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Capítulo 5 EEG-RMf

5.3 Artefatos no EEG

5.3.5 AAS: Average Artifact Subtraction

Os métodos como ICA, PCA e ANC dependem de uma estatística de ordem mais alta, costumam ser menos robustos do que a subtração do artefato, e é mais difícil de prever sua influência nas propriedades estatísticas do ruído no sinal de EEG corrigido (Mandelkow et al., 2006). Além disso, por ser um método simples, por oferecer resultados satisfatórios e por ser um dos mais utilizados, AAS foi o algoritmo escolhido para correção de artefatos neste trabalho.

O método AAS está ilustrado na Figura 5.7 para remoção de artefato cardíaco, mas também pode ser aplicado para correção dos artefatos de imagem no EEG. Encontra-se um molde do artefato em cada canal separadamente, através da média do sinal do EEG em um número determinado de intervalos. O molde é então subtraído de cada intervalo no canal correspondente. No caso do artefato de imagem, os intervalos podem ser identificados por um

sinal gerado pelo scanner no início da aquisição de cada volume, isto é, a cada TR. (Allen et al., 2000)

Figura 5.7: Diagrama da correção AAS para o artefato de pulso aplicado a um canal de EEG. Nesta versão do algoritmo, a correção é feita a cada segundo, e são utilizados os 10 s anteriores para encontrar o molde do artefato. Os picos acima de um limiar são identificados no ECG (A); quando a correlação da forma de onda com um molde do complexo QRS (D) for baixa, os picos correspondentes (E) são considerados ruído e são rejeitados. Também pode ser identificado um complexo QRS que não ultrapassa o limiar, mas ocorre dentro de um intervalo R-R escolhido após o pico anterior (F). Realiza-se então a média do sinal do EEG em cada canal (B) nos seguintes instantes com relação ao picos no ECG: atraso (G) ± (intervalo R-R médio)/2. Por fim, subtrai-se do sinal de EEG o molde do artefato (C). Para cada ciclo cardíaco, um novo molde do artefato é encontrado. Trechos do EEG com outros artefatos (H) são excluídos do cálculo do molde. Figura modificada de Allen et al. (1998), Fig. 2.

AAS depende totalmente da reprodutibilidade do artefato, ou seja, este precisa ser estacionário. Para que isso seja válido, esse método assume que o sinal neuronal no EEG e o artefato não estão correlacionados, que o artefato é relativamente estável durante um intervalo de tempo (janela temporal) escolhido e que se repete periodicamente. (Allen et al., 2000)

Correção do artefato de imagem

média. Por exemplo, o programa BrainVision Analyzer (v.2.0.4, BrainProducts, München, Alemanha) oferece 4 diferentes métodos para estimativa do molde: (i) todos os intervalos; (ii) média deslizante ao longo de um número determinado de intervalos; (iii) um número pré- definido de intervalos iniciais seguidos de intervalos que excedam uma correlação escolhida com o molde inicial; (iv) template drift compensation. (Mulert & Lemieux, 2010)

A respeito dos dois primeiros métodos, por um lado, a qualidade do molde do artefato aumenta quanto maior for o número de janelas porque menos EEG neuronal fará parte do molde, mas, por outro lado, um número muito grande de janelas não irá capturar flutuações temporais no molde (Mulert & Lemieux, 2010). Desse modo, se o número de volumes for grande (maior do que 100 aproximadamente), o método mais adequado é a média móvel, garantindo que o artefato seja aproximadamente o mesmo em todos os intervalos. Quando a correção não é feita em tempo real, pode-se escolher, por exemplo, 21 janelas para o cálculo do molde do artefato: dez intervalos antes do intervalo que se deseja corrigir, dez intervalos depois e a própria janela. A média móvel é essencial para deixar o método AAS mais robusto com relação a variações fisiológicas (no caso do artefato de pulso), movimento da cabeça, alterações nas impedâncias dos eletrodos ao longo do tempo, e flutuações no scanner.

O terceiro método, que somente inclui o intervalo no cálculo do molde se ele estiver acima de um limiar, fornece um molde homogêneo. Um ponto negativo é que intervalos abaixo do limiar de correlação não são considerados, ou seja, não são representados no molde. Se houver pequenos movimentos, todos os intervalos seguintes provavelmente ficarão abaixo do limiar e não serão adicionados no molde. O quarto método será discutido mais abaixo.

A eficácia do AAS pode ser comprometida pelo movimento dos eletrodos, por drift no

scanner, por saturação do sinal devido à faixa dinâmica limitada do sistema de EEG, e pela

relação temporal entre os pontos amostrados pelo EEG e a sequência de RMf. Esta última é a única condição que depende de como é feita a aquisição conjunta de EEG e RMf. Uma imposição do método AAS para a reprodutibilidade do artefato de imagem é a estabilidade da sequência de RMf no tempo e a sincronização entre as aquisições de EEG e RMf. Duas condições precisam ser satisfeitas para obter a sincronia: TR da sequência de RMf deve ser um múltiplo inteiro do intervalo de amostragem do EEG (p. ex., TR = 2 s e frequência de amostragem do EEG = 5 kHz); e os relógios internos de ambos os sistemas devem estar em fase (Mandelkow et al., 2006).

Um problema em escolher o TR da sequência é que o valor efetivo pode ser diferente do valor mostrado no console, em especial devido à precisão no arredondamento. Por isso é necessário conhecer o modelo do scanner e principalmente a versão do software utilizado. Por

exemplo, no sistema Achieva 3 T da Philips (Philips Medical Systems, Best, Holanda) utilizando a versão 1.2.2 do programa de aquisição, quando as fatias são equidistantes no tempo, TR é arredondado para um produto de 0,1 ns (a precisão do relógio do scanner) com o número de fatias. No mesmo sistema, se for habilitada a opção ―dynamic stabilization‖ (recalibração da frequência de Larmor em cada TR para corrigir dinamicamente variações no campo B0), os pré- pulsos não são considerados, e o TR mostrado na verdade é menor do que o tempo efetivo do TR (Mandelkow et al., 2006).

Com relação à condição de ajustar os relógios internos das aquisições de RMf e EEG, um equipamento dedicado precisa ser utilizado. O BrainVision SyncBox é um aparelho disponível comercialmente fabricado pela BrainProducts GmbH como parte de seu sistema de EEG. Ele funciona como um divisor de frequência e sincronizador, pois recebe como entrada um sinal de lógica transistor-transistor (TTL: transistor-transistor logic) vindo do relógio do

scanner (10 MHz no sistema da Philips) e produz um sinal de saída de 5 kHz com o qual o

relógio do EEG é sincronizado. (Mandelkow et al., 2006)

Se isso não for feito e os relógios do EEG e do scanner tiverem velocidades levemente diferentes, uma diferença de fase será acumulada ao longo do tempo. Contudo, no EEG sem sincronização dos relógios, o artefato de imagem residual permanece no espectro do EEG corrigido somente acima de 80 Hz, que é aceitável para a maior parte dos estudos com EEG. Com sincronização, observam-se correções satisfatórias para frequências de até 200 Hz. (Mandelkow et al., 2006)

O problema da falta de sincronização entre os relógios pode ser amenizado através do aumento da alta taxa de amostragem no EEG ou de interpolação por um fator 10-15. No entanto, isso aumenta a quantidade de dados na mesma proporção, tornando essa solução inviável, pois as aquisições costumam ser sempre longas (os dados de um voluntário chegariam a algumas dezenas de gigabytes). Uma alternativa implementada no BrainVision Analyzer 2.0 é chamada de template drift detection, que tenta prever em cada intervalo um padrão de deslocamento temporal do artefato e cria vários moldes (um número adequado é três ou quatro); para aplicar a subtração do molde, cada artefato individual é designado a um molde. Essa opção pode ser utilizada com qualquer um dos três métodos explicados acima (média com todos os intervalos, média deslizante e intervalos acima de um limiar).

O quarto método para cálculo do molde no programa BrainVision Analyzer é chamado de template drift compensation, cujo parâmetro variável é o número de moldes. Um número

cálculo do molde, reduzindo a precisão dos moldes. Essa escolha pode ser feita por inspeção da correção obtida ou com base nos valores e distribuição dos deslocamentos dos moldes.

Para experimentos de EEG-RMf, o método de média deslizante com template drift

detection é suficiente. Na ausência do BrainVision SyncBox, é possível eliminar grande parte

dos artefatos residuais através de um filtro passa-baixa com frequência de corte em torno de 50-80 Hz. (Mulert & Lemieux, 2010)

Correção do artefato de pulso

No caso do artefato de pulso, os intervalos são escolhidos com base no início do ciclo cardíaco, normalmente através de algum pico identificável no ECG registrado simultaneamente, como mostra a Figura 5.7. Para garantir a qualidade do sinal do ECG, aconselha-se colocar o eletrodo na parte inferior das costas, fornecendo uma onda R satisfatória e evitando artefatos de movimento como devido à respiração. O posicionamento do eletrodo de ECG utilizado tradicionalmente na clínica não pode ser aplicado em medidas com ressonância magnética porque os cabos são compridos, gerando riscos ao indivíduo. (Mulert & Lemieux, 2010)

Existem várias condições para que o algoritmo AAS funcione adequadamente na correção do artefato de pulso: a detecção do início do ciclo cardíaco deve ser precisa; a largura do intervalo R-R deve ser suficiente para englobar exatamente o artefato; uma taxa de batimento alta pode fazer com que os artefatos se sobreponham; deve haver baixa correlação entre o estímulo (ou a atividade neuronal de interesse) e o batimento cardíaco; o artefato de pulso deve ser estável no tempo; e o molde do artefato de pulso não pode conter outros artefatos (Mulert & Lemieux, 2010). Por causa da última condição, essa remoção é feita após a correção dos artefatos de imagem.

No programa BrainVision Analyzer, os picos são marcados de maneira semiautomática. Primeiramente um algoritmo busca o molde do artefato nos instantes iniciais do canal escolhido, como mostra a Figura 5.8 (tipicamente nos primeiros 30 s do traçado do ECG, mas se o sinal estiver ruim pode-se escolher outro canal com artefatos cardíacos bem marcados). O molde ―típico‖ é identificado, e os picos característicos são marcados no traçado inteiro. Os parâmetros utilizados são a taxa de batimento cardíaco (p. ex., entre 60 e 100 bpm), limiar de correlação com o molde (p. ex., 0,7) e limites da média da amplitude relativa ao molde (p. ex., entre 0,6 e 1,2). Quando há correspondência de acordo com os critérios de correlação e amplitude entre o intervalo analisado e o molde, ele é marcado em cor verde; quando um candidato é encontrado que não supera ambos os critérios, ele é marcado em vermelho. O usuário pode mover qualquer marcação, criar uma marcação nova ou aceitar as vermelhas.

Nesses três casos, a marcação ficará amarela. As marcações vermelhas são rejeitadas, e as verdes e amarelas, aceitas.

Em seguida, cada pico R é transferido para os canais do EEG adicionando um intervalo de tempo entre o batimento cardíaco e a ocorrência de artefatos no EEG. Ele pode ser selecionado manualmente (tipicamente, um valor entre 0,2 e 0,4 s), ou pode ser computado automaticamente. Para altas taxas de batimento ou taxas variáveis no tempo, o cálculo automático pode não funcionar. Por fim, o método AAS é aplicado através da média deslizante nos intervalos que incluem o pico R.

Figura 5.8: Molde (área cinza) encontrado no canal ECG e picos marcados com a letra R. Eles não são necessariamente a onda R da fisiologia cardíaca, mas essa notação é utilizada por conveniência.