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A.privatização de serviços públicos e a possibilidade de concorrência entre os

CAPÍTULO I A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS NO

2.4. A.privatização de serviços públicos e a possibilidade de concorrência entre os

No capitulo anterior, cuidou-se de precisar a importância do regime jurídico administrativo como fundamento para a conceituação da prestação de uma atividade econômica estatal como serviço público. Na ocasião, todo esforço foi empreendido no sentido de demonstrar que existem, de fato, dois regimes jurídicos na Constituição Federal, responsáveis pela distinção entre serviços públicos (art. 175) e atividade econômica em sentido estrito (art. 173).

No primeiro caso, tais atividades são prestadas sob o que se costuma chamar de regime de privilégio: o Estado detém a titularidade da prestação dos serviços públicos. No segundo, existe a transferência, por lei, da execução de atividades que a Constituição entendeu por bem designar como sendo típicas da iniciativa privada. Aqui, além da ausência de titularidade estatal, existe a presença de um regime de concorrência entre as empresas estatais e as demais empresas privadas, baseado no princípio da livre concorrência, expresso no art. 170, IV da CF.

LOPES, 1998, p. 363. No mesmo sentido, v. BONATO, 1998, p, 110.

Prestação direta é, como foi visto no item 1.4.1., aquela exercida pela Administração Pública direta

(órgãos da União, Estados ou Municípios) ou pela Administração Pública indireta. Os serviços públicos enquanto atividades econômicas eram prestados diretamente pelo Estado através da Administração Pública

Em outras palavras, estas constatações permitem que se faça, a prori, a seguinte afirmação:

os serviços públicos não são, nem podem ou devem ser explorados em regime de competição. Porque prestados em regime de serviço público, hão de ser exercidos sob privilégios, inclusive, em regra, o que corresponde a sua prestação. Note-se que é justamente a virtualidade desse privilégio de exclusividade na prestação do serviço que toma atrativo para as entidades do setor privado o seu exercício, como concessionárias ou permissionárias dele”^".

Entretanto, com o advento das privatizações sobre a prestação dos serviços públicos, surge uma questão interessante. De fato, o Estado delega, p. ex., a prestação do serviço público de telefonia, não a uma, mas a várias empresas privadas^*^. Neste contexto, como negar a existência de uma atmosfera competitiva entre estas empresas, ainda que submetidas ao regime de privilégio ?

Assim é que a questão em pauta merece ser tratada, antes de tudo, através da inter- relação entre dois princípios constitucionais da ordem econômica, quais sejam, os da livre concorrência e defesa do consumidor (art 170, IV e V da CF). Ao contrário do que se possa imaginar, tais princípios não são conflitantes, mas complementares, i. é, atuam como

FARENA, 1998, p. 693.

No Brasil, é do conhecimento geral a existência de várias empresas operando no setor. No sul do país (mais precisamente, no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina) existe a Embratel e a Intelig (que operam em âmbito nacional), bem como a Telesc e a CTMR, que atuam regionalmente. Tratam-se de empresas privadas, submetidas ao regime jurídico administrativo (art. 175 da CF), pois estão vinculadas ao Estado por contratos de concessão.

FARENA, 1998, p. 694. O exemplo das empresas de telefonia não foi utilizado por acaso. Ocorre que esta atmosfera competitiva se faz muito mais presente nos serviços públicos de telecomunicações do que nos serviços públicos de energia elétrica. Nestes, a competição já não se faz sentir de um modo tão intenso, porque se houver mais de uma empresa fornecedora, este fornecimento, por estas duas o mais empresas, contará, por via de regra, com apenas uma fonte de geração de energia (usina e seus recursos). Neste caso, pode ser forçoso falar em competição. Entretanto, o setor de energia elétrica pode ser uma exceção, se comparado a outras atividades econômicas prestadas sob o regime jurídico de Direito Administrativo. Além dos serviços de telefonia, podem ser citados também os serviços de transporte coletivo ou de transporte interestadual ou internacional de passageiros.

fundamento para o equilíbrio das relações de consumo, nas quais está inserida a prestação de serviços públicos^

No contexto da multiplicidade de empresas privadas (concessionárias ou permissionárias) como prestadoras de determinados serviços públicos, pode-se observar que a complementariedade dos princípios constitucionais supracitados não resulta em ameaça ao regime jurídico administrativo do art. 175 da CF.

Em outros termos, pode-se afirmar o seguinte: não importa quantas empresas privadas existam, sempre haverá o vínculo contratual entre essas e o Estado, pesando em favor do mesmo a faculdade de dispor sobre o destino do contrato, i. é., sobre a prestação dos serviços públicos - respeitados os direitos das concessionárias - em função do interesse público.

É importante ressaltar que a exploração das atividades econômicas em sentido estrito (art. 173 da CF) se dá mediante imia realidade efetiva de livre concorrência, pois um novo competidor pode surgir a qualquer momento^'^. Entretanto, quando a análise recai sobre a prestação de serviços públicos, observa-se que não há a mesma intensidade na concorrência entre as empresas concessionárias, justamente por causa da submissão dessas ao regime jurídico administrativo, o qual está vinculado aos princípios da supremacia e indisponibilidade do interesse público.

Desta feita, uma vez refutada a descaracterização do regime jurídico administrativo pelo reconhecimento da complementariedade entre os princípios constitucionais da livre concorrência e defesa do consumidor, há que se reconhecer, na prestação dos serviços públicos privatizados, a incidência de uma atmosfera competitiva^^'^, onde a atuação do

“Se, de um lado, o Princípio da Livre Concorrência, concebido como defesa da competição, autoriza o Estado a promover a defesa da concorrência entre os concessionários, por outro, o Princípio da Defesa do Consumidor toma a possibilidade de escolha um direito fundamental, que só excepcionalmente pode ser suprimido, e não sem que sejam reforçadas outras formas idôneas de proteção ao consumidor. Assim, complementam-se mutuamente os princípios constitucionais da Defesa do Consumidor e da Livre Concorrência” {Idem, p. 701).

Idem, p. 696. Idem. Ibidem.

Estado e dos consumidores se toma imprescindível no que respeita à regulação e fiscalização desses serviços.

Estado e consumidores devem, pois, zelar pela permanência da concorrência entre as empresas. Quanto aos consumidores, o princípio da livre concorrência é uma das formas de se garantir a liberdade de escolha do serviço, segundo os critérios que os mesmos julgarem convenientes (tarifas mais baixas, maior rapidez na prestação, etc. ). A permanência de um ambiente competitivo entre as empresas privadas prestadoras de serviços públicos, também contribui para investimentos das mesmas na qualidade da prestação, com a intenção de atrair mais consumidores. E é o aspecto da qualidade que desperta maior atenção neste trabalho, pois está relacionado à efetivação dos direitos dos consumidores- usuários de serviços públicos.

Assim, da mesma forma que Estado e consumidores devem ser parceiros na defesa da concorrência entre as empresas privadas, também o devem ser no controle da prestação dos serviços públicos, voltado para a permanência ou melhora na qualidade dos mesmos. Ao Estado, no exercício de sua função legislativa, cabe ainda regulamentar os meios institucionais para que esta ‘parceria regulatória’ seja efetivada. Quanto aos consumidores, devem se conscientizar de que não são apenas titulares de direitos, mas agentes participantes na efetivação dos mesmos.

CAPÍTULO n i

A PARTICIPAÇÃO DOS CONSUMIDORES BRASILEIROS NO CONTROLE DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS

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