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4 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

4.3 O período entre 1975 e 2010

4.3.4 Acumulação de Competências Tecnológicas entre 1975 e 2010

O período entre 1975 e 2010 é marcado pela realização de diversos processos de aprendizagem, que ocorreram de forma simultânea à introdução de inovações tecnológicas pela empresa. Estes processos permitiram a acumulação de competências tecnológicas desde o início da operação comercial. No período anterior, constatou-se que o Metrô de SP adquiriu competências tecnológicas rotineiras nas três funções técnicas analisadas. Dado o curto intervalo de tempo do período anterior (seis anos) e a inexistência de uma base de conhecimento nacional, observa-se que este processo de acumulação de competências ocorreu de forma bastante rápida. Contudo, foi a partir da implantação da Linha Azul que a empresa iniciou um processo de acumulação de competências tecnológicas inovadoras.

O quadro a seguir apresenta a trajetória de acumulação destas competências, ocorrida a partir de 1975, em relação às funções técnicas Gestão de Operação e Gestão de Manutenção.

Quadro 27: Competências em Operação e Manutenção: entre 1975 e 2010. Fonte: Elaborado pelo Autor.

O quadro anterior permite constatar que o Metrô de SP acumulou, ao longo de sua história, o nível médio-alto de competências tecnológicas para estas funções. A empresa também atingiu este patamar para a função técnica Concepção e Gestão de Projetos, como mostra o quadro a seguir.

Quadro 28: Competências em Concepção e Gestão de Projetos: entre 1975 e 2010. Fonte: Elaborado pelo Autor.

O capítulo seguinte apresenta a análise e discussão dos resultados, com o intuito de responder à questão de pesquisa e atender aos objetivos definidos nesta dissertação.

5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS

Os aspectos referentes ao processo de transferência tecnológica, descritos no referencial teórico desta dissertação, puderam ser observados ao longo deste estudo de caso. Primeiramente, observa-se a importância do esforço governamental para viabilizar a implantação do metrô na cidade de São Paulo. Os esforços do governo municipal e, posteriormente, do estadual foram fundamentais para o surgimento do Metrô de SP, tanto em relação à busca de recursos para viabilizar o empreendimento, quanto, principalmente, por determinar sua orientação estratégica, voltada à obtenção de domínio tecnológico e consolidação de um setor até então inexistente no país. O caso estudado mostra um exemplo da busca de empresas de países em desenvolvimento por assimilação e adaptação de tecnologias do exterior às condições locais, por meio de esforços relacionados à aprendizagem, conforme os trabalhos de Lall (1992, 2000) e Katz (2000).

Para viabilizar a implantação do Metrô de SP, foi necessária uma primeira etapa de transferência de tecnologia proveniente de países como Estados Unidos e Alemanha. Entretanto, por manter o foco em aprendizagem desde o início, esta transferência não se limitou à aquisição de sistemas e equipamentos, mas também a um volume intenso de aprendizagem sobre estas tecnologias, por meio de estágios e visitas técnicas, além do apoio técnico do consórcio HMD na elaboração e execução do projeto de implantação da primeira linha. Como ressalta Lall (1992), a intensidade de esforços empregados por países em desenvolvimento consiste em um fator de diferenciação em relação ao grau de acumulação de competências tecnológicas. Isto foi claramente evidenciado no caso do Metrô de SP, principalmente quando se compara o modelo de desenvolvimento tecnológico adotado pela empresa com as estratégias de outros metrôs, pautadas na simples aquisição de pacotes prontos de implantação, manutenção e operação. Caso optasse por um modelo como este, o Metrô de SP não teria experimentado tantos processos de aprendizagem e, consequentemente, não teria acumulado competências tecnológicas necessárias para promover inovações.

A partir da década de 60, ocorreu um processo de substituição de importações nos países da América Latina (KATZ, 2000). O Metrô de SP também adotou esta estratégia, já apresentando, na implantação de suas primeiras linhas, índices cada vez mais altos de nacionalização de projetos, equipamentos e sistemas. Dois exemplos foram abordados no capítulo de apresentação de resultados. Primeiramente, a aquisição do sistema de sinalização e controle para a linha Azul junto à empresa americana Westinghouse, efetuado no período pré-operação. A implantação deste sistema envolveu o treinamento de profissionais do Metrô de SP nesta tecnologia e a elaboração de documentação técnica, que serviu de base para a multiplicação deste conhecimento pela empresa. Posteriormente, com a implantação da linha Vermelha, o conhecimento acumulado pelo Metrô de SP permitiu sua participação em um grupo formado por instituições nacionais e internacionais, que acarretou o desenvolvimento de um sistema com tecnologia de microprocessamento e superior em relação à primeira linha. Outro exemplo de transferência tecnológica bem sucedida refere-se à assimilação de tecnologia externa e fabricação de trens no país pela empresa Mafersa, comprovando que não apenas o Metrô de SP, mas todo o segmento metroviário nacional acumulava competências tecnológicas.

Desta forma, ao longo de sua história, o Metrô de SP apresentou uma trajetória de acumulação de competências tecnológicas, descrita na tabela abaixo.

Tabela 13: Trajetória de acumulação de competências tecnológicas no Metrô de SP. Fonte: Elaborado pelo Autor.

Basicamente, esta trajetória caracterizou-se por um primeiro momento, que vai desde a sua fundação até a implantação da primeira linha, onde a empresa adquiriu competências tecnológicas rotineiras nas três funções técnicas analisadas. A rapidez com que ela atingiu este nível deveu-se à intensidade com que experimentou os processos de aprendizagem no período. Em um segundo momento, a empresa buscou sedimentar e atualizar a base de conhecimento e experiências adquiridas, mantendo seu foco em aprendizagem e promovendo a introdução de inovações em suas linhas. O conceito de capacidade absortiva definido por Cohen e Levinthal (1990) foi observado ao longo de todo o estudo de caso. Com grande esforço voltado à realização de treinamentos e intercâmbios tecnológicos com universidades e outras empresas, o Metrô de SP conseguiu identificar, assimilar e adaptar novas tecnologias à medida que efetuava a expansão de sua rede. Isto pode ser evidenciado tanto pela implantação da linha Verde, em 1991, quanto pela adoção de tecnologias como o CBTC, na década seguinte. A introdução destas tecnologias foi liderada pelos próprios profissionais do Metrô de SP, que já acumulavam ampla base de experiência.

Os mecanismos de aprendizagem descritos por Fleury e Fleury (1997) puderam ser observados ao longo da história da empresa. Além do emprego do learning by doing, presente nos treinamentos práticos promovidos pela empresa aos seus funcionários, os mecanismos learning by changing foram amplamente utilizados, sendo evidenciados na introdução de novas tecnologias na construção de cada linha da rede. Como exemplo, podemos destacar a modernização do CCO, que trouxe uma nova configuração de sistemas, voltada a uma maior integração e a introdução da tecnologia tração por corrente alternada, adotada nos trens da linha Verde. O contato com estas novas tecnologias por meio de prospecção, testes de aceitação, elaboração da documentação técnica e treinamentos internos proporcionou experiências de aprendizagem fundamentais para a gestão da operação em patamares tecnológicos mais elevados.

O mecanismo learning by training foi praticado pela empresa desde a sua fundação, por meio de treinamentos dos profissionais da empresa realizados em fornecedores, outros metrôs e aqueles desenvolvidos internamente. Outro mecanismo descrito por Fleury e Fleury (1997), denominado learning by hiring foi observado nos dois períodos analisados, ocorrendo em maior intensidade na fase pré-operação, onde proporcionou a contratação de profissionais para a formação de suas primeiras equipes técnicas. A contratação de profissionais do setor de aviação agregou experiência em relação a conceitos de segurança e gestão de tráfego em modais de transporte.

Por fim, dada a crescente capacidade absortiva observada durante as décadas de existência da empresa, o mecanismo learning by learning, descrito por Queiroz (2006), esteve presente, principalmente após a implantação da primeira linha, por meio de sua liderança no desenvolvimento de projetos e na elaboração de especificações técnicas, à medida que a empresa absorvia novas tecnologias.

Este mecanismo de aprendizagem foi intensamente aplicado por meio de esforços intensos de multiplicação de conhecimento promovidos pela empresa, com base nos conceitos relacionados à espiral de conhecimento de Nonaka e Takeuchi (1997). No primeiro período analisado, os estágios e visitas realizados pelos profissionais do Metrô de SP no exterior possibilitaram assimilar e compartilhar experiências, por meio de um processo de socialização de conhecimento. Com a documentação deste conhecimento, por meio de procedimentos e manuais de operação desenvolvidos por estes profissionais, houve uma codificação do conhecimento. Os treinamentos realizados posteriormente com base nesta documentação representaram um processo de codificação. Finalmente, a formação de equipes para assimilar e promover adaptações às tecnologias adotadas neste período representou uma internalização de conhecimento, gerando novos conhecimentos tácitos.

Após a implantação da primeira linha, evidencia-se um processo mais intenso de multiplicação de conhecimentos, conforme conceitos de Nonaka e Takeuchi (1997). Por meio das iniciativas de prospecção de novas tecnologias, como o CBTC, configurou-se uma fase de socialização de conhecimento. A documentação técnica, obtida com base nestas iniciativas, promoveu a transformação de conhecimento tácito em explícito, em relação a esta nova tecnologia. Assim, as reuniões realizadas pelas equipes técnicas para o entendimento destas documentações e a elaboração de especificações técnicas para sua aquisição associa-se às etapas finais do conceito de espiral do conhecimento estabelecido pelos autores.