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A Variabilidade Climática e os seus componentes escalares

1.2 VARIABILIDADE CLIMÁTICA E PLUVIOSIDADE: FUNDAMENTOS TEÓRICOS,

1.2.1 A Variabilidade Climática e os seus componentes escalares

O sistema climático configura-se como sendo altamente complexo, marcado por interações dinâmicas, refletidas em anomalias, oscilações, flutuações, variabilidades e mudanças do ponto de vista das escalas do clima (CONTI, 1998; TAVARES, 2001). Estes processos ainda que de dimensões físicas, originam efeitos atmosféricos diversos, os quais também se manifestam na forma de impactos nas sociedades, tais como as anomalias positivas (inundações) e negativas (estiagens) de precipitações. Esse fato coloca a compreensão das variabilidades climáticas, associadas a estas dinâmicas, no rol dos estudos de destaque da ciência geográfica, por permitirem uma abordagem ampla dos mecanismos, controles e processos atmosféricos, no espaço e no tempo.

Do ponto de vista conceitual, o clima refere-se a série dos estados atmosféricos de um determinando lugar em sua sucessão habitual (SORRE, 1951). Segundo Monteiro (1976) tais processos são observados por meio da análise dos tipos de tempo em sequência contínua (ritmo climático) por longos períodos (mínimo 30 anos), com diferentes combinações dos elementos climáticos entre si e em relação a outros atributos geográficos, os fatores do clima.

A variabilidade, por sua vez, expressa-se como a variação das condições climáticas em torno da média climatológica, ou ainda, a maneira pela qual os parâmetros climáticos variam no interior de um determinado período de registro, através de desvios padrões ou coeficientes de variação (TAVARES, 2001; CONTI, 2005). Autores como Ribeiro (1996), Tavares (2001) e Nascimento Junior (2017) reiteram que se trata de um componente inerente do fenômeno climático, associado aos princípios da periodicidade e ciclicidade das dinâmicas atmosféricas.

Cavalcanti e Ambrizzi (2009) ressaltam que a circulação atmosférica desde a escala global até a local apresenta variabilidades, de modo que os padrões sinóticos e de circulação expressam essas variações nas escalas de dias (tempestades e passagens de frentes) até vários séculos (mudanças climáticas de longo período).

Desse modo, o clima (e suas variabilidades) pode ser estudado por meio de dimensões espaciais (extensão) e temporais (duração). Do ponto de vista espacial, as

variações podem ocorrer nos níveis de macro, meso e microclimas, ao passo que as dimensões temporais expressam-se nas escalas geológica, histórica e contemporânea (QUADRO 05) (MENDONÇA e DANNI-OLIVEIRA, 2007).

QUADRO 05 - ESCALAS GEOGRÁFICAS DO CLIMA

ESCALA ESPACIAL Ordem de Grandeza Subdivisões Escala Horizontal Escala Vertical Temporalidade das variações Exemplificação Espacial Macroclima Zonal Regional >2000 km 3 a 12 km Algumas semanas a vários decênios O globo, um hemisfério, continentes, mares, etc.

Mesoclima Regional Local

Topoclima 2000 km a 10 km 12 km a 100 m Várias horas a alguns dias Região natural, montanha, região metropolitana, cidade, etc. Microclima --- 10 km a alguns m Abaixo de 100 m De minutos ao dia Bosque, uma rua, edificação/casa, etc. ESCALA TEMPORAL Geológica

Estudos do paleoclima, baseados em indicadores biológicos (fósseis, pólens e anéis de árvores), litológicos (sedimentos, camadas de aluviões, depósitos de sal), e morfológicos (terraços fluviais, dunas, formas residuais do relevo, inselbergs). Nessa escala são observadas variações e mudanças climáticas ocorridas no planeta de algumas centenas a várias dezenas de milhões de anos passados.

Histórica

Estudos do clima do passado em períodos da história registrados pelo homem, com base em descrição de ambientes (relato de viagens, por exemplo), desenhos em paredes de cavernas, registros dos elementos atmosféricos mensurados através dos primeiros instrumentos meteorológicos.

Contemporânea

Estudos baseados em séries de dados meteorológicos de uma ou mais estações com temporalidade, preferencialmente, superior a 30 anos. A escala contemporânea, na qual a maior parte dos climatólogos da atualidade trabalha, volta-se a análise dos tipos de tempo, variabilidade climática de curta duração, tendências climáticas e estabelecimento de médias.

FONTE: Adaptado de Mendonça e Danni-Oliveira (2007)

Sant’anna Neto (2008) também procurou sistematizar as escalas de análise do clima em suas dimensões espaço-temporais, de gênese e processos, com detalhamentos desde as escalas superiores (generalização) até as unidades inferiores (especialização) do clima (QUADRO 06). O autor enquadrou a variabilidade climática nas interfaces natural-antrópico e nos princípios cíclicos supracitados, partindo do

pressuposto da indissociabilidade entre a natureza atmosférica (tempo e clima) e suas repercussões em fenômenos/episódios concretos (na sociedade).

QUADRO 06 - DIMENSÕES ESPAÇO-TEMPORAIS DO CLIMA, GÊNESES E PROCESSOS

ESCALAS DO

CLIMA Espacial Escala Temporal Escala Gêneses Processos

Generalização Global Mudança Natural Movimentos astronômicos, glaciações, vulcanismo, tectônica de placas

Organização Regional Variabilidade Antrópico Natural e ciclos naturais, mudanças Sazonalidade, padrões e da paisagem

Especialização Local Ritmo Antrópico territorial urbana, cotidiano Uso do solo, expansão

FONTE: Adaptado de Sant’anna Neto (2008)

Ressalta-se que no âmbito da literatura científica existem inúmeras controvérsias no que se refere às dimensões escalares do clima, bem como aos limites conceituais entre anomalias, oscilações, flutuações, alterações, variabilidades e mudanças, cujas diferenciações encontram-se atreladas a escala temporal (MENDONÇA e DANNI-OLIVEIRA, 2007). Entretanto, do ponto de vista da variabilidade climática, tem-se como consenso entre a maior parte dos autores que esta encontra-se atrelada à ciclicidade e periodicidade dos padrões atmosféricos, no espaço e no tempo, de modo a configurar-se como um processo de análise do clima (SANT’ANNA NETO e ZAVATTINI, 2000; TAVARES, 2001; SANT’ANNA NETO, 2013; NASCIMENTO JUNIOR, 2017).

Em função de expressar-se como uma escala intermediária, a variabilidade possibilita a compreensão de uma trama de elementos e fatores do clima, de maneira conjugada à paisagem e aos diversos níveis de arranjos espaciais (SANT’ANNA NETO, 2013). Para Sant’anna Neto (2013) o seu entendimento perpassa pela observação da circulação secundária dos grandes sistemas atmosféricos e suas relações com os fatores geográficos (rugosidade do relevo, continentalidade/maritimidade, altitude e influências dos grandes conjuntos

vegetacionais e antrópicos). Além disso, configura-se como uma importante ferramenta para a compreensão das inter-relações atmosfera-oceano e suas repercussões espaço-temporais, por permitir análises integradas entre as variações naturais do clima e os diversos fatores geográficos (NUNES e LOMBARDO, 1995; ANGELOCCI e SENTELHAS, 2007).

Em decorrência das especificidades das análises supracitadas, as observações da variabilidade do clima e de seus fenômenos associados perpassam por métodos e técnicas específicas, cujas formas de análise são essencialmente quali- quantitativas, e fundamentam-se, sobretudo, nas tradicionais análises estatísticas (FIGURA 04), conforme cita Nascimento Junior (2017).

FIGURA 04 - MÉTODOS E TÉCNICAS DE ANÁLISE DA VARIABILIDADE DO CLIMA

FONTE: Nascimento Junior (2017)

De um modo geral, estas técnicas e metodologias centram-se na busca pelo entendimento concomitante dos processos e das gêneses ligadas aos fenômenos atmosféricos, em diversos níveis escalares e recortes temporais. Nunes (1998), Monteiro (2003), Pinto e Aguiar Neto (2008) e Nascimento Junior (2017) destacam que as relações escalares são fundamentais, posto que não indicam apenas relações de áreas e períodos de abrangência, mas também as técnicas, os métodos e os controles a serem utilizados. Neste sentido, salienta-se que a compreensão das noções escalares e das inter-relações hierárquicas associadas aos mecanismos e

padrões do clima, torna-se fundamental para o entendimento das gêneses climáticas e de suas repercussões espaciais.

Partindo-se destes pressupostos, no âmbito deste estudo, com o intuito de compreender as variabilidades ligadas aos extremos pluviais são adotadas as dimensões escalares mesoclimáticas (interfaces regional-local), do ponto de vista espacial, e na análise temporal, admite-se a escala contemporânea do clima. Para tanto, por meio de um recorte temporal diário são colocados em evidência controles e componentes de sazonalidade, padrões e ciclos naturais, bem como inter-relações com as paisagens; parâmetros estes, que ora condicionam, ora se relacionam aos extremos do clima.

1.2.2 As configurações climáticas no Sul do Brasil e suas influências na pluviosidade