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PARTE I – ENQUADRAMENTO E CAMPOS DE INVESTIGAÇÃO 19

2   ENQUADRAMENTO TEÓRICO 31

2.4   F ATORES QUE INFLUENCIAM AS ESCOLHAS ALIMENTARES 103

2.4.4   A restauração 114

A noção de catering varia muito entre os diversos países, sendo para a maioria o serviço público de fornecimento de refeições escolares. No caso específico de Espanha o conceito é bastante alargado incluindo a indústria alimentar, o sector agrícola e os distribuidores, restaurantes e outros espaços de venda de refeições e ainda associações profissionais de cozinha padaria e pastelaria (Lachat et al, 2009).

Em Portugal, a legislação define estabelecimento de restauração como os “destinados a prestar, mediante remuneração, serviços de alimentação e de bebidas no próprio estabelecimento ou fora dele, incluindo outros locais de prestação daqueles serviços através da atividade de catering e a oferta de serviços de banquetes ou outras”, existindo ainda a definição de estabelecimentos de restauração coletiva, os “instalados em entidades públicas ou privadas, empresas e estabelecimentos de ensino, destinados a prestar, mediante remuneração, serviços de alimentação e de bebidas no próprio estabelecimento, exclusivamente ao respetivo pessoal e/ou alunos” (Decreto-Lei nº. 48/2011).

Um estudo de revisão cujo objetivo foi verificar como é que os 57 países da região europeia da OMS integram as questões nutricionais no sector do catering e restauração observou que cerca de dois terços destes países (67%) reconhecem este sector como um stakeholder relevante para as políticas nutricionais e que as principais estratégias desenvolvidas ou a desenvolver dizem respeito à rotulagem dos alimentos, formação do pessoal envolvido na preparação e confeção dos alimentos e ainda no que se refere à publicidade dos produtos. Nesta revisão os autores apresentam uma lista com os estados membros analisados, na qual Portugal aparece como incluindo estratégias que se resumem a estruturas de diálogo com o sector. Todas as outras medidas (rotulagem, formação, publicidade) não estão ainda definidas para o nosso País (Lachat et al, 2009). No entanto, os autores referem que algumas áreas estão ainda muito pouco trabalhadas, como a verificação da implementação destas políticas, ou o desenvolvimento de estratégias que garantam a oferta alimentar mais equilibrada, saudável e economicamente apelativa, em particular no consumo de alimentos fora de casa. É ainda de realçar que o esforço desenvolvido pelo sector privado é menor comparativamente com o sector público. Concluem que apesar de muitos países valorizarem a participação do sector nas suas políticas nutricionais, são muito poucas as ferramentas apresentadas para medir e monitorizar o impacto deste envolvimento (Lachat et al, 2009).

Para além das preocupações de diversas entidades e autoridades internacionais de saúde relativamente à alimentação, também o público em geral, demonstra estar

interessado. Um estudo que abrangeu 786 indivíduos, verificou que 65% se encontrava motivado para a prática de uma alimentação mais equilibrada, observando ainda que 42% consomem refeições fora de casa pelo menos uma vez por semana (Mackison et al, 2009). Desta forma, os chefes de cozinha assumem um papel cada vez mais importante, o que a par com as crescentes preocupações com a saúde, justifica que estes devam adquirir conhecimentos não apenas no que diz respeito a cozinha propriamente dita, mas também de nutrição, dietética, tecnologia e outros temas que sejam relevantes para a sua capacidade de conceber e elaborar pratos adequados e equilibrados que respondam às necessidades gastronómicas de uma cozinha mais responsável (Stanner & Woolfe, 2001; Condrasky et al, 2007).

Já em 1998, tendo em conta o número crescente de refeições que os indivíduos fazem fora de casa, Reichler el al (1998) fizeram um estudo que procurou compreender as atitudes dos chefes face à preparação de refeições saudáveis, bem como os seus conhecimentos nesta área. Os autores concluíram que os chefes tem uma atitude positiva relativamente a alterar os menus para incluir mais frutas e vegetais, embora essa atitude não seja sempre colocada em prática. Por outro lado, apesar da maioria concordar que a alimentação equilibrada não é cara, consideram que demora mais tempo a preparar e que o seu sabor é menos agradável. A grande maioria considera que os consumidores não estão preocupados com a nutrição, mas que eles próprios, como chefes, têm uma responsabilidade importante no conteúdo nutricional das refeições, em particular no que diz respeito à gordura, mas que o tempo e o sabor constituem barreiras ao fornecimento de refeições mais equilibradas (Reichler & Dalton, 1998). Hu et al. (2005) observaram que estas perceções se mantinham, verificando que as principais barreiras à preparação de alimentos mais saudáveis são o baixo nível de conhecimentos em nutrição percecionado pelos chefes, a par com o fraco interesse por parte dos consumidores, sendo a primeira referida com mais frequência pelos chefes com menor grau de formação e a segunda pelos que possuíam maior nível de qualificação. Os métodos de preparação associados às receitas são outra das barreiras percecionadas. Os autores observaram igualmente que, à semelhança do estudo anterior, em geral os chefes têm uma atitude positiva em relação à preparação de

apenas 56% procurava usar menos gordura saturada; 38% menor quantidade de açúcar e 35% menos sal (Hu et al, 2005b).

Um outro estudo, realizado por Glanz et al. (2007) observou que a saúde e a nutrição apenas são registadas como importantes para 21% dos responsáveis pelo planeamento dos menus, a maioria referindo o lucro e o aumento das vendas (61%) como o aspeto mais importante. Os autores verificaram ainda que embora as empresas tenham a preocupação de oferecer alguns menus mais equilibrados de forma a não perderem o público-alvo que procura alimentos saudáveis, consideram que esta procura não é ainda muito abrangente. À semelhança de outros estudos, o curto tempo de prateleira, o maior tempo de preparação e o custo laboral associado são as principais barreiras percecionadas pelos empresários desta área (Glanz et al, 2007).

Um estudo realizado por Corney et al. (1998) demonstrou que a formação em nutrição melhora as atitudes e práticas, aumentando ainda a motivação para a elaboração de menus adequados e equilibrados (Corney et al., 1998 citado por Stanner & Woolfe, 2001). Em Portugal, diversos cursos, como o de Produção Alimentar em Restauração da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril, incluem unidades curriculares relacionadas com as ciências da alimentação. Este curso tem no seu plano curricular diversas disciplinas como fisiologia, microbiologia, tecnologia e química alimentar, e em concreto uma unidade curricular de nutrição, complementada com uma outra de dietética, esta última integrada com uma unidade curricular prática de artes culinárias – cozinha e pastelaria dietética, procurando contribuir assim para a melhoria da formação deste tipo de profissionais.

No Reino Unido foi desenvolvido o guia Catering for Health que tem como objetivo disponibilizar informação prática sobre métodos de restauração mais saudáveis e que possam ser aplicadas às diferentes etapas da preparação de alimentos, desde o planeamento das mesmas em diferentes contextos, (escolas, hospitais, restaurantes), incluindo ainda exemplos práticos de modificações de receitas. Este guia procura ainda desmistificar algumas das ideias pré-concebidas relativamente à alimentação e gastronomia, como o facto da comida saudável ser considerada pouco apelativa do

ponto de vista gastronómico ou que é mais morosa ou difícil de preparar (Stanner & Woolfe, 2001).

Apesar de reconhecida a importância do sector na melhoria da alimentação das populações existe ainda um longo caminho a percorrer (Lachat et al, 2009) e para além da questão da oferta alimentar, há ainda que trabalhar a componente do marketing. Por exemplo, ao nível das cadeias de fast-food, observa-se com frequência a promoção dos produtos alimentares com referência de levar mais por menos. O aumento da porção pelo mesmo preço, ou levar dois e pagar um (válido normalmente para porções médias ou grandes) constituem estratégias de marketing que incentivam o consumo não apenas de alimentos de menor qualidade nutricional, que muitas vezes por si só já ultrapassam as necessidades energéticas, mas também o consumo de quantidades acima do necessário.

Em Salinas, no México, foi realizada uma intervenção que envolveu os restaurantes de fast-food e as taquerias que começou por promover a oferta de materiais educativos aos clientes, incentivando-os à prática de uma alimentação mais equilibrada e, a partir desta procura/necessidade, desenvolveu a reformulação de alguns menus passando a oferecer opções mais saudáveis. A partir desta intervenção foi desenvolvido um kit nutricional que incluía material diverso (material educativo, de marketing, exemplos de receitas mais equilibradas, etc.) para distribuir a outros restaurantes similares por todo o país. A distribuição e acompanhamento do processo é sempre realizada por um profissional de educação e nutrição, que reúne periodicamente com os restaurantes e colabora na resolução de problemas e dificuldades, fazendo também a avaliação da implementação das medidas de promoção de uma oferta alimentar mais equilibrada. Os resultados, até à data, têm sido encorajadores, e a iniciativa bem aceite quer pelo responsáveis dos restaurantes, quer por parte da comunidade, e os autores esperam que a mesma tenha uma influência positiva no combate e prevenção das doenças crónicas em particular a obesidade e diabetes (Hanni et al, 2009).

Um dos outros aspetos que tem sido discutido na procurar da melhoria da oferta alimentar por parte da restauração é a disponibilização da informação nutricional relativa aos produtos servidos. As preocupações com a alimentação são sentidas por

parte dos consumidores, existindo uma crescente procura de informação nutricional a diferentes níveis quer no que diz respeito aos produtos para consumo, quer no efeito que os alimentos têm no nosso organismo, relativamente aos tipos de regimes alimentares e ainda no que se refere a comportamentos e estilos de vida e à sua influência na saúde (Cowburn & Stockley, 2005; van Trijp & van der Lans, 2007). Também a comunidade europeia publicou o Regulamento UE nº. 1169/2011 e que tem como objetivo melhorar a informação disponível sobre os alimentos aos consumidores. Entre os diferentes aspetos referidos nesse regulamento, encontra-se a informação nutricional dos produtos disponíveis no mercado, incluindo também as ementas e menus do sector da restauração (Regulamento (UE) Nº 1169/2011).

A informação nutricional disponível tem aumentado ao longo dos últimos anos, mas existem ainda muitos restaurantes, a maioria, que não disponibilizam esta informação (Wootan & Osborn, 2006; Harnack, 2006).

Há autores que defendem que disponibilizar informação nutricional por si só não terá um grande efeito nas escolhas por pate do consumidor, sendo igualmente importante desenvolver nestes competências em nutrição (Harnack et al, 2008). Outros referem que os indivíduos não leem e não consultam a informação nutricional, situação que se verifica nos Estados Unidos da América onde existe informação nutricional disponível de forma abrangente (Lando & Labiner-Wolfe, 2007). Outros autores referem que a motivação para a prática de uma alimentação equilibrada leva à procura de informação nutricional em diversos sectores, incluindo a restauração e o catering. Desta forma, se os profissionais de nutrição e dietética trabalharem e forem bem-sucedidos no aumento da motivação e das competências para a prática de uma alimentação equilibrada, contribuem para o aumento da consciência, o que leva à procura da informação nutricional e consequentemente ajuda a fazer escolhas mais equilibradas. Isso incentiva ainda que seja aumentado o nível de exigência sobre este sector e, desta forma, conduz à melhoria da oferta alimentar e por ultimo à alteração dos hábitos e comportamentos

alimentares (Mackison et al, 2009). Esta ideia é defendida pela presidente da ADA14

que refere que

“disponibilizar informação de boa qualidade, precisa e testada a um consumidor com conhecimentos básicos de nutrição pode ter um efeito poderoso na seleção de alimentos no momento da sua aquisição. Ao longo dos anos, a atitude de um número cada vez mais significativo de consumidores, que façam as suas escolhas alimentares saudáveis, poderá ter um impacto na saúde e melhorar a qualidade dos alimentos disponíveis, através da exigência dos consumidores sobre as cadeias alimentares” (Lipscomb, 2011; Pavlinac, 2011).

Variyam (2008) realizou um estudo para verificar se a informação nutricional disponível nos alimentos interferia no padrão alimentar dos indivíduos, tendo observado diferenças significativas entre os indivíduos que usam a informação nutricional e os que não usam, para todos os nutrientes, verificando-se um padrão alimentar mais saudável nos indivíduos que a utilizam. No entanto, para o total energético ingerido e para o sódio não se observaram diferenças (Variyam, 2008). Burton et al. (2009) verificaram que os consumidores subestimam o conteúdo em gordura, sódio e energia das refeições consumidas fora de casa, observando uma diferença mais pronunciada relativamente aos alimentos menos saudáveis comparativamente com os mais equilibrados, ou seja a magnitude com que os nutrientes eram subestimados é maior nas escolhas menos adequadas. Os autores procuraram ainda identificar o impacto de disponibilizar informação nutricional, tendo observado que a intenção de comprar alimentos de elevada densidade energética diminui quando a informação do valor energético é disponibilizada (Burton et al, 2009).

Um estudo realizado por Mackinson et al (2009) observou que mais de metade dos consumidores gostaria de ter informação nutricional sobre os produtos ingeridos, tendo verificado que mais do que o conteúdo energético ou em gordura, uma percentagem significativa refere o conteúdo em sal - figura 28. Os autores referem que um dos motivos para a maior preocupação com o sal, pode ser o reflexo das recentes

campanhas lançadas pela Food Standards Agency, no Reino Unido, que tem dado muito ênfase ao sal e à necessidade da leitura dos rótulos (Mackison et al, 2009).

Figura 28 – Percentagem de consumidores que gostaria de ter informação nutricional nos produtos consumidos na restauração

Fonte: Mackison et al, 2009

Roberto et al. (2009) observaram que apenas 0,1% dos indivíduos (6 de 4311) procuraram informação nutricional nos restaurantes, concluindo que, tendo em consideração o facto dos indivíduos subestimarem o conteúdo energético das refeições que é consideravelmente mais elevado do que as refeições consumidas em casa, os restaurantes deveriam de tornar a informação nutricional mais visível, por exemplo nos menus a partir dos quais os consumidores fazem as suas escolhas (Roberto et al, 2009). No que diz respeito ao sódio, o seu conteúdo ou do equivalente em sal, por si só, na rotulagem, pode não ser suficiente para ajudar o consumidor, mesmo tendo associada a informação do total recomendado. No Reino Unido foi adotado um sistema tipo semáforo (também existente numa cadeia de supermercados em Portugal) e que permite de forma simples identificar se o conteúdo em sódio é elevado, médio ou baixo (Wright & Cavanaugh, 2010).

É ainda, importante referir um relatório da ADA sobre a informação nutricional disponível nos restaurantes, que observou que no cálculo nutricional dos pratos e menus, existe uma margem de erro considerável, essencialmente resultante da dificuldade em padronizar as receitas e porções servidas (Lipscomb, 2011).

Numa iniciativa realizada numa pequena comunidade de Massachussets, em Somerville, os investigadores procuraram melhorar as refeições com base em critérios previamente definidos, aos quais os restaurantes tinham de corresponder. De forma

geral, os autores verificaram que os responsáveis pelos estabelecimentos manifestavam uma atitude positiva em relação a modificar e disponibilizar uma oferta mais adequada, embora se mostrassem preocupados com o efeito que isso poderia ter nos lucros, situação que foi parcialmente ultrapassada pela publicidade que advinha da participação na iniciativa (Economos et al, 2009).

O lucro é, sem dúvida, um aspeto importante, pelo que as cadeias alimentares e os restaurantes só vão oferecer opções alimentares mais saudáveis se houver essa exigência por parte dos consumidores (Glanz et al, 2007). No entanto há quem defenda que a disponibilidade da informação nutricional pode aumentar a consciência do consumidor e consequentemente esta exigência (Glanz & Hoelscher, 2004), pelo que é necessário não só investir na melhoria da oferta alimentar, como também no aumento da literacia nutricional dos indivíduos.

2.5 PROMOÇÃO DA SAÚDE E ESTRATÉGIAS PARA A REDUÇÃO DE SAL

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