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Administração: o sentido da técnica e da ciência na visão de Habermas

No documento 2008FernandoBencke (páginas 38-41)

CAPÍTULO I RAZÃO E RACIONALIDADE: IMPLICAÇÕES SOBRE A FORMAÇÃO

1.4 Administração: o sentido da técnica e da ciência na visão de Habermas

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Nos referenciais construídos no ensino da Administração no Brasil, nas bases teóricas dos pioneiros em administração Taylor e Ford, os modelos de produção seguem métodos científicos com objetivo de promover e estabelecer, conforme Taylor (Apud Chiavenato 2000), processos padronizados que permitem o controle das operações dos processos de produção; treinamento científico aos empregados para aperfeiçoar as aptidões, executando as tarefas eficientemente; e ainda, aos empregados, cabe ser cientificamente colocados em seus postos com materiais e condições de trabalho adequadas para que as normas sejam cumpridas.

O aperfeiçoamento e desenvolvimento da técnica se situam numa ação controlada prioritariamente pelo êxito, sob decisão racional de ação instrumental, o que não deixa de ser positivo no âmbito da organização do trabalho com objetivos de atingir resultados melhores. À ciência, embora, sob uma reflexão filosófica e sociológica sobre o trabalho, conforme Mühl (2003) se reduz a um mero instrumento de coleta e classificação dos fatos, não havendo

nenhuma preocupação em relação à dimensão histórica dos fenômenos, às contradições e às mudanças do processo e às questões relativas à interação entre poder, conhecimento e valores. A administração, utilizando-se de métodos da ciência apresenta um caráter ideológico de dúvida e incerteza, pois justificam as técnicas e procedimentos administrativos como válidos, intervindo cada vez mais no contexto sociocultural, destituindo a capacidade de integração da sociedade. Quer dizer, ao mesmo que a ciência e a tecnologia promovem mudanças significativas em nosso modo de viver, ela altera também relações interperssoais de trabalho e interação.

Habermas em sua obra “Técnica e ciência como ideologia” 11, identifica, como um diagnóstico da modernidade, a técnica e a ciência como principais instrumentos de manipulação ideológica. Assim, destaca o autor:

Na modernidade, toda a racionalidade foi submetida aos ditames da racionalidade instrumental, cuja expressão teórica suprema é a própria ciência moderna, o que, entendida positivamente, troca toda a aspiração do conhecimento do mundo pela sua utilização técnica. (MÜHL 2003, p. 136).

Os tipos de racionalidades presentes no mundo da administração, na ação do empresário capitalista, do trabalhador rural e conseqüentemente no processo de industrialização, na atividade econômica capitalista e na dominação burocrática, leva Max Weber a introduzir um conceito de racionalização, que conforme Habermas (1997, p. 45): “significa em primeiro lugar, a ampliação das esferas sociais, que ficam submetidas aos critérios da decisão racional”. A ação instrumental com fins orientados unicamente ao êxito, correspondida pela industrialização do trabalho social penetram em âmbitos culturais e da vida, que por sua vez, garantem a melhoria e ampliação dos próprios interesses instrumentais. A racionalização da sociedade passa a depender da institucionalização do progresso cientifico e técnico. Conforme Habermas (1997, p. 45) , “na medida que a técnica e a ciência pervadem as esferas institucionais da sociedade e transformam assim as próprias instituições, desmoronam-se as antigas legitimações”.

A ciência e a técnica são identificadas por Habermas como instrumentos de dominação e manipulação ideológica. Uma racionalidade voltada às escolhas estratégicas e adequada utilização da técnica e da ciência para obter resultados onerosos implica a

dominação sobre a natureza e sobre a sociedade. Racionalidade da dominação com fins a manter o sistema, as forças produtivas e o progresso técnico cientifico se convertem numa forma de legitimação. À medida que aumentam sua eficiência, neutralizam qualquer possibilidade de crítica, se reduzindo às regras da ação controlada pelo êxito. Conforme Mühl (2003, p. 95). “à medida que esse tipo de racionalidade se estende como padrão de cientificidade, o conhecimento científico passa a assumir a função de legitimador das precedentes ideologias dominantes”.

A ciência ou métodos científicos leva à dominação eficiente dos homens sobre os homens através da natureza, impossibilitando o homem de ser autonômico e de determinar pessoalmente a sua vida. A perda da liberdade se sujeita ao aparelho técnico, ampliando a comodidade da vida e intensificando a produtividade do trabalho. Habermas (1997, p. 49), destaca que: “a racionalidade tecnológica protege assim a legalidade da dominação em vez de a eliminar e o horizonte instrumentalista da razão abre-se a uma sociedade totalitária de base racional”. Assim, as racionalidades técnicas e científicas que deveriam proteger o ser humano da dominação instrumental, se tornam as principais motivadoras para alcance do êxito do mundo da administração.

As atividades da administração caracterizam-se principalmente pelo desenvolvimento e aprimoramento das habilidades técnicas e sua utilização em busca da eficiência e maximização dos lucros. Nesse processo há o isolamento dos interesses das necessidades coletivas, pois no processo produtivo o indivíduo é visto como uno, sendo atribuído atividades específicas, tornando assim a ciência um recurso de manipulação da opinião pública, não percebida por todos. Conforme Mühl (2006), a adequada estrutura administrativa ganha força pela ideologia da técnica e da ciência, pois estas centram-se no seu poder prático de promover o desenvolvimento econômico e incrementar níveis de consumo da população, propagando a idéia de estabilidade e de desenvolvimento sociocultural pela intervenção competente dos tecnocratas.

A sociedade, por sua vez, passa a acreditar que seu bem-estar e felicidade dependem do desenvolvimento técnico-científico, e ainda, os interesses sociais passam a coincidir com os interesses sistêmicos. Ao ensino da administração é atribuída à responsabilidade de formar indivíduos capazes de transformação a realidade econômica e social, por meio de seus currículos, devendo refletir sobre o seu real papel e função na sociedade, evitando ser engolida pela ideologia da ciência e da técnica e pela esfera sistema que determina as relações sociais através da dominação, disputa e concorrência entre seus membros.

No documento 2008FernandoBencke (páginas 38-41)