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SUMÁRIO

4 O DESAFIO DA ABORDAGEM AMBIENTAL NO ENSINO DE QUÍMICA

4.4 A SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL NO ENSINO DE QUÍMICA

Ressaltamos que as discussões sobre a SAmb no ensino, ao menos em âmbito nacional, não são comuns. Se nos referirmos ao Ensino de Química, os trabalhos são ainda mais restritos. Selecionamos dois que, por meio de questionários, buscaram compreender a noção de SAmb de estudantes já na graduação, sendo um realizado no primeiro ano de distintos cursos (KAWAMURA; RAMOS, 2009) e outro com os estudantes de licenciatura em Biologia (GUIMARÃES; TOMAZELLO, 2004).

Segundo Kawamura e Ramos (2009), deveria ser perceptível a correlação entre a representação de meio ambiente e a sustentabilidade. Contudo, com os resultados da pesquisa, identificaram que as respostas dos pesquisados eram completamente independentes, o que para os autores pode significar pouca consciência dos estudantes sobre suas próprias representações. Para nós, a falta de conexão entre uma e outra compreensão podem ser indícios de que o meio ambiente não é naturalmente relacionado à sustentabilidade, como nós defendemos que deva ser.

Ainda segundo Kawamura e Ramos (2009), também ficou claro que a representação de meio ambiente pelos estudantes foi melhor formulada, sendo mais intrínseca ao indivíduo se comparada com a de sustentabilidade. Para nós, a falta de clareza sobre a representação de sustentabilidade pode evidenciar algo bem mais simples, como a ausência de discussões sobre a própria sustentabilidade entre os meios de comunicação, na escola e entre os próprios pesquisadores, tendo em vista o número reduzido de artigos científicos sobre o assunto; bem

diferente da concepção de meio ambiente, que vem sendo muito discutida desde 1992, ano que a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e para o Desenvolvimento aconteceu no Rio de Janeiro e que os problemas relacionados aos países não desenvolvidos ou em desenvolvimento ficaram mais evidentes (DOMINGUES, 2007).

As conclusões de Guimarães e Tomazello (2004) sobre a sustentabilidade envolvem a ampliação da proposta educacional voltada ao assunto, transcendendo os limites ecobiológicos fortemente presentes nos conteúdos tradicionais da biologia. Acreditamos que a discussão da SAmb é relativamente nova e seu conceito ainda está em construção, tornando a sua compreensão confusa.

Outro aspecto que nos chamou atenção em ambos os estudos foi o posicionamento dos autores em solicitar a busca de outro modelo econômico por não aceitarem como suficiente o desenvolvimento e aprimoramento das tecnologias e a garantia de recursos naturais, tendo em vista a repercussão do modelo econômico capitalista na degradação ambiental e nas desigualdades sociais. Os artigos defendem ainda, em âmbito escolar (KAWAMURA; RAMOS, 2009) e universitário (GUIMARÃES; TOMAZELLO, 2004), o tratamento mais rigoroso das questões que envolvem a sustentabilidade, buscando a ampliação de significados e possibilidades do termo, abrangendo os aspectos socioculturais na perspectiva ambiental crítica.

Assumimos que os comentários realizados nos artigos citados se aproximam da perspectiva de SAmb que defendemos neste trabalho por também julgarmos insuficiente a substituição de tecnologias, enquanto as relações dos seres humanos permanecem restritas às condições de mercado. Aproximamo-nos também da perspectiva educacional que defendem as duas pesquisas, já que buscamos elevação do nível de consciência e a atuação na perspectiva da transformação das relações humanas no ambiente e das relações humanas com o ambiente, ponderando sobre o desenvolvimento humano junto ao ambiental.

Aperfeiçoando a nossa discussão no âmbito da educação, aproveitamos o momento para nos posicionarmos em relação ao papel da SAmb no Ensino de Química, tanto na formação básica como na superior e, para isso, baseando nossa concepção de educação segundo Freire (2011, 2012).

Ao estabelecer que o conceito de SAmb foi composto social e culturalmente, enfatizamos que sua compreensão se dá historicamente. À medida que avançamos no tempo, percebemos que o entendimento sobre o mundo que nos cerca e sobre as nossas relações com o mundo e

no mundo são melhores, mais completas e nos tornam mais humanos (FREIRE, 2011). Assim, com o desenvolvimento do conhecimento, é possível responder as inquietações de hoje; sobre o uso de substâncias químicas, sobre as mudanças climáticas, sobre as transformações do mundo natural e também social. Sim, pois estamos buscando a mudança das relações que mantemos com a economia, falamos do tratamento desta dependência determinante (histórica) que temos do crescimento econômico, das relações desiguais que permitimos que se perpetuem ano após ano, que parece cada vez mais acentuada (intensificação) ou mais transparente (lucidez).

A inserção da SAmb em sala de aula deverá possibilitar a ampliação das discussões sobre o meio ambiente, a sociedade e o desenvolvimento do conhecimento humano nas diferentes disciplinas (mesmo não concordando inteiramente com a estrutura disciplinar atual), superando as aulas baseadas em conteúdos sem significação aparente, transmitida cifrada aos estudantes. Favorece aos indivíduos a reflexão sobre a situação no mundo, estendendo as perspectivas aparentemente locais às dimensões globais dos problemas socioambientais. Não se trata de resolver os problemas por meio das disciplinas/disciplinas de Química, mas fazer pensar sobre os problemas a partir do conhecimento que estas proporcionam, ou ao menos fazê-los visíveis aos olhos de quem não os vê, pois só reconhecendo a existência dos problemas que os indivíduos problematizados se sentirão capazes de buscar soluções (FREIRE, 2011).

Abordar a complexidade de chegar à SAmb – válida somente para um período de tempo determinado, se é que um dia será possível alcançá-la, já que conhecemos as Leis da Termodinâmica – coloca à prova as propagandas das indústrias, as promessas do governo e as reuniões de líderes mundiais a respeito do meio ambiente. É possibilitar aos indivíduos o conhecimento de suas histórias e de seus contextos, garantindo a possibilidade de pleitearem por mudanças, resistindo ao pensamento hegemônico, construindo instâncias que viabilizem transformações.

A SAmb permite que a realidade, o mundo em que vivemos, exerça seu papel de mediador do conhecimento. “É preciso vê-lo [indivíduo], portanto, em sua interação com a realidade, que ele sente, percebe e sobre a qual exerce uma prática transformadora” (FREIRE, 2011, p. 102), pois o mundo, que é conhecido de várias formas, é o ponto em comum de indivíduos com histórias de vidas distintas, é o que possibilitará o diálogo entre o estudante e o professor.

Não acreditamos que seja tarefa para um ou outro professor, mas acreditamos no espaço escolar como ambiente politizado, assim como os professores,

[...] num sentido mais amplo, [...] devem ser vistos em termos de interesses políticos e ideológicos que estruturam a natureza do discurso, relações sociais em sala de aulas e valores que eles legitimam em sua atividade de ensino. Com esta perspectiva em mente, [...] os professores deveriam se tornar intelectuais transformadores se quiserem educar os estudantes para serem cidadãos ativos e críticos. (GIROUX, 1997, p. 161)

Também não confiamos toda a responsabilidade da educação sobre o professor e destacamos a necessidade da reelaboração dos currículos escolares, dos programas de Ensino de Ciências que considerem as características regionais e locais, além de fenômenos globais, e a preparação de material didático adequada à concepção de educação escolar, transposta de Paulo Freire. Longe de parecer uma transposição trivial, destacamos a necessidade de mudança na estrutura escolar, no envolvimento da comunidade escolar em um trabalho coletivo e na formação continuada dos professores, sendo o posicionamento do professor apenas um entre tantos outros aspectos.

4.5 ALGUMAS INFORMAÇÕES SOBRE O ENSINO MÉDIO