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2. ARTICULANDO OS CONCEITOS DE DIALOGICIDADE E AÇÃO

2.2 A Teoria da Ação Comunicativa de Jürgen Habermas

2.2.1 A racionalidade instrumental

No lugar de sujeito solitário, que se volta para objetos e que, na reflexão, se toma a si mesmo por objeto, entra não somente a idéia de um conhecimento lingüisticamente mediatizado e relacionado com o agir, mas também o nexo da prática e da comunicação quotidianas, no qual estão inseridas as operações cognitivas que têm desde a origem um caráter intersubjetivo e ao mesmo tempo cooperativo. (HABERMAS, 2003, p.25)

Nos estudos a respeito da sociedade capitalista moderna, encontramos em Weber18 o conceito de "racionalização", na intenção de interpretar o processo de

desenvolvimento existente nas sociedades modernas. O autor Max Weber (1974) analisa esse processo como característica da ampliação crescente de esferas sociais que ficam submetidas a critérios técnicos de decisão racional, isto é, a critérios de adequação e

17 Segundo Pinto (1996), o paradigma de consciência está pautado na idéia de um pensador solitário que busca entender o mundo em que vive descobrindo as leis gerais que o governam. Este paradigma ressalta a subordinação do objeto frente ao sujeito.

18 Max Weber (1864-1920), um grande intelectual e economista político alemão, em meio aos sociólogos, é considerado um dos modernos fundadores da sociologia.

organização de meios em relação a determinados fins. Como exemplo, citamos a urbanização das formas de existência, a tecnificação do tráfego e da comunicação. Os planejamentos, o cálculo e a tecnologia, cada vez mais, se constituem partes integrantes das questões administrativas que compreendem os processos de desenvolvimento das sociedades. Se assim é, que contribuição real e positiva traz o desenvolvimento da ciência para a “vida” prática e pessoal do indivíduo dentro da sociedade? Sobre isso, Weber nos explica que:

[…] a ciência contribui para a tecnologia do controle da vida calculando os objetos externos bem como as atividades dos homens... a ciência pode contribuir com métodos de o pensamento, os instrumentos e o treinamento para o pensamento... e a clareza... Na prática, podeis tomar esta ou aquela posição em relação a um problema de valor – simplificando, os fenômenos sociais por exemplo. Se não tomardes esta ou aquele posição, segundo a experiência científica, tereis de usar tais e tais meios para colocar em prática vossa convicção. Ora, tais meios talvez sejam de tal ordem que sua rejeição vos pareça imperiosa. Tendes, então, simplesmente de escolher entre o fim e os meios inevitáveis. (WEBER,1974, p.177)

Dessa forma, a transformação pela qual passaram as sociedades industriais nesse processo de modernização, de avanço da tecnologia, de racionalização da ação social, está diretamente associada às formas de desenvolvimento do trabalho industrial na sociedade capitalista. E, por sua vez, ampliaram os procedimentos e a racionalidade inerente ao desenvolvimento do trabalho para outros aspectos da vida social. Entretanto, é notório que o desenvolvimento industrial está estreitamente ligado ao progresso da ciência e da técnica e desconsidera a possibilidade da regressão social e da reincidência da barbárie, não passando de uma racionalização do sofrimento, pois transgride a dor do homem singular e histórico para um todo social a um só tempo empírico, psicológico, histórico e transcendental. Assim, jamais podemos falar na neutralidade da tecnologia diante de uma sociedade organizada com essa característica.

Ao analisar as sociedades industriais desenvolvidas, verificamos que as coisas não existem sozinhas, por si mesmas, elas fazem parte de um campo de relações que são influenciadas pelo capital cultural, intelectual e econômico.

O aparato técnico e científico, tanto de produção como de distribuição e manutenção, não está isento das influências sociais e políticas, e na medita em que, estas determinam as mudanças, as habilidades e atitudes socialmente necessárias, bem como deternimam as aspirações e necessidades individuais. Para Adorno, Horkheimer e Marcuse a ciência e a técnica, ao visarem o domínio da natureza e a sua submissão ao

homem, já trazem em si o germe do poder, da dominação. A dominação é total e penetra em todas as esferas da vida humana.

A conquista da natureza transforma-se num simples instrumento de poder e de conquista do homem. Esse tipo de racionalidade traz em si uma forma de dominação política que não lhe é imposta, mas habita o seu interior, e já existe no processo de desenvolvimento, pois se configura como ideologia de legitimação do sistema de dominação entre os homens.

No entanto, Habermas (1987a), ao contrário deles, não se posiciona radicalmente contra a racionalidade instrumental da ciência e da técnica em si mesmas, contudo, não abre mão do potencial emancipador contido na razão humana, pois entende que essa racionalidade contribui para a autoconservação do homem. O autor encontra uma saída a partir da própria razão, apostando na construção de uma nova racionalidade. Ele considera que o trabalho, pela sua essência de dominar a natureza para pô-la a serviço do homem, possui uma racionalidade do mesmo tipo daquela presente na ciência e na técnica - uma racionalidade que consiste na organização e na escolha adequadas de meios para atingir determinados fins.

Nesse sentido, Gabassa (2007) afirma que a posição de Habermas nos parece a mais acertada, pois se pensarmos no mundo tal como está organizado e constituído não pode modificar-se, que nossa ação é mero reflexo das imposições do sistema capitalista avançado e que a educação, como elaboração humana, também reproduz as relações de dominação; não havendo alternativas de mudança, nem subjetiva e nem objetivamente, nada adianta pensar a escola, suas influências e sua viabilidade.

Para Habermas (1987a), a ciência e a técnica ampliam as possibilidades do homem, libertando-o do jugo das necessidades materiais, uma vez que o desenvolvimento da espécie humana é resultado de um processo histórico de desenvolvimento tecnológico, institucional e cultural, processos que são interdependentes.

Em face disso, Gabassa (2007) esclarece que, as reflexões de Habermas nos parecem fundamentais, uma vez que propõe repensar a razão, buscando um novo modelo de racionalidade que não só explica as patologias sociais, mas que também dê conta de abarcar um mundo de reprodução e transformação, considerando a participação dos sujeitos, enquanto seres capazes de linguagem e ação. De acordo com a autora, Habermas posiciona-se radicalmente contra a universalização da ciência e da técnica,

isto é, contra a penetração da racionalidade científica, instrumental, em esferas de decisão onde deveria imperar outro tipo de racionalidade: a racionalidade comunicativa.