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1.1.2. Fala e Escrita

1.1.2.3. A perspectiva sociointeracionista proposta por Marcuschi

Segundo Marcuschi (2007a), a linha sociointeracionista é o caminho mais sensato para tratar das semelhanças e diferenças entre fala e escrita nas atividades de formulação textual, por meio das correlações entre suas formas lingüísticas, contextualidade, interação e cognição.

A relação entre fala – escrita é caracterizada dentro de uma visão sociointeracionista pelo fato dessas duas modalidades da língua apresentarem, concomitantemente, “dialogicidade, usos estratégicos, funções interacionais, envolvimento, negociação, situacionalidade, coerência e dinamicidade” (MARCUSCHI, 2007a, p.33).

O autor admite que, por mais que esta perspectiva esteja livre dos problemas ideológicos e preconceituosos, padece de um baixo potencial explicativo e descritivo dos fenômenos sintáticos e fonológicos da língua, bem como das estratégias de produção e compreensão textual.

No entanto, Marcuschi (2001b, p.29), tomando como base Street (1995, p.167-170), afirma que, entre os mitos da relação fala - escrita postulados na tese da “grande divisão” e que ainda persistem na visão do contínuo estariam:

1 - A idéia de que a escrita codifica lexical e sintaticamente os conteúdos, enquanto que a fala usa os elementos paralingüísticos como centrais; 2 - A idéia de que o texto escrito é mais coesivo e coerente do que o oral, sendo a fala fragmentária e sem conexão; 3 – a noção de que a escrita conduz os sentidos diretamente a partir da página impressa, sendo que a fala serve do contexto e das condições da relação face a face.

Nesta perspectiva, estão as análises que se dedicam a perceber as diversidades das formas textuais produzidas em co-autoria como a conversação, assim como as formas textuais em monoautoria, como os monólogos. Esta perspectiva trata ainda dos fenômenos de compreensão na interação face a face e na interação entre leitor e texto escrito, detectando as especificidades da atividade de construção de sentidos.

processo de geração de sentidos, constituindo um fluxo de produção textual organizado, seja ele oral ou escrito, e que, é possível detectar em toda atividade conversacional um caráter interativo, visto que ali ocorre um envolvimento entre os participantes numa dada situação.

Para Marcuschi (2007a), a perspectiva sociointeracionista preocupa-se com os processos de produção de sentido tomando-os sempre como situados em contextos sócio-históricamente marcados por atividades de negociação ou por processos inferenciais, como também a análise dos gêneros textuais e seus usos na sociedade.

Na perspectiva defendida aqui, fala e escrita não apresentam propriedades intrínsecas negativas, nem propriedades intrínsecas privilegiadas, pois seria equivocado postular algum tipo de supremacia de alguma das duas modalidades já que, dentro desta perspectiva, não podemos afirmar que a fala é superior a escrita ou vice-versa.

Segundo Marcuschi (2007a), a oralidade jamais desaparecerá, nem também a escrita. Dessa forma, uma estará sempre ao lado da outra, como um grande meio de expressão e de atividade comunicativa. O autor afirma que a oralidade enquanto prática social é inerente ao ser humano e jamais poderá ser substituída por alguma tecnologia, sendo este um fator de identidade social, regional e grupal dos indivíduos. Já a escrita, pelo fato de ser pautada padrão, não é estigmatizadora e não serve como fator de identidade individual ou grupal.

De acordo com Marcuschi (2007a, p. 42) e sua perspectiva sociointeracional aqui defendida, ao considerar a relação fala - escrita em uma visão não-dicotômica, pode-se formulá-la como:

O contínuo dos gêneros textuais distingue e correlaciona os textos de cada modalidade (fala e escrita) quanto às estratégias de formulação que determinam o contínuo das características que produzem as variações das estruturas textuais-discursivas, seleções lexicais, estilo, grau de formalidade etc., que se dão num contínuo de variações, surgindo daí semelhanças e diferenças ao longo de contínuos sobrepostos.

Para Marcuschi e Dionísio (2005), tanto a fala como a escrita se dão num contínuo de variações, no qual surgem semelhanças e diferenças ao longo de dois contínuos sobrepostos. Com isso, a comparação entre essas duas modalidades deverá tomar, como critério, uma relação fundada no contínuo dos gêneros textuais.

entre fala e escrita através de uma visão contínua que se dá na comparação com gêneros textuais. O autor sugere um quadro geral na tentativa de agrupar os gêneros e indicá-los ao longo do contínuo, da seguinte maneira:

Segundo Marcuschi e Dionísio (2005), a oralidade tem formas de textualização especiais que servem aos propósitos do armazenamento do conhecimento e que não correspondem exatamente à fala do cotidiano. Dessa forma, a escrita em sua forma de textualização, se apropriou do modo de organizar o texto em suas propriedades formais a partir do discurso oral para levá-lo ao escrito.

De acordo com os estudos de Feldman (1995, apud MARCUSCHI e DIONÍSIO, 2005) sobre a linguagem oral em povos sem escrita, quando uma cultura não possui gênero escrito de código de leis, com freqüência ocorre um gênero oral que desempenha a mesma função, concluindo, com isso, que a variação estilística da fala expressa em gêneros é um traço universal de todas as culturas.

Por isso, concordamos com Marcuschi (2001b) ao afirmar que contexto cultural exerce forte influência sobre o papel da escrita, o que diminui a diferença

DISTRIBUIÇÃO DOS TEXTOS DE USO FALADOS E ESCRITOS NO CONTÍNUO GENÉRICO

COMUNICAÇÕES PESSOAIS COMUNICAÇÕES PÚBLICAS TEXTOS INSTRUCIONAIS TEXTOS ACADÊMICOS FALA ESCRITA CONVERSAÇÕES ENTREVISTAS APRESENTAÇÕES E REPORTAGENS EXPOSIÇÕES ACADÊMICAS

- divulgação científica - textos acadêmicos - manuais escolares - artigos científicos - textos publicitários - textos profissionais - legislação -resumos - documentos oficiais -notícias de jornal - cartas comerciais - editoriais de jornais - relatórios técnicos -cartas pessoais -formulários - cartas do leitor -instruções de usos - processos

-bilhetes - entrevistas - telegramas - bulas

- volantes de rua - atas de reuniões - convocações - receitas em geral - inscrições em paredes - comunicados

- avisos - anúncios classificados

-noticiário de rádio - noticiário de TV - exposição acadêmica - aulas - conferência

- inquéritos - discursos oficiais - reportagens ao vivo - discursos festivos - noticiário de TV ao vivo -relatos

- entrevistas pessoais - noticiário de rádio ao vivo - narrativas -debates - exposições informais - piadas

- conversas públicas -discussões no rádio e TV - conversa espontânea

entre fala e escrita, sendo os modos mais similares do que diferentes no seu impacto sociológico.

Segundo Koch (2006a), a escrita formal e a fala informal constituem os pólos opostos de um contínuo, ao longo do qual se situam os diversos tipos de interação verbal.

Signorini (2001) compreende que o texto sociointeracional fundamenta- se: a) nas formações dos papéis interativos e suas posições estruturadas de atuação; b) nas inúmeras ressonâncias de produções discursivas anteriores ou concomitantes (relação multivocalidade ou de autoria); c) nas categorias metadiscursivas mobilizadas pelos processos de textualização e de re(con)textualização; d) nos diferentes níveis e graus em que se dão as formas textuais, sejam elas nas modalidades oral ou escrita; e) nos códigos gráficos – visuais; f) nos gêneros discursivos e nos modelos textuais, sempre caracterizadas pela presença da fala na escrita ou vice-versa.

Com isso, surgem nos textos sociointeracionais traços na escrita com características da fala e marcas da fala na escrita, como veremos melhor a seguir.