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ABORDAGEM ESTRUTURAL E A TEORIA DO NÚCLEO CENTRAL

3. A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

3.1 ABORDAGEM ESTRUTURAL E A TEORIA DO NÚCLEO CENTRAL

A teoria do núcleo central das representações sociais foi proposta em 1976 por Jean-Claude Abric por meio de sua tese Jeux, conflit et représentations sociales na Université de Provence. Sua hipótese central diz respeito à organização interna das representações e está destacada por Sá (1996) nos termos que se seguem:

A organização de uma representação apresenta uma característica particular: não apenas os elementos da representação são hierarquizados, mas além disso toda representação é organizada em torno de um núcleo central, constituído de um ou de alguns elementos que dão à representação o seu significado (ABRIC, 1994a apud SÁ, 1996, p.62)

Segundo Almeida (2005) a teoria indica que toda representação está organizada em torno de um núcleo, um elemento fundante, composto por “um ou mais elementos, mais estáveis, coerentes, consensuais, e historicamente definidos” (ALMEIDA, 2005, p.132).

O núcleo central de uma representação é determinado pela natureza do objeto representado, pelo tipo de relações que o grupo tem com o objeto e pelos valores e normas sociais atuantes no ambiente ideológico do momento e do grupo (ABRIC, 1998). São duas as funções fundamentais do núcleo central: a) função geradora: promotora de criação e transformação de significados das representações; b) função organizadora: unificadora e estabilizadora da representação através do núcleo central.

Sua propriedade de configurar-se como elemento mais estável é que assegura a continuidade da representação em contextos móveis e evolutivos. São os elementos do núcleo central que mais resistem às mudanças sociais. “De fato, toda modificação do núcleo central provoca uma transformação completa da representação” (ABRIC, 1998, p.31). Núcleos centrais organizados de forma diferente configuram representações diferentes.

A presença de um núcleo estruturante de uma representação implica a presença de elementos periféricos a ele associados. Em torno do núcleo, então, organizam- se os elementos periféricos, essenciais ao conteúdo das representações por ocasião dos seus componentes mais acessíveis, mais vivos e mais concretos. São elementos menos estáveis que permitem variações ou modulações individuais. São resultado da ancoragem de uma representação, projetando-se como face compreensível e transmissível da representação.

Os elementos periféricos são mais susceptíveis às adaptações necessárias às evoluções do contexto social, pois as informações novas ou as transformações ambientais podem ser por eles assimiladas. Os elementos periféricos, portanto, constituem o aspecto móvel e evolutivo de uma representação.

Dado que a mudança do núcleo central modificaria por completo a representação, são os elementos periféricos que têm a função de defesa da representação. Estes elementos admitem novas interpretações, ponderações e mesmo contradições possibilitando a evolução da representação, defendendo-a de sua completa desestruturação.

O duplo sistema de representação, composto por um sistema central, de determinação essencialmente social, e um sistema periférico, cuja determinação é mais individualizada e contextualizada, permite entender a natureza contraditória da representação de ser, concomitantemente, estável e móvel, rígida e flexível.

Sá (1996) relaciona os principais métodos para a “colocação em evidência das propriedades de saliência e de conexidade dos diferentes elementos da representação” (p.115). São eles: a hierarquização de itens; a indução por cenário ambíguo; a evocação ou associação livre de palavras.

O método de hierarquização dos itens consiste em solicitar aos sujeitos que escolham numa lista pré-estabelecida, os itens mais importantes ou característicos do objeto de representação (SÁ, 1996). Apresenta como principais variantes as triagens hierarquizadas sucessivas que consistem em produzir uma listagem com muitos elementos (32 em geral) em uma tarefa de evocação livre e subdivididos sucessivamente em grupos de elementos mais e menos característicos ou representativos do objeto (SÁ, 1996); e escolhas sucessivas por bloco que permitem evidenciar relações de similitude no interior da representação e relações de antagonismo ou exclusão. O procedimento consiste numa série de escolhas por blocos de itens, atribuindo às escolhas escores positivos e negativos.

O método de indução por cenário ambíguo envolve hipóteses sobre a participação de elementos no núcleo central e a identificação em definitivo da composição do núcleo. O método consiste em constituir um grupo de participantes que são incumbidos de produzir um texto sobre certo objeto e, com os textos, é elaborada

uma lista de itens que vão proporcionar a criação de um cenário ambíguo onde o objeto não é explicitado aos sujeitos. Posteriormente são analisados os cenários em relação às representações antes apreendidas (SÁ, 1996).

A associação ou evocação livre consiste em pedir aos sujeitos que indiquem palavras ou expressões que lhes venham à lembrança imediatamente a partir de um termo indutor apresentado pelo pesquisador (SÁ, 1996). Esse método possibilita, segundo Abric (1994a) citado por Sá (1996, p.116) “criar um conjunto de categorias, organizadas em torno destes termos, para assim confirmar as indicações sobre seu papel organizador das representações”. É a partir da combinação dos critérios de frequência de evocação e ordem média de evocação de cada palavra que se torna possível levantar quais são os elementos que pertencem ao núcleo central. Esse procedimento resulta um quadro composto de quatro quadrantes no qual os elementos são organizados segundo graus de centralidade. O quadrante superior esquerdo envolve os elementos mais suscetíveis a pertencerem ao núcleo central da representação, pois são os mais frequentes e mais prontamente evocados.

Este último, a associação ou evocação livre, foi o método escolhido para a realização desta pesquisa. Objetivamos com esse método encontrar os elementos centrais das representações de objetos que, em nossa sociedade atual e em especial nos meios de comunicação de massa, estão demasiadamente associados, a violência e a pobreza. Os demais procedimentos metodológicos envolvidos na realização da pesquisa acerca das representações sociais de lugar

pobre, lugar violento e do filme Cidade de Deus – interlocutor imagético dos objetos primeiros – são descritos na sequência.