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Capítulo III – O Estágio Pedagógico: uma Aprendizagem entre a Teoria e a Prática

2. Saberes próprios à formação na construção da profissão

2.5. A reflexão como tomada de consciência e balanço da prática educativa

De acordo com Sácristan (1991, p. 76), «O ensino como actividade racional ou reflexiva, como um fazer em que se mede cada passo dado e em que cada opção é fruto de um processo de deliberação, é uma prática utópica a que se aspira». Realmente, o processo de reflexão está inerente a todo o processo de formação, o professor “cresce” refletindo os seus atos, reflete sobre os seus sucessos, insucessos, receios, desafios, etc. Tanto para os educadores/professores, como para nós enquanto estagiários − estando no início da profissão −, a reflexão faz parte de todo o percurso da prática pedagógica, antes, durante e depois da ação; desde a observação, passando pela planificação, a intervenção e a inerente avaliação. No próprio processo da observação, temos que refletir sobre o que querermos observar, de que forma, o porquê de acontecer o observado, o que poderá acontecer depois do que foi observado, etc. O mesmo acontece com a planificação. Para planificar, como já foi dito, é inerente refletir sobre todas as informações que dispomos, a fim de criar uma prática educativa concreta e sólida perante a realidade em que estamos inseridos. De forma a dar sentido a um determinado currículo, é necessário questionarmo-nos, colocarmo-nos em dúvida constante. Adotando uma atitude reflexiva, reestruturando a nossa prática, conduz-nos à abertura e evolução, essenciais à construção do perfil profissional.

Em situação de estágio tínhamos muitos momentos dedicados à reflexão. Além dos aspetos supramencionados em que a reflexão está inerente, os estagiários antes, durante e depois da ação, tinham oportunidade de refletir conjuntamente com os colegas de núcleo, professor(a) cooperante e orientador(a) sobre a sua prática educativa.

De acordo com os registos recolhidos sobre o contexto escolar e não escolar e sobre as crianças, após uma reflexão sobre os dados projetava-se a ação (planificação/sequência didática) ponderando as estratégias, a pertinência e adequação das atividades, os materiais a utilizar, entre outros componentes. Mesmo durante a própria ação, o decorrer das situações de sala de aula faziam-nos refletir e, por vezes, reajustar ou repensar noutra alternativa, noutra estratégia. Comprove-se com um excerto do documento de avaliação elaborado na sequência da semana intensiva no 1.º Ciclo:

«Embora tenha levado um bocado de tecido (pele de porco) e um órgão (rim) e ter explorado as diferenças dos conceitos, alguns alunos continuavam a fazer confusão entre os conceitos “célula, tecido e órgão” (…). Ao achar importante que estes conceitos deviam ficar bem assentes nas crianças demorei os 45 minutos na exploração destes, prescindindo a aplicação da ficha de consolidação dos assuntos abordados ao longo da semana. Ou seja, preferi que a introdução dos sistemas ficasse bem consolidada para que nas semanas seguintes, nas intervenções dos meus colegas, os alunos estivessem à vontade e compreendessem bem os conceitos e assuntos iniciais.

72 Após a ação era inevitável o pensamento de “como correu?”, “o que fiz bem?”, “o que poderia ter feito melhor?”, “o que não devia ter feito?”, “o que tenho que melhorar numa prática futura?”, “o que fiz, foi suficiente bom para as crianças?”… Indubitavelmente havia uma constante reflexão individual, além das reflexões conjuntas, enunciadas anteriormente. Ora durante o estágio o papel dos colegas, do(a) orientador(a) e educadora/professora cooperante foi de incalculável valor. Eram eles que nos davam a força para continuar e os conselhos/advertências necessários. A função do(a) orientador(a) e da educadora/professora cooperante era de acompanhar e orientar as atividades do estagiário, através de reuniões e/ou pequenas sessões de reflexão, com o intuito de enriquecer as sequências didáticas, a recolha de dados, de refletir sobre as práticas desenvolvidas, de procurar soluções para problemas ou insucessos, etc. Além desses momentos, os estagiários tinham oportunidade de participar nas designadas «reuniões plenárias», reuniões estas em que se fazia um balanço e reflexão mais profunda acerca de cada estagiário. Este era um momento fundamental e enriquecedor, onde, por vezes, se expunha fragilidades, insucessos/sucessos e inseguranças, mas, sobretudo, onde se partilhavam muitas experiências, ideias e troca de saberes. «Expondo e examinando as suas teorias práticas, para si próprio e para os seus colegas, o professor tem mais hipóteses de se aperceber das suas falhas. Discutindo publicamente no seio de grupos de professores, estes têm mais hipóteses de aprender uns com os outros e de terem mais uma palavra a dizer sobre o desenvolvimento da sua profissão» (Zeichner, 1993, pp. 21-22).

Como anteriormente referido, os colegas de núcleo também desempenhavam um papel fundamental, com eles, e de uma maneira mais informal, desabafávamos o melhor e pior, trocávamos ideias, ajudávamo-nos e apoiávamo-nos mutuamente, dentro e fora do contexto escolar. A reflexão com os colegas era essencial, pois pensando conjuntamente criavam-se ideias novas ideias para atividades, recursos, entre outras. Além disso, sempre que possível, a estagiária incitava os alunos a refletir sobre a sua prática educativa e para participarem, tendo sempre muito em conta a opinião das crianças. Na opinião de Zeichner (1993, p. 20) «(…) a reflexão é um processo que ocorre antes e depois da acção e, em certa medida, durante a acção, pois o práticos têm conversas reflexivas com as situações que estão a praticar, enquadrando e resolvendo problemas in loco».

Podemos constatar que os conceitos de observação, planificação, avaliação e reflexão são indissociáveis e complementam-se mutuamente, sendo fundamentais no processo ensino- aprendizagem e respetiva profissão do educador/professor. «A formação de bons principiantes tem a ver, acima de tudo, com a formação de pessoas capazes de evoluir, de aprender de

73 acordo com a experiência, refletindo sobre o que gostariam de fazer, sobre o que realmente fizeram e sobre os resultados de tudo isso» (Perrenoud, 2002, p. 17).