• Nenhum resultado encontrado

2 A CRISE CONTEMPORÂNEA DO CAPITAL E A SUPEREXPLORAÇÃO DA

2.1 A RESTAURAÇÃO DOS MECANISMOS DE DOMÍNIO SOCIETÁRIO PELO

DA LEI GERAL DA ACUMULAÇÃO CAPITALISTA

A forma como a produção está mundialmente organizada demonstra claramente a exploração humana, pelo próprio homem, em qualquer formação social existente. Uma particularidade do capitalismo: este se funda na “produção socializada” e na “apropriação privada da riqueza”7. A existência de homens “livres”, não os coloca – em sua totalidade – na condição de proprietários, como assevera Tavares (2009, p. 242). Principalmente, porque neste sistema, a desigualdade social está intrinsecamente relacionada à acumulação. Esta, por sua vez, é oriunda de um desenvolvimento constante de formas adicionais de exploração do trabalho, no âmbito de um processo contínuo de absorção dos frutos do trabalho alheio e não pago. Desigualdade que se renova diante de condições históricas inéditas, que caracterizam, inclusive, as novas dinâmicas empreendidas pelo capital no âmbito do processo de acumulação capitalista hoje em voga, em relações mundiais articuladas, embora persistentemente desiguais, seja no âmbito externo, como no interno.

Nesses termos, ao longo dos anos, a Lei Geral de Acumulação Capitalista tem nos indicado, de forma significativa, os traços que permeiam as relações capital/trabalho. Como afirma Netto (2010, p. 7), ela “revela a própria anatomia da questão social, sua complexidade, seu caráter de corolário necessário do desenvolvimento capitalista em todos os seus estágios”.

Reconhecemos que a dinâmica societária é marcada por especificidades próprias de cada momento histórico. E que o estudo do desenvolvimento do capitalismo entre nós, impõe-nos grandes dificuldades. Neste sentido, corroboramos com Netto (2010, 10), quando assim argumenta: “o verdadeiro problema consiste em determinar concretamente a relação entre expressões emergentes e as modalidades

7 Mota (2009, p. 3) faz referência a essas duas expressões para caracterizar o modo de

imperantes de exploração”. Isto considerando a instauração, na dinâmica societária, de “expressões sociopolíticas diferenciadas e mais complexas”, numa lógica de exploração, que é a razão de ser do capital.

Cumpre-nos, portanto, enquanto cientistas sociais, a tarefa de desvendar os mecanismos que o capital tem utilizado para impulsionar a acumulação capitalista no atual momento histórico, as saídas encontradas por este para manter-se como premissa necessária e permanente da produção e de sua reprodução ampliada8. Seguindo a discussão, acrescenta Netto:

Uma tal determinação, se não pode desconsiderar a forma contemporânea que adquire a lei geral de acumulação capitalista, precisa levar em conta a complexa totalidade dos sistemas de mediações em que ela se realiza. Sistemas nos quais, mesmo dado o caráter universal e planetarizado daquela lei geral, objetivam-se particularidades culturais, geopolíticas e nacionais que, igualmente, requerem determinação concreta (NETTO, 2010, p. 10).

Sem dúvida, o processo histórico de expansão na Europa, à época da Revolução Industrial, representou o caminho percorrido pelo capital com fins de intensificar o processo de acumulação capitalista, eliminando possíveis focos de tensão. Este processo se fundamentou no instrumental de trabalho revolucionado, no interior “do sistema orgânico de máquinas da fábrica”, explicitado por Marx ao longo de seus estudos em O’Capital (2008, p. 451). Revolucionado porque, ao introduzir máquinas no sistema produtivo, o capital redimensionou para patamares superiores a produtividade do trabalho, mediante a intensificação da exploração da força de trabalho humana. Isso se torna possível, também na medida em que foram incorporadas forças de trabalho suplementares, a exemplo de mulheres e crianças, evidenciando, sobretudo, uma intensificação da exploração do trabalho alheio, sem regras.

8 Consideramos essencial esclarecer os conceitos de capital e capitalismo; na concepção de

Mészáros, há uma distinção fundamental entre estes conceitos. Para este autor, o capital já existia antes mesmo de sua forma capitalista, sendo o capitalismo, portanto, uma das formas possíveis de realização deste. Mészáros, o compreende como um processo que se manifesta em vários momentos, sem excluir sua natureza intrínseca, caracterizado por uma relação social fundada no trabalho social, que na fase atual, se expressa na subsunção real do trabalho no capital. Maiores detalhes ver: Mészáros (2002), Paniago (2007).

Surge, portanto, o significado histórico da produção capitalista, cujas mudanças, ao longo do tempo, alteraram significativamente o imediato processo produtivo, e as relações sociais, no âmbito do desenvolvimento das forças produtivas e sociais do trabalho. As mulheres, neste processo, passaram a compor a massa de trabalhadores, com níveis de pagamento diminutos se comparados àqueles dos homens. Ao se inserirem neste processo como ofertantes de forças de trabalho, estas passaram a ser reforço instantâneo dos já expressivos números de trabalhadores que atuam como reserva do capital. Aumentaram consideravelmente o exército industrial de reserva.

Esse quadro nos aponta traços de continuidade, quando Antunes em “Os sentidos do trabalho” (1999) faz referência ao significativo aumento do trabalho feminino em diversos países centros, na composição de cerca de 40% da força de trabalho. Inserção que tem como particularidade ocorrer, em sua maioria, no universo do trabalho part time, precarizado e desregulamentado. Na realidade, as mulheres se inserem igualmente aos homens, no contexto de “aguda destrutividade”, de degradação do trabalho, de fragmentação e heterogeneidade da classe trabalhadora. Antunes (2007, p. 171) denomina esta inserção de “[...] expressão mais profunda da crise que assola a (des)sociabilização contemporânea”. Quanto maior o desenvolvimento capitalista, maior a procura pela versatilidade da capacidade do trabalho. Importante destacar: a existência de acumulação, hoje em expansão, tem sido possível mediante o crescimento dos capitais individuais e da forma de organização da produção numa cooperação em larga escala.

Marx referencia bem o processo histórico de formação das pré-condições do modo de produção capitalista, o qual nasce da estrutura econômica da sociedade feudal. Esta teria liberado, segundo ele, os elementos necessários à formação do capitalismo. Mudaram-se, dentre outras coisas – no decorrer desta transição – as formas de exploração – da exploração feudal à exploração capitalista. Para Marx (2009, p.827-829): “certa acumulação de capital em mãos de produtores particulares de mercadorias constitui condição preliminar do modo de produção especificamente capitalista”. Por que referenciamos esse aspecto em específico? Pelo fato de o

modo especificamente capitalista se caracterizar pela produção de mercadoria, condicionada pela exploração do trabalho, cujos métodos postos em marcha para aumentar mais o trabalho, nada mais são do que métodos para fazer crescer o produto excedente, ou seja, métodos para acelerar a acumulação. Ademais, porque a acumulação primitiva lavrada pelas mãos particulares de produtores de mercadoria significou o ponto de partida para a acumulação capitalista. Desse modo, “a acumulação aparece, de um lado, através da concentração crescente dos meios de produção e do comando sobre o trabalho e, do outro, através da repulsão recíproca de muitos capitais individuais”. (MARX, 2009, p. 729).

Sob a sociabilidade capitalista, a produção geral das mercadorias é resultante, portanto, de um “[...] um processo que ocorre entre coisas que o capitalista comprou, entre coisas que lhe pertence” (MARX, 2008, p. 219). Aliás, o produto deste pertence ao capitalista do mesmo modo, tendo em vista que o trabalhador ao vender sua força de trabalho, renuncia de imediato ao direito de participação no produto por ele criado, resultado do dispêndio de sua energia e criatividade. Nessas condições, o proletariado se torna indiferente em relação ao conteúdo particular – fruto de seu trabalho. A condição de trabalhador assalariado pressupõe, portanto, que o trabalhador tenha como posse única, sua força de trabalho. Esta é a forma assumida pelo trabalho na sociedade capitalista.

Harvey, ao nos remeter à época de instauração do capitalismo, da acumulação primitiva, ressalta que o nascimento deste acontece, em um contexto envolto em séries de lutas episódicas e violentas, caracterizando um verdadeiro processo de acumulação por espoliação (2005, p. 133). E acrescenta afirmando, que as características da acumulação primitiva que Marx expôs permanecem até hoje presentes na geografia histórica do capitalismo. Tendo por base Harvey, destacamos que:

A expulsão das populações camponesas e a formação de um proletariado sem terra tem se acelerado em países como o México e a Índia nas três últimas décadas; muitos recursos antes partilhados, como a água, têm sido privatizados (com frequência por insistência do Banco Mundial) e inseridos na lógica capitalista da acumulação; formas alternativas (autóctones e mesmo, no caso dos Estados Unidos, mercadorias de fabricação caseira) de produção e consumo têm sido suprimidas. Indústrias nacionalizadas têm sido privatizadas.

O agronegócio substituiu a agropecuária familiar. E a escravidão não desapareceu (principalmente no comércio sexual) (HARVEY, 2005, p. 121).

Nesse sentido, o capital tem renovado os mecanismos de acumulação por espoliação. Igualmente, tem utilizado o aparato institucional do Estado para legitimar suas movimentações no interior das economias, dando-lhes mobilidade. O capitalismo cria, portanto, um sistema-mundo de poder de tamanha expressão que o teria validado como liderança político-produtiva por muito tempo (trezentos anos9), e subordinado sem restrições toda e qualquer força de trabalho existente. Como ressalta Martins, ao criar um sistema-mundo com forte liderança política da nobreza, o capitalismo vem:

[...] controlando as políticas de Estado para impulsionar a busca de superlucro, mediante a pilhagem, a colonização e o tráfico de escravos como suas principais fontes de acumulação ilimitada. Entretanto, apenas pôde transformar-se de sistema-mundo em sistema mundial, com o pleno desenvolvimento de suas tendências seculares, mediante o estabelecimento de sua base específica de forças produtivas e relações de trabalho: a revolução industrial e o assalariamento, que impulsionaram o capital produtivo como eixo de articulação dos capitais comercial e usurário e, com ele, a instituição e a expansão da mais-valia. (MARTINS, 2010, p.242).

Na consolidação do capitalismo como um sistema mundial, este tem recorrido, a fontes adicionais de acumulação, a exemplo da especulação, e da forte onda da financeirização10, que conduziu o desenvolvimento do capitalismo a partir das últimas décadas do século XX. Isso ocorre, mesmo que o campo financeiro

9 Referência e projeção propalada por Martins (2010, p. 242).

10Ao referenciarmos a valorização financeira como um dos mecanismos encontrados pelo

capital para se reproduzir na contemporaneidade, nos reportamos principalmente, à lógica de acumulação, e não necessariamente ao quantitativo deste capital em relação à soma global de capitais. As análises de Paulani acerca desse processo de acumulação ajudam- nos a elucidar essa questão: “A dominância financeira da valorização financeira não significa apenas que tal valorização seja hoje mais importante que a produtiva. Significa, principalmente, que sua lógica se impõe ao processo total de acumulação e reprodução capitalistas”. E quais são as características da acumulação financeira? Ela é rentista, quer dizer, apropriando-se da renda gerada no setor produtivo; é curto-prazista, ou seja, arisca a projetos de longo prazo preza antes de tudo a liquidez; é avessa ao risco, mas ao mesmo tempo é instável e arriscada, porque enseja e reproduz a especulação; é exterior a produção, porque não lhe importam as necessidades da atividade produtiva em si, mas tão somente a valorização dos ativos financeiros – originem-se eles ou não da esfera produtiva – e sua liquidez” (2010, p. 129).

encontre limites de realização em longo prazo, comprovando tratar-se de uma acumulação assentada em riscos, principalmente quando sua valorização não encontra respaldo na esfera produtiva.

Considerar esse processo de valorização financeira, compreendendo a lógica de acumulação posta, nos permite afirmar que a invasão e difusão de transformações no ambiente produtivo obedecem aos ditames da financeirização, na medida em que promove a eliminação de riscos à reprodução do capital, principalmente os desperdícios; por isso, a implementação de mecanismos que encurtem o tempo da produção, ao mesmo tempo, evitem grandes estoques. A partir disto se verifica a desenfreada corrida do capital, na invasão contínua de novos espaços. Este se espraia pelo globo na tentativa de ver garantida sua valorização. Para isso utiliza mecanismos que proporcionem o aumento da produtividade do trabalho, não importa se para isso ele tenha que também recorrer, quando lhe aprouver, à superexploração do trabalho, além do incremento tecnológico.

Marx afirma, em muitas passagens de sua obra, que “a produtividade do trabalho social se torna, a principal alavanca da acumulação” (2009, p.725). Com base nessa lógica, o autor destaca que:

[...] os métodos para elevar a força produtiva social do trabalho, surgidos sobre este fundamento, são ao mesmo tempo métodos para elevar a produtividade da mais-valia ou do produto excedente, que por sua vez é o fator constitutivo da acumulação (MARX, 2009, p. 727).

Ao promover, em determinado tempo histórico, a revolução técnico- científica, o modo de produção capitalista opera significativas mudanças na modalidade do trabalho, se comparado a experiências de produção precedentes. Ao inserir-se no processo produtivo, o trabalho sofre modificações de duas naturezas: quando se converte em trabalho objetivado sendo, ao mesmo tempo, capaz de gerar um valor adicional, um valor diferente e superior ao valor original. Esse processo de geração de valor é possível, na medida em que o trabalho é apropriado no processo produtivo.

Dessa forma, é imperativo afirmar que capital e trabalho são polos opostos de uma mesma realidade societal, considerando que esta “polaridade está encarnada em uma identidade necessária às duas” (BRAVERMAN, 1974, p. 319). Cabe-nos, aqui, acrescentar as arguições diretas do autor, ao analisar essa relação capital/trabalho, análise que, aliás, independe do momento histórico tomando pelo autor, uma vez que estas relações são intrínsecas à lógica capitalista. Assim cita Braverman:

Seja qual for a sua forma, como dinheiro ou mercadoria ou meios de produção, o capital é trabalho: é trabalho que foi realizado no passado, o produto concretizado de precedentes fases do ciclo de produção que só se torna capital mediante a apropriação pelo capitalista e seu emprego na acumulação de mais capital. Ao mesmo tempo, como trabalho vivo que é comprado pelo capitalista para acionar o processo de produção, o trabalho é capital. Aquela parcela de capital monetário separada para pagamento do trabalho, a parcela que em cada ciclo é convertida em força de trabalho viva, é parcela de capital que representa a população trabalhadora e a ela corresponde, e sobre a qual subsiste (BRAVERMAN, 1974. p. 319). Como já referenciado por Marx em O’Capital, o capital se reconhece enquanto capital, quando se torna “valor em processo”. Quando no processo de produção, há um aumento da sua grandeza. Isso ocorre para o autor, “na medida em que se torna uma grandeza variável, na medida em que desde o início é um fluxo que há de gerar uma fluxão” (MARX, 2004, p. 40). Somente dessa forma, o capital consegue se valorizar, através da apropriação da mais-valia, do excedente de trabalho não pago ao trabalhador.

Assumindo esse patamar de análise, não poderíamos deixar de nos fundamentarmos no próprio Marx para quem a continuidade do processo de produção capitalista, implica necessariamente a maior utilização dos fatores de produção, da parte constante (meios de produção), e da parte variável do capital (força de trabalho). Dessa forma, o acréscimo do capital constante, igualmente sugere o acréscimo da parte variável do capital, na demanda por força de trabalho. Para Marx, “acumular capital é, portanto, aumentar o proletariado” (2009, p. 717).

É mister destacar que a procura por força de trabalho aumenta com a acumulação, não se alterando a composição do capital11. No entanto, é fato histórico que o aumento da parte variável não se mostra favorável ao processo de acumulação. Em se mantendo esta situação, a tendência seria aumentar a parte de inversão em salários, o que concomitantemente, reduziria a parcela do trabalho não pago sob a posse do capitalista e, com isso os seus lucros. A solução encontrada pelo capital tem sido prioritariamente uma modificação na composição orgânica do capital com o crescimento da parte constante em detrimento da variável. Como isso ocorre? O capital utiliza mecanismos como o uso de tecnologia no processo produtivo, o que diminui a necessidade de acréscimo de força de trabalho e coloca parcela cada vez maior de pessoas na condição de “peça supérflua”.

Nesse contexto, são notórios à produção capitalista, mecanismos que modificam não somente a natureza do processo produtivo, como as condições reais desse processo, ao intensificar a subordinação e subsunção do trabalho no capital. Neste modo de subsunção é possível identificar a extração de mais-valia na sua forma relativa, processo denominado por Marx, subsunção real do trabalho no capital (MARX, 2004, p. 104-105). Segundo o autor, isso ocorre porque a “aplicação da ciência e da maquinaria à produção imediata” abrevia o tempo socialmente necessário, intensifica com isso o rendimento do trabalho, aumentando simultaneamente a produtividade.

Com os desdobramentos da especialização flexível, predominantes no período pós-1980, o capital tem se apropriado sobremaneira de mais valor relativo. Neste período foi intensificado o uso da microeletrônica e da robótica no processo produtivo. Este mecanismo somou-se à extração da mais-valia absoluta, operada de forma efetiva no modo de trabalho preexistente, cuja característica continua sendo o prolongamento da jornada de trabalho, do ato laborativo, conhecido período que na

11 A composição do capital é examinada no capítulo XXIII, de O’Capital, por Marx, sob dois

aspectos: da composição do valor e da composição técnica. A perspectiva do valor é determinada pela proporção em que o capital se divide em constante (o valor dos meios de produção) e variável (a soma global dos salários). Já do ponto de vista da matéria, que se refere especificamente ao processo de produção, temos o capital que se “decompõe em meios de produção e força de trabalho viva; essa composição é determinada pela relação entre a massa dos meios de produção empregados e a quantidade de trabalho necessária para eles serem empregados” (MARX, 2009, p. 715).

obra Marxiana recebeu a denominação de “subsunção formal do trabalho no capital” (MARX, 2004).

Na atualidade, no ambiente produtivo, o capitalismo se expande lançando mão de novas formas de organização e de gestão de trabalho. O uso intensivo de subcontratações e terceirizações caracteriza essas novas relações de trabalho e desvelam a intensificação da superexploração do trabalho, que no caso brasileiro é prática evidente. Ao mesmo tempo, o capital reconfigura seus espaços de produção e de valorização pelo globo. Isso tem sido possível, na medida em que as relações de subordinação do trabalho ao capital não precisam estar mais vinculadas a um espaço físico de chão da fábrica, estas últimas eram constitutivas de uma realidade produtiva, regida pelo padrão fordista predominante até 197012. Esta é a forma encontrada pelo capital para se reproduzir na periferia do sistema13. Na concepção

de Antunes (2007, p. 171), todo esse movimento, trata-se, na verdade da criação da “sociedade dos descartáveis14”, condição indispensável à manutenção do sistema de metabolismo social do capital.

12Na concepção de Chesnais (1996, p. 300), a capacidade de o fordismo assegurar a

estabilidade e a acumulação mundial durante 25 anos (aproximadamente de 1950-1975) se fundamenta em três fontes substanciais: 1) pela façanha de colocar o trabalho assalariado como condição predominante “de inserção social e de acesso à renda”; 2) os mecanismos que no nível monetário e financeiro, criaram um ambiente internacional monetário estável; e, por fim, 3) “a existência de estados dotados de instituições suficientemente fortes para impor ao capital privado, disposições de todo tipo e disciplinar seu funcionamento [...]”. Assim, as manifestações da crise no final do século XX atingem os três pilares do modelo de acumulação até então vigente, mesmo que em disposições diversas. Harvey (2008), na “Condição pós-moderna”, já destacava os problemas apresentados pelo fordismo/taylorismo, em meados de 1960, expressos na queda da produtividade e da lucratividade corporativas. Isso se intensifica mais propriamente entre 1965 e 1973, revelando a incapacidade deste modelo produtivo em conter as contradições inerentes ao processo de acumulação capitalista. Esta contradição leva o capital há redimensionar o tempo e o espaço de sua reprodução, e a introduzir mecanismos de restauração da acumulação capitalista.

13Relata Antunes que há o redesenho das estruturas produtivas. Como consequência, o

capital opera a redução de determinadas atividades no âmbito das montadoras estendendo- se às subcontratadas, às ‘Terceiras’, a produção de elementos básicos e constitutivos que no fordismo eram de competência destas (ANTUNES, 2007, p. 35). Dentro das empresas há uma intensificação da busca pela eliminação do desperdício, por meio da manutenção de estoque mínimo; o que garante o melhor aproveitamento do tempo de trabalho - just in time; além da utilização do sistema Kanban, sistema visual de informação utilizado pela Toyota.

14Tornam-se pertinente, neste ponto de análise, explicitar aspectos das arguições de

Por mais que a aparência insista em apresentar o movimento dinâmico do capital como algo equilibrado e sincrônico, este não o é, principalmente se o norte analítico estiver no longo prazo. Marx (2009) e autores como Harvey (2006), Mészáros (2009) nos esclarecem essa dinâmica de acumulação, como sendo