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O art. 243 da Constituição da República não confere existência e eficácia à propriedade cujas glebas sejam destinadas ao cultivo de plantas psicotrópicas, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, prevendo-se a sua expropriação, sem qualquer indenização ao proprietário, destinando-a ao assentamento de colonos.

Nada obstante, o parágrafo único deste artigo reza que os bens de valor econômico serão igualmente confiscados e revertidos ao tratamento e recuperação clínica dos dependentes químicos, e no próprio aparelhamento do Estado para enfrentar este problema.

Esta previsão constitucional vem a efetivar o princípio da função social da propriedade, haja vista o seu patente descumprimento ao ser ela utilizada com a finalidade de abastecer o odioso tráfico de entorpecentes.

Assim, reza a referida disposição constitucional:

Art. 243. As glebas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas serão imediatamente expropriadas e especificamente destinadas ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins será confiscado e reverterá em benefício de instituições e pessoal especializados no tratamento e recuperação de viciados e no aparelhamento e custeio de atividades de fiscalização, controle, prevenção e repressão do crime de tráfico dessas substâncias.

Em tramitação no Congresso Nacional, a PEC do Trabalho Escravo, de número 438, propõe modificar o art. 243 da Constituição, dando-lhe nova redação, para também abranger neste dispositivo o perdimento da propriedade onde for verificada a exploração de trabalho escravo, esteja ela no campo ou na cidade, revertendo-a, preferencialmente, aos trabalhadores que nela já trabalhavam.

A citada Proposta de Emenda Constitucional assim propõe:

Art. 243. As propriedade rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º.

Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com a destinação específica, na forma da lei.

A aprovação desta emenda constitucional, observando-se o art. 60 da Constituição Federal, a qual é discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional em dois turnos e concordância mínima de três quintos dos membros de cada uma delas, virá a coroar a

obrigatoriedade da funcionalização da propriedade. Nesse contexto, deve-se faz referência ao art. 182 e seguintes da Constituição, que trata da política urbana e ao inciso IV do art. 186 da Carta Política, o qual reza que somente será cumprida a função social a propriedade rural se observadas as normas relativas às relações de trabalho.

A propósito, o Código Penal, em seu art. 149, na redação da Lei n° 10.803, de 11.12.2003, para além de tipificar como crime a conduta do agente que reduzir alguém à condição análoga a de escravo, define o conceito de trabalho escravo.

De acordo com o mencionado dispositivo, deve-se entender por trabalho escravo, a submissão a trabalhos forçados, à jornada exaustiva, à sujeição a condições degradantes de trabalho, ou a restrição da locomoção do trabalhador por causa de dívidas.

Nada obstante, a Organização Internacional do Trabalho, na Convenção n° 29 (“Sobre o trabalho forçado ou obrigatório”), em seu artigo 2°, alínea “1”, prevê que “a expressão ‘trabalho forçado ou obrigatório’ compreenderá todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob a ameaça de sanção e para a qual não se tenha oferecido espontaneamente”. Frise-se, o Brasil é signatário desta Convenção.

Igualmente, o Brasil ratificou a Convenção n° 105 (“Convenção relativa a abolição do trabalho forçado”), cujo endosso faz o país comprometer-se a abolir toda e qualquer forma de trabalho forçado ou obrigatório, não utilizando-o:

a) como medida de coerção ou de educação política ou como punição por ter ou expressar opiniões políticas ou pontos de vista ideologicamente opostos ao sistema político, social e econômico vigente;

b) como método de mobilização e de utilização da mão-de-obra para fins de desenvolvimento econômico;

c) como meio de disciplinar a mão-de-obra; d) como punição por participação em greves;

e) como medida de discriminação racial, social, nacional ou religiosa.

Desses congruentes conceitos previstos no ordenamento jurídico brasileiro pode ser observada a sua clareza, exsurgindo a desnecessidade de rediscussão desta ideia específica para que seja efetivamente implementado o abordado mecanismo de confisco.

Sendo assim, após a constatação de trabalho escravo por uma equipe interdisciplinar, composta principalmente por auditores do trabalho, Ministério Público, assistentes sociais e outras

áreas afins, mediante parâmetros já estabelecidos na legislação infraconstitucional, será o empregador autuado, oportunizando a ele o devido processo legal para que comprove não ter ele cometido a grave infração.

Aprovada em segundo turno na Câmara dos Deputados em 22 de maio de 2012, a Proposta de Emenda Constitucional em apreço foi subsequentemente remetida ao Senado Federal para a continuidade das discussões, o qual deverá rejeitá-la ou também aprová-la, em dois turnos, observado o art. 60 da Constituição da República.

Abordado especificamente o descumprimento da função social por redução dos trabalhadores à condição análoga a de escravo e do cultivo de plantas psicotrópicas, passa-se a abordar, de forma ampla, o perdimento da propriedade.