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Abordagem Construtivista

No documento Dissertação de Valdinei Ferreira (páginas 55-58)

1 EDUCAÇÃO FÍSICA, ENSINO MÉDIO E CURRÍCULO: O QUE INDICAM AS

2.3 As abordagens pedagógicas da Educação Física

2.3.2 Abordagem Construtivista

Segundo Coll (1998), a concepção construtivista da aprendizagem e do ensino compreende que é por meio da escola que os alunos acessam os aspectos da cultura essenciais não somente ao seu desenvolvimento cognitivo, como também ao desenvolvimento pessoal em um sentido global, o que inclui o equilíbrio pessoal, a inserção social, as relações motoras e interpessoais.

Essa concepção está relacionada, principalmente, ao pensamento e às pesquisas de Jean Piaget. Goulart (1997) explica:

Piaget tem mostrado que, desde o princípio, a própria criança exerce o controle sobre a obtenção e organização de sua experiência do mundo exterior. Acompanha com os olhos os objetos, seu olhar explora em torno, volta a cabeça; com as mãos, agarra, solta, joga, empurra; explora com os olhos e mãos alternadamente, cheira, leva à boca e prova, etc. [...] O construtivismo piagetiano é essencialmente biológico. A perspectiva lógica de Piaget não é senão o correspondente de sua perspectiva biológica, isto é, o desenvolvimento é visto como um processo de adaptação, que tem como modelo a noção biológica do organismo em interação constante com o meio. [...] A assimilação é a incorporação de um novo objeto ou ideia ao que já é conhecido, ou seja, ao esquema que a criança possui. (GOULART, 1995, p. 16-17).

No que se refere à Educação Física, a Abordagem Construtivista realça a importância do conceito de assimilação, uma vez que o educando, ao praticar qualquer atividade e entrar em contato com elementos novos ou conhecidos, apropria-se, pela assimilação, dessa nova ou inovadora prática.

Observa-se, nessa concepção, o destaque ao desenvolvimento motor dos alunos. Freitag (1993), ao referir-se a Piaget, reitera que, no pensamento construtivista, toda criança tem a potencialidade de julgar, pensar e argumentar:

A novidade que o Construtivismo introduz é que esta faculdade (de fazer uso da razão) não é uma qualidade transmitida no nascimento pelos gens. Não é como a cor dos olhos, o tamanho potencial, o sexo, etc., que seriam predeterminados desde o início. O que Piaget e os pós-piagetianos defendem é que esta faculdade de julgar, pensar, argumentar é uma potencialidade que precisa ser desenvolvida no decorrer da vida. Construtivismo se encaixa nesta lógica. A construção que se dará, o que a criança fará desta faculdade potencial, visa chegar aos patamares mais elevados desta competência: isto é pensar logicamente, julgar o certo e o errado, julgar o belo e o feio e argumentar com outros num esforço de reciprocidade, de transmissão de ideias, de compreensão do que diz o outro. (FREITAG, 1993, p. 28).

A relação dessa ideia da autora com a Educação Física refere-se à concepção de que a criança tem esse potencial guardado em si, bastando a correta orientação para que sua capacidade de julgamento, pensamento e argumentação se consolide. Assim, em uma aula prática de Educação Física, caberia ao professor determinar e orientar o aprendizado de certos movimentos motores que, por sua vez, fariam parte da construção do potencial da criança e, consequentemente, da sua percepção para com o mundo a sua volta.

Duarte (2005), em uma análise crítica ao construtivismo, aponta que este parte da ideia de que a construção do sujeito deve se dar por ele mesmo sem necessariamente ser uma representação da realidade:

Para o construtivismo a aprendizagem seria um processo de construção individual do sujeito e este não copia a realidade, mas a constrói a partir de usas representações internas. A interpretação pessoal rege o processo de conhecer, o qual desenvolve seu significado através da experiência. A aprendizagem é situada e deve dar-se em cenários realistas; o cotidiano do sujeito e ele próprio trazem os conteúdos necessários para que ocorra a aprendizagem. (DUARTE, 2005, p. 50).

Essa experiência identificada pelo autor é algo muito comum vivenciado nas aulas de Educação Física, quando o professor compreende que o processo de aplicação prática ou teórica de conteúdos informativos e formativos depende da interpretação assimilada pelo educando. Nessa concepção, o conhecimento do aluno faz parte da estrutura construtivista anexada por ele em seu saber intelectual. Ao se deparar, por exemplo, com um bastão em uma aula de atletismo, o aluno pode – devidamente orientado – identificar o que fazer com aquele objeto naquele momento: correr, entregar a um companheiro, ficar parado, etc.

Bezerra (2001), em relação à formação do conhecimento na concepção construtivista, explica:

O processo de formação do conhecimento, de acordo com o construtivismo, é resultante de um processo endóguro e exóguro, sendo que a interação sujeito-meio permite a exploração e a construção do conhecimento. É nesse campo que se constitui a autonomia da criança, e o professor deve construir a sua metodologia de trabalho em oposições a heteronomia, permeando sua postura educativa (planejamento, execução e avaliação) em descoberta relacionada à linguagem, regras, jogos, pensamento e raciocínio, classificação e relação, número, causalidade, honestidade, competência, autoridade e obediência, culpa e punição. (BEZERRA, 2001, p. 30).

O principal defensor da Abordagem Construtivista no Brasil, na área da Educação Física é João Batista Freire, apesar de que o próprio autor não aceita este papel. Freire, em seu livro “Educação de corpo inteiro”, lançado em 1989, apresenta o construtivismo como uma proposta metodológica que detinha potencial para se opor às teorias anteriores da disciplina, notadamente a proposta mecanicista, cuja principal característica era a busca pela maximização do desempenho.

Para Freire (1994, p.13), “[...] corpo e mente devem ser entendidos como componentes que integram um único organismo”, fazendo assim uma crítica às práticas escolares da Educação Física que apenas adestram e dificultam a formação e o desenvolvimento do aluno.

Freire e Scaglia (2009, p.7) priorizam o jogo, não somente com o suporte de Educação Física, mas de todas as disciplinas, defendendo que “[...] o ambiente lúdico, além de facilitar o

ensino de diversos conteúdos, cria condições para que o aluno trabalhe com a criatividade, a moralidade e a sociabilidade.”

A produção de João Batista Freire é classificada por Daólio (1998, p.48) como uma vertente da pedagogia humanista, uma vez que o seu foco principal é a individualidade, criatividade e liberdade individual na infância, propondo “[...] uma redescoberta do corpo, na qual a educação física é o carro chefe de uma educação conscientizadora.”

Para Freire (1994), na abordagem construtivista

A Psicologia Infantil e depois a Psicomotricidade dedicaram parte de seus trabalhos à descrição dos movimentos que as crianças realizam ao longo de seu desenvolvimento, muitas vezes, contudo, desconsiderando aspectos fundamentais desse desenvolvimento, como o cultural e o social. [...] o que quero dizer é que não acredito na existência de padrões de movimento, pois, para tanto, teria que acreditar também na padronização do mundo. Constato, isso sim, a manifestação de esquemas motores, isto é, de organização de movimentos construídos pelos sujeitos, em cada situação, construções essas que dependem, tanto dos recursos biológicos e psicológicos de cada pessoa, quanto das condições do meio ambiente em que ela vive. (FREIRE, 1994, p. 21-22).

O autor considera, assim, que é importante não somente se ater à questão dos movimentos corporais ou a maturidade do aluno, mas à bagagem de movimentos já construídos e em construção pela criança, ou seja, ao que o indivíduo carrega consigo. Defende, portanto, a superação, na prática docente em Educação Física, da ênfase em exercícios motores simples ou complexos, que supostamente avançariam no esquema do conjunto corporal de gestos finos, aqueles realizados com maior destreza e considerados corretos. Nessa concepção, o professor deveria dar subsídios aos movimentos já constituídos pelos alunos, aumentando a gama de gestos motores.

No documento Dissertação de Valdinei Ferreira (páginas 55-58)