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2. HENRI WALLON UMA ABORDAGEM DIALÉTICA DO

2.1 O Conjunto Funcional Afetividade

2.1.3 A paixão

Também a paixão desperta reações diferentes na criança; com elas, começam a aparecer os ciúmes, a exclusividade nas relações e as ambições. O aparecimento da paixão ocorre por volta dos três anos e depende, segundo o autor, da capacidade de autocontrole e da consciência de si. Além disso, ele parece sinalizar que a paixão tem manifestações secretas e pode modificar a emoção, tornando-a silenciosa. A paixão é um campo da afetividade que se manifesta mais tardiamente que o emocional, já que pressupõe a distinção de si mesmo em relação aos outros indivíduos. Assim:

A paixão pode ser viva e profunda na criança. Mas com ela surge o poder de tornar a emoção silenciosa. Ela pressupõe, portanto, para se desenvolver, a capacidade de autocontrole e não se pode antecipar à oposição claramente sentida entre o ego e as outras pessoas, cuja consciência não se produz antes dos 3 anos. Então a criança torna-se capaz de amadurecer secretamente frenéticos ciúmes, ligações afetivas exclusivas, ambições mais ou menos vagas mas exigentes. Na idade seguinte, as relações mais objetivas com o ambiente poderão atenuá-las. Não deixam de ser, contudo, menos

reveladoras de um temperamento. (WALLON, 1968, p. 140)

O processo de desenvolvimento da afetividade evolui da emoção, que tem predominância motora, sendo a expressão corporal da afetividade, para o sentimento, cuja predominância é cognitiva, sendo a representação da afetividade, e para a paixão na qual predomina o controle e a objetividade da ação para atingir uma meta. Em todas as fases da vida, as três formas de afetividade continuam presentes como forma de reação ao meio externo e ao meio interno do indivíduo, podendo predominar de acordo com a situação.

2.2 O Adolescente e o Adulto: seu Desenvolvimento na Teoria Walloniana

A escolha da teoria de Henri Wallon para iluminar a questão do retorno de jovens e adultos à educação formal decorre da necessidade de encontrar subsídios para compreender que cada etapa do desenvolvimento humano corresponde a um tipo de comportamento predominante. Assim, senti a necessidade de abordar o estágio da adolescência e o estágio do adulto

com o objetivo de auxiliar a compreensão do leitor sobre os sujeitos deste estudo.

2.2.1 O adolescente

A adolescência é o período em que, sob efeito de secreções de hormônios, originadas em particular pelos órgãos sexuais, produzem nos meninos e meninas modificações, caracteres secundários do sexo, que acentuam as diferenças dos dois sexos. Nos meninos aparecem o bigode, a barba. Nas meninas, ocorre a menarca. Simultaneamente a estas modificações morfológicas, produzem-se modificações de ordem psíquica. Wallon destaca que, na adolescência, há um sentimento de estranheza em relação a si próprio, ao seu passado, aos seus hábitos, à sua família. O adolescente sente que está se transformando em uma outra pessoa. Duvida do que está mudando, se ele ou o meio em que está inserido. Reconhece a si próprio como contraditório, tem a impressão de viver numa atmosfera de mistério, interroga-se a si próprio, sobre seus segredos.

A ambivalência é a sua lei, como também a da posse sexual, que é ao mesmo tempo posse ativa e passiva. É a idade dos fervores religiosos, metafísicos, políticos ou estéticos. Segundo a teoria walloniana, esses sentimentos e atitudes ambivalentes traduzem todo o desequilíbrio interior

do adolescente e se constituem na característica principal do estágio da puberdade Segue-se a preocupação pelo ser ideal em que possa encontrar o complemento da sua própria pessoa: ser imaginário ou real, mas dotado dos méritos ou dos atrativos desejáveis.

Em seus estudos, DANTAS (1992) reflete sobre as divagações sentimentais dos adolescentes. Estas novas necessidades transformam profundamente a pessoa do adolescente. Acrescentam-lhe novas dimensões. Colocam-lhe as questões do seu destino e das suas responsabilidades. Convidam-no a refletir sobre a razão e sobre o valor que o rodeia. Tornam-se acessíveis certos juízos de moralidade e certos modos de conhecimento já não se limitam a aprender as coisas na sua existência aparente, mas procuram aprender as leis que as fazem existir, leis presentes na cultura em que o adolescente está inserido.

O jovem insatisfeito com ele mesmo e com as relações que o unem a seu meio se desorienta porque não sabe se foi ele ou a sua família que mudou. O adolescente reconhece essa contradição, perturba-se com isso, mas não sabe como reagir. Sua reação inicial diante das transformações não tem um rumo definido: ora o jovem sabe o que quer ora não sabe.

Estas características são resultantes dos aspectos já mencionados neste capítulo: a predominância do domínio afetivo e o desenvolvimento voltado para o conhecimento de si.

As divagações sentimentais dos jovens não atingem o mesmo grau em todos os indivíduos. Podem ser freadas pelas exigências do seu cotidiano.

(...) o filho da burguesia, sobretudo da burguesia de outrora, daquela que estava ainda em seu conjunto quase certa de seus recursos (meios de subsistência), estava numa dependência muito mais prolongada em relação à família. Estava ligado financeiramente à família durante muitos anos, e isso podia fazer nascer nele sentimentos diversos, conforme se a família lhe repreendia as despesas prolongadas que causava ou, pelo contrário se fazia gloria de ter um filho que até aos 25 ou 30 anos não tinha necessidade de trabalhar para ganhar a vida (...) Como essas ações e essas reações do meio sobre o individuo tem influência para a formação da personalidade! (WALLON, 1975, p. 220)

Apesar de Wallon estar se reportando à burguesia francesa do início do século XX, a descrição feita é bastante pertinente à classe burguesa brasileira de hoje, porque enquanto os adolescentes da classe média ampliam sua adolescência, os adolescentes oriundos da periferia enfrentam precocemente uma realidade social, de trabalho, de

necessidade de colaborar para a sobrevivência da família, uma realidade muitas vezes de violência.

2.2.2 O adulto

O adulto deve ter atingido um equilíbrio entre o afetivo, o cognitivo e o motor, já tendo definido seus valores. Procede, então, de acordo com os valores assumidos; possui responsabilidade pelas conseqüências de seus atos e tem comando sobre as situações que envolvem as dimensões cognitivo-afetivo-motoras.

Segundo Wallon (1975), no adulto da espécie humana, o pensamento constitui sua ferramenta mais adequada para agir sobre o meio, mas não pode esquecer que a dimensão cognitiva está imbricada na dimensão afetiva e na motricidade.

A pessoa está continuamente em processo. Falar em processo significa afirmar que há um movimento contínuo de mudanças, de transformações desde o início da vida até seu término. [...] Internamente esse processo se caracteriza por um jogo de tensões entre os conjuntos motor, afetivo e cognitivo. (MAHONEY, 2003, p. 16)

Os movimentos voltados para construção do eu e a exploração do meio permanecem durante toda a vida. Diante de situações novas, para as quais não há recursos totalmente desenvolvidos, O adulto caminha, tal qual a

criança, do sincretismo para diferenciação, ou seja, nos momentos de imperícia. Quando não tem competência para resolver problemas a situação fica nebulosa e gradativamente adquire contornos mais claros. Neste momento, a atuação de acolhimento do “outro”, que no caso, é o professor, poderá diminuir a carga emotiva e facilitar a utilização da razão.

[...] nossa segurança vem menos da convicção sobre a

verdade inflexível que conhecemos, e mais do

processo flexível pelo qual a verdade, pode

gradualmente ser aproximada.

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

3.1 Decisões tomadas para coleta de dados

A coleta de dados ocorreu em meados de novembro de 2005. Tendo o termo se iniciado em agosto de 2005, estavam os alunos, na mesma classe, há três meses e meio.

Considerando o problema de pesquisa: “O que sente o aluno da Educação de Jovens e adultos ao retornar à escola, no primeiro dia de aula?”, a decisão quanto à escola estava tomada: deveria ser uma escola que mantivesse o curso de EJA, ou curso supletivo como é conhecido na rede pública do município de São Paulo. A nossa segunda opção foi por uma escola da rede municipal, onde a pesquisadora fosse docente, para desenvolver nela uma pesquisa de abordagem qualitativa.

Nossa terceira decisão foi pelos instrumentos de pesquisa: redações. Desta escolha, decorreu a escolha dos sujeitos. Considerando a opção por redações, precisaríamos contar com sujeitos que conseguissem se expressar de forma escrita. Assim, selecionamos 15 alunos, do ciclo I, de uma classe do 4º Termo do ciclo I. A opção por redações deve-se ao fato de querer tomar o aluno numa situação típica de sala de aula, na qual ele saberia lidar com a sua tarefa, porque o faz cotidianamente. A comanda

para esta atividade foi a seguinte: Descreva como você se sentiu

quando chegou à escola, no primeiro dia de aula, para reiniciar seus estudos. (No Anexo 2, encontram-se as redações elaboradas pelos

alunos)

Decidimos, também, solicitar que os alunos preenchessem um questionário de caracterização.

3.2. A coleta de dados

A coleta de dados foi realizada em duas etapas. No primeiro dia, foram aplicados os questionários de caracterização dos alunos, o grupo mostrou- se bastante receptivo e demonstrou boa vontade para responder as perguntas. No dia seguinte, foram aplicadas as redações. Observei certa tensão dos alunos em escrever correto as palavras e em dar coerência ao texto, pediam o auxilio do professor ou até mesmo da pesquisadora. Expliquei que os lapsos ortográficos e de concordância seriam desconsiderados e que deveriam escrever o máximo de lembranças que tivessem sobre os sentimentos e emoções ocorridos no primeiro dia de aula, naquela instituição. A presença da pesquisadora não alterou a dinâmica da classe, porque é figura conhecida por todos.

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