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No CACS Sol, conforme registrado em ata e constatado nas entrevistas, os conselheiros foram eleitos pelo segmento representado, seguindo os trâmites legais. Existe diálogo de alguns conselheiros com o segmento que representam, mas alguns não conseguem entender que a perspectiva da representatividade não é defender apenas os interesses discutidos com as bases e, sim, a proposta macro de que o controle social é colocado nos Conselhos/Câmaras. O limite entre um e outro ainda é confuso para os conselheiros. Entendendo a participação como um processo de culturalização do ser e fazer-se cidadão, esse aprendizado está inserido nesse processo que acontece paulatinamente. O que se constata é que há uma interlocução, e esta é importante para o

enriquecimento dos debates, ampliando tanto a discussão quanto a participação dos conselheiros nesse CACS.

Essa falta de clareza dos conselheiros quanto à forma de representar seu segmento é expressa por uma das conselheiras:

“...O funcionamento de uma câmara de FUNDEB, eu entendo que a participação que há lá é uma participação através de uma representação. Eu estou lá participando como cidadã e como representante de outra instância, mas na hora que estou ali, estou como conselho, como câmara, não estou como técnica, ou como pai. Eu vim ali por causa disso, mas estou ali pensando como conselho. Essa é uma discussão que eu acho que está pouco clara para os conselheiros ” (S1).

De fato, o segmento dos estudantes expressou claramente a ideia dúbia que tinha antes de participar da Câmara. Eles achavam que sua inserção no Conselho possibilitaria saber o quantitativo financeiro e como este poderia ser gasto. Imaginavam que o Conselho desenvolvia um papel mais político e se depararam com um trabalho mais técnico, sentindo-se limitados na participação por falta de alguns conhecimentos específicos do controle social. Já a técnica de escola vê o Conselho como possibilidade de atender às demandas de seu segmento.

“Quando iniciei tinha um gás maior, não posso deixar de dizer isso, por ser uma coisa nova, por trabalhar com recurso, uma experiência nova. Pô! a gente (estudantes) pensava, agora a gente vai saber quanto é gasto realmente na nossa rede, na nossa escola, ficamos muito entusiasmados. O que poderia ser feito nas escolas mais carentes. Mas com o caminhar da carruagem a gente começou a desestimular um pouco, começou.. ah caramba! A nossa participação não é tão boa,[...] a gente não entende de nada. A gente fica muito limitado à opinião do outro, a gente não sabe se o outro tá esmiuçado. Por que tem a questão política, né? A gente tá trabalhando com recursos. A gente tem o conhecimento da lei, mas o

estudo é diferente da prática você estuda, mas quando vai pra prática a coisa é outra” (S6).

Embora o exercício do controle social perpasse pelo acompanhamento e pela alocação dos recursos, não dá para saber especificamente quanto cada escola recebe de recurso financeiro. O papel do Conselho não é pautado em demandas específicas dos segmentos, e a aplicação dos recursos segue critérios de acordo com o planejamento do sistema municipal de ensino. Isso mostra o pouco conhecimento dos conselheiros quanto às atribuições do CACS. Entendemos que fazem parte do processo participativo as descobertas do que, de fato, ocorre nos bastidores dos conselhos gestores de política seja ele deliberativo, normativo ou de controle social. O papel do Conselho é analisar o quantitativo dos recursos recebidos pelo FUNDEB, como e em que esses recursos são usados na educação e acompanhar se eles são bem usados no sistema educacional de sua esfera administrativa.

Quando o sujeito está imerso no Conselho é que vai compreendendo melhor tanto seu papel, quanto o papel das instâncias que intercedem direta ou indiretamente no processo, como afirma Lucas (1975, p. 112)

A participação não só ajuda as pessoas a interpretarem o fenômeno do governo como uma forma de ação, e não um mero tipo de acontecimento, mas, leva-as a criticar a partir do ponto de vista de agentes e não de espectadores. É fácil criticar, é fácil descobrir erros nas ações governamentais. O mais difícil é sugerir alternativas praticáveis.

O segmento de técnico da escola via, na representação, uma forma de atender às necessidades específicas de sua classe. Então, a representação não vem especificamente com a cultura de fazer o controle social, eles imaginam que o controle social refletirá nas necessidades particulares do segmento que representam, e isso é desmistificado durante o processo.

“...Sendo essa representação a necessidade maior, de fortalecimento [...],

dentro da educação temos muito que conquistar, conquistamos algumas coisas e temos ainda o que conquistar e cobrar isso da gestão. porque a partir do momento que você representa os funcionários você tem o papel primordial de cobrar a gestão para que as capacitações existam, pra que

os funcionários sejam bem remunerados, pra que as políticas voltadas a educação, ela realmente seja voltada para melhoria da qualidade de ensino e pra que o que é prometido realmente aconteça. Porque acreditamos que se houver cobrança, existem também mudanças, elas são gradativas, mas acontecem. Se existe um órgão de controle e ele cobrar, então as coisas acontecem da melhor forma” (S5).

Em outras instâncias, o intercâmbio com o segmento representado não está acontecendo, como é o caso da representante da ABONG, que não tem com quem partilhar as discussões da Câmara.

“A ABONG está vivendo uma crise de identidade e decidiu não indicar mais ninguém para os conselhos e defende que quem deve indicar sua seja cada ONG específica. A crise vivenciada por algumas ONGs que tratavam da educação e deixaram de existir ou passaram a trabalhar com outras questões comprometeu o quantitativo dessa representatividade, assim a ABONG enquanto associação das ONGs chegou a esse consenso” (S1).

O segmento dos pais é bem engajado com o Conselho Escolar, levando discussões e também trazendo algumas contribuições e questionamentos. O conselheiro (S2) compartilha a preocupação dos pais quanto ao quantitativo de estagiárias maior que o de professores na escola, o conselheiro (S3) evidencia o questionamento do Conselho Escolar quanto à alocação dos recursos do FUNDEB.

“Nós temos batalhado muito com as questões que dizem respeito à escola como o fardamento escolar, o kit. Eu me comuniquei com outras escolas que recebeu o kit. O secretário prometeu todo fardamento, e a informação que recebemos da secretaria é que kit não tinha mais. O kit só é entregue por pedido de ofício e como não tinha mais? Nossa escola fez o ofício

tudo direitinho... meu Conselho Escolar questiona a alocação dos recursos” (S3).

O diálogo entre representantes do governo com seu segmento reflete certa tensão. O modo centralizador como a gestão se relaciona com a Câmara revela que o gestor não lhe dá muita autonomia. Mesmo assim, percebemos o engajamento dos representantes, que buscam, com ética, firmar um diálogo mais amistoso entre Câmara e gestão. Não podemos fazer análise do segmento professores e do Conselho Tutelar porque não conseguimos entrevistá-los. A professora alegou falta de tempo, e o Conselho Tutelar não nos deu retorno por não comparecer aos encontros marcados. O segmento diretor não revelou manter intercâmbio com seu segmento.

A lei do FUNDEB é clara, as Câmaras e Conselhos de Acompanhamento e de Controle Social têm a função de acompanhar a distribuição, a transferência e a aplicação dos recursos, no nível do governo específico, ao qual está inserido.

A representação está ali para acompanhar o processo de alocação e o uso do dinheiro, como está sendo gerenciado o uso dos recursos da Educação em âmbito municipal, e não voltado para sua comunidade, para sua escola, para reivindicar a discussão dos professores pelo cumprimento do piso. Essas questões permeiam o processo de participação por fazerem parte do debate teórico que o próprio processo participativo enseja, mas não é esse o papel dos conselheiros.

Câmara Lua e CACS Estrela

Na Câmara Lua, apenas os representantes dos segmentos estudantes, diretor, governo e técnico frequentam as reuniões. O conselho tutelar participou de poucas reuniões e, mesmo assim, o titular nunca podia ir, mandando um substituto diferente a cada vez. O segmento dos pais e o do professor durante o período da pesquisa não estavam mais frequentando as reuniões. Não há representante de ONG, a ABONG comunicou à Câmara Lua que não mais enviaria representante. Nesse CACS, os conselheiros não estabelecem uma relação dialógica com os segmentos, tendo um estudante, que foi indicado pela professora. Apenas uma conselheira (representante do governo) afirmou dialogar com seu segmento.

O CACS Estrela revelou descumprimento da Lei 11494/2007 do FUNDEB quanto a sua composição, por ter elegido, como presidente, um representante do governo, tendo seu registro indeferido no FNDE após um ano de atuação. No CACS Estrela, as entrevistas demonstraram não haver essa interlocução. A conselheira revela que o intercâmbio com o Conselho Escolar, segmento que representa, não está sendo oportunizado porque o Conselho não se tem reunido. O processo participativo seria mais significativo se possibilitasse essa interação entre segmentos e representantes. Percebemos a importância da constância das reuniões não só do CACS, mas dos segmentos que os conselheiros representam.

“Nosso papel, eu acho que é assim, fiscalizar as verbas e ter a maior informação possível que a gente possa ter nas reuniões, acho que seja isso e assim passar pra comunidade. No caso assim, aqui na escola era pra ter uma reunião por mês, mas também não tá tendo. Que era pra eu passar essas informações no conselho da escola, porque era uma reunião pra ter com os pais e eu passar pra eles pra eles saber que eu tô participando, do que tá saindo e do que tá entrando pra educação” (E2).

Um dos desafios da representação nos Conselhos de Controle social é representar sem cair no particularismo. Segundo Serafim (1998), “a representação requer um equilíbrio entre os interesses representados e a capacidade de negociação no espaço onde a representação ocorre”. Esse tipo de Conselho exige uma nova visão de representação, não aquela em que o representante beneficia os interesses do representado, é pensar o interesse da sua representação a partir das necessidades e propostas do colegiado ao qual pertence.

Representatividade foi uma unidade temática que emergiu durante a análise das entrevistas expressa pelos conselheiros sob diferentes aspectos: A representatividade como uma formalidade institucional, voltada apenas para os interesses de seu segmento e a representação com uma nova identidade, a identidade do nós, do grupo e não só do eu. O sujeito passa a ser uma parte do todo, incorporando esse todo. Agindo, não por seus anseios, ou de determinado grupo, mas, por acreditar e se sentir comprometido com a causa que representa. Esse é o sentido da representação no Conselho de Controle Social. Esse aspecto amplia a capacidade de participação não só dos conselheiros, mas também do Conselho. Incorporar essa forma de

representação para uma sociedade acostumada com a democracia representativa, aquela em que se representa outro(s), exige exercício, exige uma reflexão sobre o que seja representar. Primeiro, para incorporar a causa na qual se pauta a representação, o sujeito tem que se sentir representante dela. E isso só ocorrerá se o sujeito questionar e responder a si mesmo. Por que estou aqui, e para quê? Essa reflexão é que muda a forma como esse sujeito irá participar e defender os interesses da Câmara. E nem todos estão prontos, porque é um processo, e todo processo é paulatino, é educativo.

Percebemos que essa forma de representação é mais madura na Câmara Sol. Os demais estão ainda em processo de amadurecimento. Não identificamos nenhuma manifestação particularizada nesse colegiado. Na Câmara Sol e na Câmara Lua, houve um embate entre dois segmentos para terem maior número de representantes, medindo forças entre eles, e, no CACS Estrela, identificamos situação semelhante em que o representante dos professores não aceitava a presença do representante dos estudantes. Mesmo sendo essa representação determinada pela Lei do FUNDEB, o professor queria que, na formulação do Regimento Interno, fosse vetada essa representação.