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Capítulo 4: Trabalhadores do Transporte rodoviário de carga

3. A trajetória profissional do motorista de caminhão

Conforme já reiteramos, existem duas formas tradicionais de utilização de motoristas de caminhão para o transporte de cargas entre cidades, regiões ou estados. Pode-se ter um motorista com um contrato do tipo tradicional, que dirige o veículo pertencente à empresa, esta se ocupa de sua manutenção, esse veículo permanece sob a responsabilidade do motorista por um período determinado. Enquanto empregado, o motorista recebe uma remuneração decorrente de diferentes arranjos, mas, regra geral, estabelecida com base do quilômetro rodado; possuindo um piso salarial e valores das diárias e pernoites estabelecidos por convenção coletiva de trabalho. A alternativa é utilizar os serviços de motoristas proprietários de seu próprio veículo – caminhoneiros autônomos – realizando contratos a cada empreitada solicitada. O valor recebido também se baseia na quilometragem, por volume de carga transportado e pelo valor do frete; havendo, contudo, situações em que o pagamento é uma combinação entre preço fixo e quilometragem.

A vida nas estradas é considerada tanto pelo empregados quanto pelos carreteiros como de muitos sacrifícios, pois as longas jornadas (na maioria das vezes sozinho), com estradas em péssimo estado de conservação e o aumento no roubo de carga, são exemplos citados recorrentemente. Entre outras questões fazem destes profissionais, indivíduos que apesar de sempre afirmar que gostam muito do que fazem sempre levantam os problemas. Para além dos itens de perfil, a vida dos motoristas de caminhão é semelhante no seu cotidiano. A solidariedade nas estradas, a participação em festas do padroeiro, o estilo de música que ouvem e os pontos preferidos de paradas são os mesmos de todos os motoristas. O que os diferencia mais é a perspectiva de possuir um caminhão. Analisando o cotidiano dos motoristas de caminhão do município de São Marcos49 Rio Grande do Sul, Bertolozzi50 em sua tese de mestrado revela o interesse dos motoristas de caminhão em montar o seu próprio negócio, apontando algumas experiências de sucesso e outras de fracasso, o que nos chama a atenção é que mesmo aqueles que não tiveram sucesso como empresários continuaram trabalhando no setor como empregados por vários anos. Mesmo aqueles que possuem um caminhão

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Este município é o que possuí o maior número de veículos pesados por habitantes em todo o Brasil.

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BERTOLOZZI, Marco Aurélio (1998). “Empregado, Autônomo e Empresário: a tomada de decisão no setor de transporte rodoviário de cargas em São Marcos”. Tese de Mestrado em Administração. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Orientador Prof. Francisco de Araújo Santos, Porto Alegre.

têm como objetivo expandir as suas atividades comprando mais veículos, e desta forma tornando-se empresários.

Dentro de seu cotidiano diário, os mesmos problemas enfrentados pelos carreteiros e empregados são: (i) a grande maioria pernoita na cabina do caminhão economizando recursos; (ii) uma grande parte prossegue viagem após à meia noite; (iii) alguns fazem a sua própria comida na estrada; (iv) a maioria roda mais de 600 km por dia; (v) a quantidade de caminhões multados é elevada e como resultado mais próximo deste cotidiano de trabalho é que os acidentes com caminhão ocorrem em uma escala elevada.

Quando se observa pelos hábitos e pelos costumes, não se consegue diferenciar um motorista autônomo de um empregado. Mesmo não sendo o objeto de nossa análise a cultura do caminhoneiro não diferencia pela relação contratual de trabalho que este possuí. E dentro desta perspectiva de proximidade cultural que os empregadores procuram assemelhar os motoristas empregados e autônomos quanto a forma de contratação, como na de uso e remuneração.

Contemporaneamente, a vida profissional do motorista de caminhão, regra geral, vai num movimento de transferência do trabalhador com relação de emprego permanente, nas transportadoras, para a situação de trabalhadores “terceirizados”, ou de caminhoneiro por conta própria, constituído sob a forma jurídica de autônomo ou empresário (empreendedores), deve dispor de seu próprio caminhão, executando praticamente os mesmos serviços que realizava anteriormente, na condição de empregado. Outra situação ocupacional na qual acaba se enquadrando é a de trabalhador por conta própria com relação de dependência, o que caracteriza uma relação de emprego encoberta (ILO, 2003;). Como resultado disto, segundo afirma a ILO,

Em praticamente todos os casos, o motorista é legalmente separado da empresa, mas continua a desempenhar, essencialmente, o mesmo trabalho, numa posição de efetiva dependência em relação ao empregador. A diferença agora é que o motorista é autônomo, devendo arcar com os custos de manutenção do veículo, sem qualquer proteção trabalhista.

No Brasil, as empresas utilizam simultaneamente o motorista contratado e o caminhoneiro autônomo (proprietário de seu veículo), com maior tendência à utilização deste último, por conferir maior agilidade e flexibilidade na distribuição de veículos; como uma das justificativas para o crescimento dos trabalhadores por conta própria, além das questões já abordadas anteriormente,

sobre os tipos de contratos dos autônomos. Observa-se uma crescente complexidade das relações de emprego, reforçada pela prática da “terceirização”, que dissimula as relações de subordinação entre as partes. Destaca-se, no entanto, que as atividades desenvolvidas por motoristas e pelos caminhoneiros no Brasil no setor de transportes de mercadorias são praticamente as mesmas, embora as relações de subordinação não sejam explicitadas por um contrato formal de trabalho.

Observa-se, contudo, no desempenho das funções do caminhoneiro autônomo um conjunto de características que tendem a inseri-lo não apenas no pólo do fator trabalho, mas igualmente numa relação de emprego tradicional. É o que ocorre, por exemplo, nos seguintes casos: a) a realização dos serviços de acordo com padrões, percurso e tempo definidos pelo contratante, sob a supervisão deste último; b) a estabilidade na prestação dos serviços do caminhoneiro para uma única empresa contratante; c) a especificidade do instrumento de trabalho (o caminhão), em que tipo de carreta é definido pelo contratante e apenas pode ser utilizada para o transporte de determinados veículos; d) a identificação do instrumento de trabalho do caminhoneiro com a empresa contratante: o veículo estampa o logotipo da empresa contratante; e) a remuneração estabelecida através de negociação coletiva por um sindicato representativo da categoria; ou f) a remuneração estabelecida por unidade de Km rodado, que implicitamente define uma remuneração horária associada a um nível de esperado de produtividade, tendo em vista as características e os custos previamente conhecidos do caminhão, do percurso e da habitualidade do percurso, muitas destas questões também veremos presentes quando analisamos os motoristas que trabalham como empregados.

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