• Nenhum resultado encontrado

Os profissionais de enfermagem cada vez mais se preocupam com a melhoria da qualidade dos cuidados prestados ao cliente, estando esta associada a fatores como a sua formação, com o exercício profissional e com a realização de intervenções autónomas, como as demonstradas nas teorias de enfermagem (Diógenes & Pagliuca, 2003 ). Salienta-se que estas teorias assistem os profissionais de enfermagem no desenvolvimento de um processo de enfermagem personalizado (Alligood, 2001), verificando-se que estes modelos teóricos têm contribuído, quando utilizados como referenciais teóricos, para a sistematização da prestação de cuidados (Souza, 2001), sempre que aplicados e adaptados às necessidades / individualidades dos clientes e contextos, tendo em conta os conceitos e pressupostos originários da teoria da qual fazem parte (Hermida & Araújo, 2006).

Neste sentido, denota-se que no âmbito deste relatório que dá suporte ao Projeto de Estágio realizado no contexto do 2º Mestrado em Enfermagem em Associação na vertente de Especialização de Saúde Mental e Psiquiátrica, se torna pertinente enquadrar o referencial teórico que serviu de fundamentação teórica para a realização do mesmo.

3.1 – O Modelo de Sistemas de Neuman

Nascida em 1924 numa quinta perto de Lowell, Ohio (EUA), Betty Neuman realizou e completou os seus estudos em enfermagem na Escola de Enfermagem de Povos no Hospital de Akron (Ohio) em 1947. Pelo seu interesse no comportamento humano, fez uma dupla especialização na Universidade da Califórnia (UCLA) em saúde pública e psicologia e em 1966, completou um Mestrado em Saúde Mental e Saúde Pública na mesma Universidade. Mais tarde, em 1985 concluiu o seu Doutoramento em Psicologia Clínica na Universidade do Pacífico Ocidental (Freese, 2004).

Neuman foi uma das primeiras pessoas que aproximou a enfermagem para o campo da saúde mental, tendo desenvolvido o seu primeiro modelo explícito de ensino e prática para consultas em saúde mental no final dos anos 60. Como resposta às solicitações dos seus alunos da UCLA, desenvolveu um modelo conceptual de enfermagem em 1970, que viria a publicar em 1972, denominando-o de: O Modelo de Sistemas (Freese, 2004).

Este é um modelo centrado no holismo, na perceção do cliente, na orientação para o equilíbrio e bem-estar do mesmo e considera que a pessoa está englobada num sistema dinâmico de energia que interage com múltiplas variáveis que integram o meio ambiente (Neuman, 2011).

Segundo Neuman, é na relação entre o sistema cliente e o ambiente que está definido o domínio da Enfermagem1, (Neuman & Fawcett, 2011) no qual se concentram cinco ordens de variáveis: a fisiológica, referente ao corpo biológico (físico) e seu funcionamento; a psicológica que envolve os processos mentais e relacionais; a sociocultural relacionado com as ligações sociais, papéis e estatutos sociais; o desenvolvimento associado ao processo do ciclo vital; e a espiritual que diz respeito ao sistema de crenças na vida da pessoa (Neuman, 1995). Ademais, o modelo fundamenta- se em quatro pressupostos fundamentais: Pessoa2, Ambiente, Saúde e Enfermagem. Neste modelo, a Pessoa é conceptualizada enquanto cliente e tida como um sistema aberto3 e em constante interação com o Ambiente. Este conceito não engloba apenas o indivíduo, mas pode abarcar também a família, o grupo, a comunidade ou uma dimensão social (Freese, 2004).

Neuman salienta no seu modelo que o cliente está em permanente interação com o ambiente e com forças internas e externas originárias desta interação, as quais, de alguma forma, podem modificar a harmonia existente. Estas forças também apelidadas de stressores, têm o poder de transformar o equilíbrio biopsicossocial do indivíduo, pelo que são considerados fatores tensionais potenciadores de desenvolverem desequilíbrios localizados a nível extrapessoal, interpessoal e intrapessoal. Os stressores extrapessoais ou Ambiente Externo operam como forças oriundas do espaço externo que circunda o indivíduo, como por exemplo os problemas económicos ou desemprego. Também os stressores interpessoais se inserem dentro deste ambiente e definem-se como forças que atuam entre dois ou mais indivíduos (expectativas inatingíveis em relação a papéis

1 Diz respeito à totalidade da pessoa. Profissão “única”, pois preocupa-se com todas as variáveis que afe- tam a resposta do indivíduo ao stress. A meta principal da enfermagem é a retenção e obtenção da esta- bilidade do sistema do cliente (Neuman, 1995).

2 Baseia-se na filosofia de que cada homem é uma “pessoa total” (de holistic para wholistic) e essa pessoa é multidimensional, um composto de variáveis fisiológica, psicológica, sociocultural, do desenvolvimento e espiritual (Neuman, 1995).

3 Sistema Aberto: sistema no qual os elementos constituintes deste trocam energia e informação numa or- ganização completa, onde o stress e a reação ao mesmo constituem elementos básicos do mesmo (Freese, 2004).

sociais). No que diz respeito ao Ambiente Interno do cliente, destacam-se os stressores intrapessoais, considerando-se que a interação que a ocorre de forma intrínseca ao indivíduo. Expõe-se neste caso, a expressão de sentimentos como a raiva ou a frustração (Neuman & Fawcett, 2011; Vieira, Alvarez, & Gonçalves, 2009). Importa ainda salientar um último ambiente neste modelo, o Ambiente Criado, que se refere ao ambiente que é definido pelo cliente quando tem que lidar com stressores, exibindo assim os seus mecanismos de coping, no sentido de fazer frente ao problema vivenciado (Neuman & Fawcett, 2011).

De um modo geral o modelo dos sistemas define-se de acordo com uma estrutura básica que engloba fatores como a organização genética, o ego ou a capacidade cognitiva do indivíduo. Em termos visuais, este modelo encontra-se sistematizado através de três linhas concêntricas que conferem ao cliente mecanismos de proteção da sua estrutura básica e da sua integridade enquanto sistema único. Neuman, nomeia estas linhas como linha flexível de defesa, linha normal de defesa e linhas de resistência (Neuman, 1995). A primeira linha de defesa, a linha flexível, é a que se encontra mais afastada da estrutura básica, evitando a interferência de fatores stressantes com o sistema. Esta atua como primeira linha de defesa, mantendo o estado normal de bem-estar. Posteriormente, quando a linha flexível de defesa é ultrapassada, surge a linha normal de defesa, que representa estabilidade tanto para o cliente como para o sistema, sendo esta preservada ao longo do tempo de modo a que seja possível observar o padrão habitual de bem-estar do cliente. De forma, metafórica, esta é uma segunda muralha para evitar o “ataque” de stressores, e tem como propósito promover a adaptação de algumas variáveis inerentes ao cliente para que seja possível enfrentar fatores de stress a que está sujeito o sistema (padrões habituais de controlo individual, estilo de vida, estágio de desenvolvimento). No que concerne às linhas de resistência, as mais internas de todas, verifica-se que são ativadas de forma automática, no caso de existir a invasão de um fator stressante na linha de defesa normal. Estas linhas representam os recursos que ajudam o cliente a defender-se de um elemento stressante (Neuman, 2011).

De um modo global, constata-se que a resposta dada pelo sistema cliente quando os fenómenos de stress penetram a linha flexível ou normal de defesa e desenvolvem tensões, pode ser positiva ou negativa, consoante os recursos e capacidades do cliente. Ademais, as competências que um determinado sistema tem de resistência deve-se às variáveis a que o sistema cliente está sujeito (fisiológicas, psicológicas, socioculturais, de

desenvolvimento e espirituais), bem como ao ambiente em que está inserido (Neuman, 1995, 2011).

Quando inserido este modelo ao nível dos cuidados de enfermagem, verifica-se que ao serem definidas intervenções de enfermagem, estas devem ser dirigidas de forma intencional para os fatores de stress (reais ou potenciais), mas que promovem desequilíbrios, de modo a repor a homeostasia do sistema cliente. Neste âmbito, Neuman elaborou um Processo de Enfermagem exclusivo, composto pelas fases de diagnóstico, finalidades de Enfermagem e resultados de Enfermagem. A base deste processo de enfermagem, está no Diagnóstico de Enfermagem, o qual tem como propósito a colheita de dados oportunos e indispensáveis, que possibilitem, o reconhecimento, a análise e a categorização das interações dinâmicas entre as variáveis que constituem o sistema cliente e os fatores de stress (reais ou potenciais) e que promovem variações no bem- estar. Já na etapa seguinte os objetivos de enfermagem são estabelecidos através da negociação com o cliente, de modo a que as alterações prescritivas desejadas corrijam as variações do bem-estar. No seguimento surgem os resultados de enfermagem que são importantes para a corroboração dos objetivos dos resultados desejados e para reformular os objetivos de enfermagem subsequentes (Neuman, 1995).

Os cuidados de enfermagem procuram imiscuir-se num possível desequilíbrio, procurando, pela interação com o cliente, potencializar os seus recursos, de forma a que se atinja o equilíbrio (bem-estar) do seu sistema. Essa intervenção é defendida por Neuman (2011), quando se desconfia da presença ou se identifica um stressor. Para colmatar este aspeto, podem ser empregues três níveis de prevenção: primária, secundária e terciária. A prevenção primária tem como propósito promover o bem-estar do cliente pela prevenção do stress e diminuição dos fatores de risco, nas quais se incluí estratégias de promoção da saúde, de modo a reforçar a linha de defesa flexível; a secundária apresenta como objetivo proporcionar um tratamento adequado, após o reconhecimento de sintomas de stress, de modo a promover a estabilidade ou o bem-estar do sistema do cliente. Tanto os recursos internos quanto os externos dos clientes são usados para estabilizar o sistema, a fim de fortalecer as linhas de resistência, reduzir a reação e aumentar os fatores de resistência; por fim o terceiro nível de prevenção refere-se à manutenção do bem-estar, ou seja, pretende conferir ao sistema um grau de reconstituição e de regresso ao bem-estar após o tratamento utilizado. Procura-se desta forma recuperar

a estabilidade ideal do sistema, reforçando a resistência aos stressores, com o intuito de ajudar ou prevenir a recorrência da reação ou a regressão (Neuman, 2011).

3.2 – Teoria dos Sistemas e a Depressão na Adolescência: Fundamenta- ção pelo referencial teórico

Analisando o modelo de Betty Neuman na ótica do processo de resolução de problemas verifica-se conforme observado no Capítulo anterior, que ao longo da vida o sistema cliente é confrontado por diversas situações stressantes que colocam o seu bem- estar em causa. Porém, nem sempre as situações stressantes são passíveis de ser travadas pelas linhas de defesa dos mecanismos de proteção do sistema cliente, uma vez que o grau de complexidade do fator stressante pode ser elevado e pelos parcos recursos e capacidades do cliente. Há ainda que considerar, como vimos anteriormente, que a capacidade de resistência de um sistema depende também de certas caraterísticas do cliente, do ambiente envolvente, mas em grande parte das competências deste ao nível das habilidades de resolução de problemas, podendo neste caso específico ser necessário recorrer ao suporte de um profissional de saúde para obter ajuda.

É neste sentido particular, que se considera que o Modelo de Sistemas está intimamente correlacionado com a aplicação da TRP, dado que o cliente, pode a qualquer momento encontrar uma situação adversa no seu quotidiano.

Particularmente no âmbito deste Projeto, e considerando a população abrangida (adolescentes com depressão), considera-se que esta teoria de enfermagem integra na sua plenitude a abordagem realizada, na medida em que a adolescência é uma fase do ciclo vital em que as estratégias de resolução de problemas estão a ser desenvolvidas e na qual a ocorrência de eventos negativos (stressores) podem contribuir para o desenvolvimento de doenças do foro mental, como a depressão. Por outro lado, os déficits na resolução de problemas e a incapacidade de manter o sistema cliente (adolescente) saudável, constituem também um fator de risco para a depressão nesta população.

Sobressai assim, a necessidade de introduzir a utilização de estratégias de intervenção de âmbito psicoterapêutico, que visem dar suporte ao indivíduo para que este desenvolva e reforce mecanismos de defesa e de adaptação face às situações adversas enfrentadas, de entre os quais se destaca o processo de resolução de problemas, que não só se comporta como uma metodologia de tratamento e estabilidade (nível de prevenção secundário), mas

também como um método preventivo (nível de prevenção primário), promovendo a reconstituição do sistema e evitando a repetição da reação ou a regressão (nível de prevenção terciário).

Ao nível da enfermagem, e com o auxílio da TRP, o Modelo de Sistema procura desta forma promover a manutenção de um sistema saudável para o cliente através da análise efetiva dos efeitos dos stressores ambientais e das adaptações que são essenciais realizar, de modo a garantir um nível ótimo de bem-estar (Neuman, 2011).

4.

PROJETO DE INTERVENÇÃO EM SERVIÇO: COMUNICAÇÃO E RESO-

Documentos relacionados