• Nenhum resultado encontrado

Abordagem Metodológica e Procedimento de Coleta de Dados

No documento V ELHICE: A DUPLA ESTIGMATIZAÇÃO (páginas 114-118)

PESQUISA DE CAMPO

1. Abordagem Metodológica e Procedimento de Coleta de Dados

Quando iniciamos um trabalho de pesquisa nos deparamos com um dilema: qual caminhos escolher para atingir os objetivos propostos? Quando iniciei esta investigação a preocupação em construir um trabalho pautado em uma análise que levasse em consideração a diversidade dos sujeitos e os considerasse como seres singulares, ainda que compartilhassem uma categoria mais geral: a orientação homossexual.

Cada pesquisa exige a adoção de uma abordagem metodológica específica; na investigação realizada optamos pela abordagem metodológica qualitativa. Entendemos que esta abordagem é a mais adequada para a compreensão do binômio “velhice e homossexualidade”, na medida em permite que os sujeitos exponham mais e melhor suas idéias e visões de mundo.

Tratando-se de uma pesquisa que se debruça sobre o envelhecimento de homossexuais masculinos e seus dilemas, as dificuldades são diversas. Dificuldades relacionadas ao que denominamos de dupla estigmatização: gênero e idade. Sendo assim, a abordagem qualitativa nos pareceu mais adequada, pois busca não a quantificação dos dados, mas a compreensão dos significados que as pessoas dão para suas vidas e, ao mesmo tempo, como analisam sua condição de idosos.

Enfim, a opção metodológica resultou da consideração do fato de que ela contempla envolves aspectos que envolvem sentimentos, atitudes, desejos, e aspirações; aspectos relacionados a significados e intencionalidades. Além disto, as abordagens qualitativas propiciam uma relação de troca – direta, face a face – entre sujeito e pesquisador.

Por outro lado, dos vários procedimentos de coleta de dados próprios das abordagens qualitativas (a exemplo de entrevistas, grupos focais, histórias de vida etc.), a opção feita foi pela entrevista individual em profundidade.

Segundo Minayo,

Ao lado da observação participante, a entrevista – tomada no sentido amplo de comunicação verbal, e no sentido restrito de colheita de informações sobre determinado tema científico – é a técnica mais usada no processo de trabalho de campo. (2000, p. 107)

Remetendo-se a Kahn & Cannell, Minayo lembra que a entrevista constitui uma

Conversa a dois, feita por iniciativa do entrevistados, destinada a fornecer informações pertinentes para um objeto de pesquisa, e entrada (pelo entrevistados) em temas igualmente pertinentes com vistas a este objetivo.

(2000, p. 108)

Como afirma Gaskell,

A compreensão dos mundos da vida dos entrevistados e de grupos sociais especificados é a condição sine qua

non da entrevista qualitativa. Tal compreensão poderá contribuir para um número de diferentes empenhos na pesquisa. Poderá ser um fim em si mesmo o fornecimento de uma “descrição detalhada” de um meio social específico; pode também ser empregada como uma base para construir um referencial para pesquisas futuras e fornecer dados para testar expectativas e hipóteses desenvolvidas fora de uma perspectiva teórica específica. (2002, p. 65)

Para o mesmo autor,

O emprego da entrevista qualitativa para mapear e

compreender o mundo da vida dos respondentes é o ponto central para o cientista social que introduz, então, esquemas interpretativos para compreender as narrativas dos atores em termos mais conceituais e abstratos [...]. (2002, p. 65)

Uma das características da entrevista em profundidade é a ausência de um roteiro pré-estabelecido. O que temos é um tema que é explorado junto aos entrevistados, sem que ele seja claramente expresso ao longo dos encontros. Com isto, a entrevista parte do que se convencionou chamar de “questão detonadora” (“quem é você?”) e, no seu transcorrer, estimula os sujeitos a falarem mais sobre cada tópico levantado. No horizonte, o que temos é nosso problema central (a velhice entre homossexuais); problema que deve aparecer nas falas dos sujeitos. Caso não apareça, ela deve ser introduzida em algum momento da entrevista (normalmente, quando o sujeito se aproxima do tema). O fato de a indagação central não ser formulada faz com que, muitas vezes, seja necessário, mais de um encontro.

Diversamente das pesquisas quantitativas, não foi feita qualquer “amostragem” dos sujeitos. Isto porque, retomando Gaskell,

A amostragem carrega, inevitavelmente, conotações dos levantamentos e pesquisa de opinião onde, a partir de uma amostra estatística sistemática da população, os resultados podem ser generalizados dentro de limites específicos de confiabilidade. (2002, p. 67)

Os sujeitos foram selecionados a partir de nossa familiaridade com a realidade a ser investigada. A única condição para a seleção foi os sujeitos terem 60 anos ou mais de idade e se auto-definirem homossexuais.

Sabemos que nem todos os homossexuais partilham as mesmas opiniões sobre a velhice. Frente a isto, consideramos que o número de entrevistas deveria ser tal que permitisse cobrir diversas (certamente não todas) formas de viver a velhice na homossexualidade. Afinal, nossa finalidade

Não [foi] contar opiniões ou pessoas, mas ao contrário, explorar o espectro de opiniões, as diferentes representações sobre o assunto em questão. Em um meio social específico [...], o que nós estamos interessados em descobrir é a variedade de pontos de vista no assunto em questão [...] e, especificamente, o que fundamenta e justifica estes pontos de vista.

(Gaskell:, 2002, p.68)

Considerando a heterogeneidade da categoria, obtivemos uma variedade de informações, de diferentes sujeitos de condições sócio- econômicas diversas (renda, escolaridade, ocupação etc.). Foram entrevistados sete sujeitos de diferentes idades.

Os encontros foram gravados (com a permissão do entrevistado) posteriormente foram transcrito; ao iniciar as entrevistas os sujeitos receberam informações gerais sobre o trabalho e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo I).

recurso a fontes secundárias; fontes representadas por referências

bibliográficas e consultas a jornais, revistas especializadas39 e Internet. A

localização de referências bibliográficas – igualmente consideradas fontes secundárias – foi fundamental para a contextualização do tema.

Autores radicados nas ciências sociais, especialmente na antropologia e na sociologia, ao lado de outros situados na gerontologia, enquanto ciência social aplicada, forneceram os pilares para a exploração do binômio “velhice/homossexualidade masculina”, tema deste trabalho.

Buscamos, também, o apoio em alguns dados quantitativos sobre a

dinâmica populacional e a atual transição demográfica40, representada pelo

estreitamento da base da “pirâmide” e alargamento de seu ápice41, com o

aumento da participação dos idosos na população total.

Os dados obtidos nas entrevistas foram analisados a partir das referências teóricas apreendidas como significativas; a partir da análise dos discursos, buscamos compreender um dos temas mais recorrentes na vida dos sujeitos e como lidam com ele. Cabe sublinhar que não foi nossa intenção, em momento algum, generalizar as conclusões a que chegamos. No entanto, acreditamos que muito do que nos chegou através dos seis sujeitos é mais geral do que podemos imaginar. Assim, não procuramos enxergar o céu através de um grão de areia.

No documento V ELHICE: A DUPLA ESTIGMATIZAÇÃO (páginas 114-118)