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A política pendular de Vargas e o rompimento com o Eixo

1. ALEMÃES: A POLÍTICA NO BRASIL, NO PARANÁ E EM CURITIBA

1.6 A política pendular de Vargas e o rompimento com o Eixo

Desde o início da Segunda Guerra Mundial, a ideologia do Estado Novo, sob o comando de Getúlio Vargas, apontava para um provável alinhamento do Brasil com os

países do Pacto de Aço – Alemanha e Itália. Vargas havia instalado no país uma ditadura, apoiada em uma constituição centralizadora e autoritária, que guardava muitos pontos em comum com as ditaduras fascistas.

Seitenfus (2003, p. 223) ensina que a posição dos EUA em relação ao Brasil era bastante incômoda, precisavam solucionar as questões referentes aos acordos e negociações econômicas e militares que estavam em curso, buscando fortalecer a tendência democrática dentro do governo brasileiro. Em relação à política externa brasileira:

Contrastando com a confusão reinante nas relações internacionais logo após junho de 1940, a política externa brasileira se apresenta de maneira singela. Assemelha-se a fins de 1937, quando a adoção de um regime de tipo fascista coloca em oposição uma tendência liberal, voltada para os Estados Unidos, e uma tendência totalitária, que aspira estreitar os vínculos com a Alemanha (SEITENFUS, 2003, p. 233).

Vargas buscou manter-se neutro o máximo que pode suportar, recebendo benefícios e mantendo acordos com os Aliados e com os países do Eixo, realizando uma espécie de “política pendular”. No entanto, as pressões norte-americanas, após o ataque de Pearl Harbor, foram intensas, contando com o apoio de outros países latino- americanos e de diversos mecanismos, especificamente aqueles que foram considerados mais eficientes: a liberação de recursos para o país e as ameaças constantes de rompimento de relações comerciais e econômicas.

Alguns militares e diplomatas brasileiros acreditavam que o rompimento das relações diplomáticas e comerciais com o Eixo poderia ser tratado não como declaração de guerra, mas como uma forma de cumprimento jurídico dos compromissos pan-americanos. Não obstante, essa falsa ideia de manutenção da paz através do direito internacional cai quando Aranha recebe três correspondências oriundas dos consulados eixistas, sendo em comum nas missivas o fato que qualquer

rompimento de relações com o Eixo seria interpretado como o estopim para a declaração de guerra.

Foi a Conferência do Rio de Janeiro, em janeiro de 1942, que marcou profundamente a relação entre os países americanos e o Eixo. A Conferência contou com a presença de vinte e um países e recomendou a ruptura diplomática imediata com as potências eixistas.

O referido encontro de chanceleres acabou com as dúvidas norte-americanas em relação ao Brasil, que por sua vez exigiu o imediato investimento financeiro dos EUA no país, visando à manutenção dos acordos militares e econômicos que foram premeditados durante o período de neutralidade.

Esse clima ameno prolongou-se até março de 1942, com o torpedeamento de navios brasileiros pelo governo alemão, que até então, apoiado por vários grupos do governo Vargas e das comunidades teuto-brasileiras do sul do país, mantinha “um sistemático trabalho de difusão da ideologia nazista no Brasil” (BERTONHA, 2001, p. 47).

Os alemães não respeitaram a suposta neutralidade brasileira e resolveram tomar atitudes diretas contra o país, torpedeando os navios mercantes brasileiros destinados ao abastecimento do mercado estadunidense de matérias-primas para fins bélicos, como a borracha. Mais do que isso, julgaram necessário revitalizar as relações com os opositores de Vargas em caso de uma vitória do Eixo, garantindo o controle político no Brasil; para esses fins, procuraram os integralistas para auxiliar na preparação do pós-guerra.

Até 1942, os alemães constituíam, na visão de Dietrich (2008), apenas um perigo étnico, porém a partir da declaração de guerra ao Eixo ganharam o status de “perigo ideológico e militar”, iniciando-se a partir desse momento um sistematizado

programa de controle, investigação, vigilância e repressão generalizada acerca dos imigrantes.

A declaração de guerra ao Eixo pelo Brasil foi oficializada em 22 de agosto de 1942 e efetivada a adesão do país na Segunda Guerra Mundial ao lado dos EUA, tornando o alemão um elemento indesejável na sociedade brasileira. O torpedeamento dos navios mercantes brasileiros, as constantes investidas diplomáticas e o exagero discursivo do governo em relação aos perigos da guerra aproximaram a população do confronto mundial e nela despertaram a “lógica da desconfiança” 23 em relação ao elemento eixista.

Aquino (1995, p. 177) sugere que o Brasil não foi o único país que demorou a tomar parte da guerra; o México (março de 1942), o Chile (janeiro de 1943) e por fim a Argentina (janeiro de 1944) compunham junto ao país a lista de retardatários na América Latina. A historiadora ainda acomete a indecisão de Vargas ao fato de o país estar sob a égide de um regime autoritário e que passava por fortes pressões de uma potência de regime democrático, como era o caso dos EUA.

Bertonha (2001) registra o fato de que Vargas, ao apoiar claramente os Aliados, colocava seu próprio governo em xeque; afinal, como poderia incitar os brasileiros a protestarem contra as ditaduras fascistas sem que estes se revoltassem contra a ditadura aplicada no Brasil? Outro fator negativo para Vargas era a dificuldade das pessoas entenderem a real necessidade do país participar da guerra enviando tropas, sendo que a guerra acontecia muito distante do cotidiano das pessoas.

23

Para uma melhor compreensão, ver: DEOPS – A lógica da desconfiança. Rio de Janeiro: Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, 1993. Outras obras auxiliam na ampliação do conhecimento acerca do tema, como as de: MAGALHÃES, Fernanda Torres. O suspeito através das lentes. O DEOPS e a imagem da subversão (1930-1945). São Paulo: Imprensa Oficial, 2008. CANCELLI, Elizabeth. O mundo das violências: a polícia na Era Vargas. Brasilia: EDUNB, 1993. CARNEIRO, Maria L. T.. Livros proibidos, idéias malditas: O DEOPS e as minorias silenciadas. 2 ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2002.

O ex-combatente da FEB, Boris Schnaidermann (1995, p. 285), informa que havia grande desânimo entre os convocados para lutar na Europa, porque até mesmo para os soldados era difícil conceber uma luta pela democracia saindo de um país dominado por uma ditadura severa. Reforça ainda que os estudantes nas ruas e os quebra-quebras generalizados ocorridos em vários cantos do país eram superficiais e que muitos julgavam não haver motivos para lutar.

Esses fatores obrigaram o governo a realizar uma política de mobilização restrita e controlada para que não tivesse maiores problemas com a população e para que o projeto de nacionalização não perdesse a força. Visando a um alinhamento da população, o governo varguista criou uma série de repartições que dariam suporte às questões de guerra, como a Comissão de Mobilização Econômica, que tomou a frente na criação de um “front interno”.

Com a entrada efetiva do país no conflito mundial, iniciou-se um período de escassez de alimentos, racionamento de combustíveis, carestia de preços e de medos que até então não faziam parte do cotidiano, como a ameaça de invasão do país e da falta total de suprimentos de primeira necessidade.

Dado o pano de fundo, procuraremos apontar, nos capítulos subseqüentes, como a campanha de nacionalização, iniciada em 1937, e a efetiva participação do país no conflito bélico mundial acarretaram mudanças no cotidiano de Curitiba, avaliando como a imprensa paranaense e as leis restritivas se constituíram em fatores que levaram a população às ruas e a tomar medidas violentas contra os imigrantes. Objetivamos também apresentar a força do aparato policial da DOPS/PR através dos seus próprios documentos, atualmente disponíveis no Arquivo Público do Estado do Paraná.