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A Reforma Psiquiátrica no Brasil e a Lei 10.216/01

A Reforma Psiquiátrica Brasileira historicamente tem limites demarcados a partir do final dos anos setenta, caracterizando-se como um movimento histórico de caráter político- ideológico e sócio-econômico que tem como principal reivindicação a desinstitucionalização dos usuários de hospitais psiquiátricos e os paradigmas que a sustentam, através da substituição progressiva desses hospitais, por serviços e práticas terapêuticas que venham a conceber a pessoa em sofrimento psíquico como um sujeito de direitos humanos, que deve ter acesso a um tratamento humanizado, em contato direto com sua família e sua comunidade, respeitando-se seus valores e costumes culturais.

Desta feita surgem os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), como serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico e integrantes de uma rede em saúde mental no Brasil, que engloba fundamentalmente a importância de se voltar os cuidados em saúde mental para o âmbito da comunidade, envolvendo-a no trato com o sofrimento psíquico e redimensionando o conceito de loucura presente na sociedade brasileira. Sociedade esta que estigmatiza e exclui as pessoas em sofrimento psíquico, numa perspectiva de apartação dos sujeitos.

O movimento da Reforma Psiquiátrica no Brasil também trouxe à tona as inconveniências e desumanidades do modelo de psiquiatria clássica que institucionalizou a loucura e que elegeu o hospital psiquiátrico como a única e exclusiva forma de tratamento para pessoas em sofrimento psíquico e sua consequente transformação, no seio do sistema capitalismo, numa mercadoria extremamente lucrativa e rentável, gerando uma indústria da loucura.

Nos anos 1980 a reabertura política do Brasil e o movimento de redemocratização, trazem como marca indelével a participação popular na redefinição do Estado brasileiro e das políticas públicas. Com a referida constituição de 1988 – ou como ficou popularmente conhecida – a Constituição Cidadã, notamos vários avanços na área das políticas públicas e do papel do Estado, em especial no que concerne a política de saúde, pois em seu artigo 196 a constituição brasileira determina, que esta política é um dever do Estado brasileiro e direito de todos os cidadãos.

Já em 1987 diversos atores sociais na 1ª Conferência Nacional de Saúde - evento realizado pelo Governo Federal em parceria com a sociedade civil organizada, onde ses discutem as políticas públicas no campo da saúde - anunciam a criação de um sistema de saúde que tivesse um caráter universal e integral para o atendimento da população brasileira, mas somente em 1990 ganha significativa força com a Lei 8.080 ou Lei Orgânica da Saúde, adquirindo o Estatuto de Sistema Único de Saúde - SUS e a política passa a integra o campo da seguridade social, tornando-se uma política do Estado brasileiro.

Em 2011 com a 14ª Conferência Nacional de Saúde, os delegados presentes a mesma, reafirmam e referendam o SUS como política de proteção social e aponta a necessidade de fortalecimento da saúde como uma política regida pelos princípios e diretrizes da descentralização, da atenção integral e da participação comunitária, tendo caráter universalizante, de igualdade e equidade social.

Nessa lógica o modelo do SUS vai consolidando-se a partir de uma rede de atenção primária, com postos de saúde, Programa Saúde da Família (PSF), saúde bucal, saúde da mulher, saúde integral da população negra, dentre outros; de uma rede de atenção secundária com os serviços especializados de média complexidade, onde encontram-se os Centros de Atenção Psicossociais (Caps) e com uma rede de atenção terciária composta por hospitais de alta complexidade, formando um conjunto articulado de ações e atendimentos de saúde para a população brasileira.

Inserida nessa lógica complexa do Sistema Único de Saúde (SUS), está a Política Nacional de Saúde Mental, instituída pela Lei 10.216/01 (BRASIL, 2001a), que busca dentre outras coisas:

Consolidar um modelo de atenção à saúde mental aberto e de base comunitária. Isto é, que garante a livre circulação das pessoas com transtornos mentais pelos serviços, comunidade e cidade, e oferece cuidados com base nos recursos que a comunidade oferece. Este modelo conta com uma rede de serviços e equipamentos variados tais como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), os Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT), os Centros de Convivência e Cultura e os leitos de atenção integral (em Hospitais Gerais, nos CAPS III). O Programa de Volta para Casa que oferece bolsas para egressos de longas internações em hospitais psiquiátricos, também faz parte desta Política. (PORTAL DA SAÚDE, 2012, p. 1).

Segundo a IV Conferência Nacional de Saúde Mental ocorrida em 2012 em seu Relatório Final afirma que o Estado brasileiro deve:

Garantir as conquistas obtidas com a Reforma Psiquiátrica, em especial a desinstitucionalização e a inclusão social e a sustentabilidade e/ou reafirmação do modelo assistencial da atenção psicossocial, em conformidade com a legislação vigente, independentemente de quaisquer mudanças que ocorram no Executivo [...]

Fazer cumprir a Lei 10.216/2001, além de não admitir a revisão e nem o retrocesso das conquistas alcançadas a partir de sua aprovação, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas em sofrimento psíquico e redireciona o modelo assistencial em saúde mental, assegurando os seus direitos de cidadania, em especial, o acesso ao tratamento na rede substitutiva. (CONFERÊNCIA DE SAÚDE MENTAL INTERSETORIAL, 2010, p. 56).

A Lei 10.216/01 vem reconhecer oficialmente os direitos das pessoas em sofrimento psíquico e a garantia de um atendimento digno, pois:

Art. 1º - os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que trata esta Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu transtorno, ou qualquer outra. (BRASIL, 2001a, p. 1).

Na mesma Lei constituem direitos da pessoa em sofrimento psíquico:

I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades; II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade; III - ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração; IV - ter garantia de sigilo nas informações prestadas; V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária; VI - ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis; VII - receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento; VIII - ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis; IX - ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental. (BRASIL, 2001, p. 1).

Com ênfase no que relata os artigos VIII e o XIX da Lei 10.216/01 (BRASIL, 2001a) que versam pelo direito do usuário de ter um tratamento menos invasivo e ser tratados em serviços comunitários, as práticas integrativas e complementares coadunam com essa ideia no que concerne ao oferecimento de terapêuticas de base fitoterápicas e menos agressivas se comparadas às terapêuticas medicamentosas dos psicofármacos, que mesmo os de última geração, ainda provocam reações adversas nos usuários que fazem uso dos mesmos, com efeitos colaterais que os obrigam a utilizar outras medicações clínicas para amenizar as consequências do tratamento com psicotrópicos.

3.5 O Caps em Fortaleza e a Política Nacional de Práticas Integrativas e

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