• Nenhum resultado encontrado

37 Adicionalmente às características da doença e do seu tratamento, há uma panóplia de factores que

estão associados à interrupção do tratamento da tuberculose que, em alguns grupos de risco, chega a atingir os 90% (Hornick, 2008).

A OMS identifica, no seu documento Adherence to Long-Term Therapy (WHO, 2003), alguns factores com potencial impacte na adesão à terapêutica: factores económicos e estruturais – situação de sem-abrigo (Pablos-Méndez et al., 1997; R. Diel e S. Niemann citados por Faustini ; Hall ; Perucci, 2005), desemprego (Mishra et al., 2005; E. Sumartojo, K. Brudney e J. Dobkin e X. Ferrer e colegas e R. Crespo e colegas citados por Pablos-Méndez et al., 1997) e pobreza (Mishra et al., 2005; Albuquerque et al., 2007), escassez de redes de suporte social e circunstâncias de vida instáveis; factores relacionados com o doente - raça, género masculino (T.S. van der Werf e Chuah S.Y. citados por Mishra et al., 2005; Lienhardt et al., 1998) e idade avançada (T.S. van der Werf citado por Mishra et al., 2005), menores conhecimentos acerca da tuberculose (M. Demissie e D. Kebede citados por Mishra et al., 2005), crença na eficácia dos medicamentos, alteração do estado mental relacionado com o abuso de substâncias (Pablos-Méndez et al., 1997; R. Diel e S. Niemann citados por Faustini ; Hall ; Perucci, 2005; Albuquerque et al., 2001), depressão e stresse psicológico; a complexidade do regime terapêutico - número de comprimidos, efeitos secundários associados à sua toma; a relação entre o doente e o profissional de saúde (Farah, 2005); o padrão de cuidados - a organização dos serviços de saúde, incluindo, a disponibilidade de especialistas, grupos de doentes e flexibilidade de horário.

A representação mental que o doente tem dos profissionais de saúde e que estes têm do doente apresenta-se como um potencial determinante do resultado terapêutico. A falta de comunicação entre o doente e os profissionais de saúde (Farah, 2005), a identificação do doente com o médico e a equipa de saúde (Fox Walace citado por Ribeiro et al., 2000), bem como as atitudes dos profissionais de saúde (E. Johansson e colegas citados por Okanurak ; Kitayaporn ; Akarasewi, 2008) foram identificados como factores possivelmente associados a resultados terapêuticos de insucesso.

A estratégia DOTS poderá ter efeitos contraditórios no que se refere à relação estabelecida entre o doente e os profissionais de saúde. Frieden (2005) refere que o desenvolvimento de ligações pessoais no processo de tratamento de um doente com tuberculose, para além de demonstrar reconhecimento das responsabilidades da comunidade no tratamento com sucesso da tuberculose, demonstra o respeito pela dignidade dos doentes e fortalece as ligações da sociedade como um todo. Por outro lado, muitos doentes sentem a sua privacidade e dignidade ameaçadas quando se

| 38 vêem obrigados a cumprir tomas observadas de medicação (Storla ; Yimer ; Bjune, 2008) o que frequentemente condiciona a continuidade do tratamento.

E. Jaramillo, no seu relatório sobre o controlo da tuberculose, e Khan e colegas, citados por Fatiregun, Ojo e Bamgboye (2009), consideram a não adesão à terapêutica, entre outros resultados terapêuticos de insucesso, associada a lacunas na educação dos doentes relativamente ao tratamento da tuberculose. Santha (2002) cita dois estudos, conduzidos na Índia e no Malawi, nos quais se conclui que os doentes que completaram o tratamento da tuberculose apresentavam maior conhecimento sobre o tratamento, do que os doentes que interromperam o tratamento. Por seu lado, Greene (2004), cita dois estudos que constatam que a pobreza e a discriminação podem afectar a literacia e a educação e alterar a priorização das necessidades e a capacidade de adesão ao tratamento.

O conhecimento que os doentes possuem sobre a tuberculose e seus tratamentos e, de forma mais abrangente, a literacia em saúde dos doentes, influencia as suas atitudes e comportamentos. Para que se obtenha um resultado de sucesso terapêutico, é da maior importância que seja dada ao doente a possibilidade de participar activamente no seu processo de cura. Para tal, deverão ser discutidos com o doente os motivos que levaram à doença e o seu prognóstico, os tratamentos disponíveis, a posologia, duração do tratamento e modo de administração e os potenciais efeitos adversos dos fármacos antituberculosos, por forma a empoderar o doente no sentido de este contribuir para um resultado terapêutico de sucesso.

Para além dos autores já acima referidos, também Fatiregun, Ojo e Bamgboye (2009), observaram, num estudo prospectivo desenvolvido numa cidade da Nigéria, que os doentes do género masculino apresentavam um risco acrescido de um resultado terapêutico desfavorável, em comparação com os doentes do género feminino. Este achado é consistente com os resultados obtidos no estudo de Lienhardt e colegas, em 1998, no qual se observou que as mulheres tinham uma maior probabilidade de cura do que os doentes do género masculino. Também R. Diel e S. Niemann, citados por Fatiregun, Ojo e Bamgboye (2009), atribuem resultados terapêuticos desfavoráveis, como falha terapêutica, interrupção do tratamento e morte, aos doentes do género masculino. Okanurak, Kitayaporn e Akarasewi (2008) referem que a observação desta associação em vários estudos, pode reflectir o comportamento das mulheres relativamente à sua saúde.

Num estudo de caso-controlo desenvolvido por Ai e colegas (2010), numa Província da China, a iliteracia, a presença de co-morbilidades e a interrupção do tratamento, foram alguns dos factores de

| 39 risco associados à não cura na análise multivariada, tendo, a interrupção do tratamento e a presença de co-morbilidades, sido identificados como os mais importantes factores de risco neste estudo (Ai et al., 2010).

No que se refere a co-morbilidades, a diabetes mellitus, para além de conferir aos doentes um risco relativo cerca de 5 vezes superior de desenvolver tuberculose pulmonar, induz uma maior susceptibilidade de apresentações mais agressivas de tuberculose. Este facto parece estar associado a uma maior dificuldade em alcançar concentrações adequadas dos fármacos antituberculosos nos tecidos, devido à hiperglicémia e a uma deficiência na absorção gastro-intestinal dos fármacos antituberculosos, características dos doentes diabéticos (Pablos-Méndez et al., 1997).

M. A. Espinal e colegas e J. F. Broekmans e colegas, citados por Ferrara e colegas (2005), referem que a não adesão ao tratamento é um dos mais importantes determinantes para a re-activação da tuberculose e para o desenvolvimento de resistência aos fármacos antituberculosos (Manissero et al., 2010).

Numa revisão sistemática de 26 estudos conduzidos na Europa, Faustini, Hall e Perucci (2005) verificaram uma associação inversa dos níveis de tuberculose multirresistente com o sucesso terapêutico e constataram que uma proporção >9% de tuberculose multirresistente representa uma importante e significativa redução nos resultados de sucesso. Os autores sugerem, no entanto, que tais resultados carecem de melhor confirmação.

Também as características dos serviços de saúde poderão estar relacionadas com o resultado terapêutico. O atraso no diagnóstico, a título de exemplo, pode estar associado a factores individuais do doente, como sejam o estigma, a pobreza, o desconhecimento da doença, mas também a características do sistema de saúde, como sejam a falta de meios de diagnóstico efectivos e de profissionais de saúde treinados para identificar a tuberculose, considerando a natureza inespecífica dos sintomas, a acessibilidade dos serviços de saúde, a sobrelotação dos serviços de saúde. O atraso no diagnóstico condiciona significativamente, não apenas o prognóstico da doença, mas também a taxa de transmissão da tuberculose na comunidade. Madebo e colegas, citados por Sorla, Yimer e Bjune (2008), sugerem que os casos se tornam mais contagiosos à medida que o atraso no diagnóstico aumenta e que os maiores atrasos estão associados a uma maior concentração de bacilos nas baciloscopias dos doentes. Estes autores referem que a maioria dos estudos em países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento notificaram um atraso no diagnóstico de cerca de 60 a 90 dias, o que contribuirá para os valores de taxas de sucesso terapêutico obtidos. Também a

| 40