, ano 14, n. 54, jan./mar. 2006, p 83.

8 PUHL, Adilson Josemar. Princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade. São Paulo: Editora Pillares,

2005, p. 96-97.

9 Diversa é a opinião de Humberto Ávila, para quem “Também as normas que aparentam indicar um modo

incondicional de aplicação podem ser objeto de superação por razões não imaginadas pelo legislador para os casos normais” e “a afirmação de que as regras são aplicadas ao modo tudo ou nada só tem sentido quando todas as questões relacionadas à validade, ao sentido e à subsunção final dos fatos já estiverem superadas”. Humberto Ávila entende que a ponderação não é de aplicação privativa entre os princípios, já que em alguns casos as regras entram em conflito e a solução depende da atribuição de peso maior a uma delas. Assim, as regras também carecem de ponderação, admite a distinção entre as normas apenas em função do grau de abstração anterior à interpretação relativamente à norma de comportamento, maior nos princípios e menor nas regras. Enquanto as regras são normas imediatamente descritivas, os princípios são normas imediatamente finalísticas. (Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 47-48, 52-53 e 71). Também aponta divergência no grau de concretização entre as normas CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. Coimbra, Almedina, 2003, p. 1173.

10 ALEXY, Robert. Teoría de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Políticos y

O superfortalecimento do constitucionalismo hodierno, consoante Francisco Cunha Filho, para o qual a Constituição não tem palavras inúteis e inaplicáveis, difundiu as idéias de que os princípios são aplicáveis a casos concretos e no confronto com regras, sobre estas devem prevalecer11.

Fixar princípio como norma dá suporte à postura ideológica nova que, aliada ao entendimento de que os mais importantes e abrangentes princípios de uma sociedade ficam inseridos na Constituição, reforçam a necessidade de sua mais ampla e profunda concretização.

5.2 CONFLITOS ENTRE PRINCÍPIOS – A PONDERAÇÃO NA PROPOSTA DE ALEXY