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2.2 Ecologia e Sustentabilidade

2.2.1 Agroecologia e Mulheres

A denominada agroecologia ou eco- agricultura é o estudo da agricultura ligado à práticas e princípios ecológicos, o surgimento deste tipo de prática se deu devido à crise ecológica e também econômica, advinda do modelo de produção alimentar capitalista. Altieri conceitua a agroecologia:

A agroecologia fornece uma estrutura metodológica de trabalho para a compreensão mais profunda tanto da natureza dos agroecossistemas como dos princípios segundo os quais eles funcionam. Trata-se de uma nova abordagem que integra os princípios agronômicos, ecológicos e socioeconômicos à compreensão e avaliação do efeito das tecnologias sobre os sistemas agrícolas e a sociedade como um todo. (ALTIERI, 2004, p. 23)

Portanto, essa forma de agricultura é uma expressão do desenvolvimento sustentável dos povos, uma possibilidade de aliar o progresso e continuidade da vida dos seres humanos, com o adequado tratamento e respeito a natureza e aos recursos naturais.

Um dos principais objetivos é a contribuição para uma produção mais sustentável, bem como é notável que os alimentos “verdes, orgânicos” já possuem seu nicho de consumo no mercado. Cabe ressaltar que as práticas agroecológicas tem como objetivo também a destinação correta dos resíduos, assim como reutilizar os mesmos na atividade produtiva, gerando sustentabilidade ambiental.

Além de ser uma ciência, os estudos agroecológicos compreendem a valorização dos saberes empíricos dos povos tradicionais, o conhecimento não científico, da cultura dos camponeses e povos indígenas. O protagonismo dos

agricultores/camponeses/indígenas como elemento central na construção de um novo elemento rural é muito visado. Tal como entende Siliprandi:

Esse protagonismo dos agricultores será central no pensamento agroecológico, basicamente, em três aspectos: na construção de suas propostas técnicas, por conta da capacidade da agricultura camponesa de coevoluir respeitando os processos ecológicos; por sua premissa de que o desenvolvimento rural só poderá ser sustentável se for baseado no modo de produção camponês; e pelo reconhecimento da necessidade de promover o empoderamento desse grupo social, que foi marginalizado econômica, social, política e culturalmente ao longo da história da humanidade. As propostas agroecológicas têm, portanto, um caráter emancipatório, e os movimentos que se formaram em torno da agroecologia aproximaram-se politicamente das lutas por ecojustiça. (SILIPRANDI, 2015, p.87)

Por esta razão a agroecologia possui muitos desafios atualmente para que possa ser praticada em amplo aspecto pelos grandes e pequenos produtores. Embora seja ótima para a resiliência do meio ambiente e da terra produtiva, em se tratando da produção agrícola, ainda não há tecnologias nem difusão de conhecimentos suficientes para ampliar o alcance agroecológico no mundo.

Por conseguinte, de grande importância é a atuação das mulheres no incentivo e prática da agroecologia, tendo em vista a forte ligação que maioria das mulheres possuem entre a alimentação e a saúde familiar. Tal elo histórico advindo da estrutura da sociedade patriarcal promove o lugar de preocupação e ativismo na qualidade do alimento consumido, nos movimentos feministas.

O vínculo entre alimentação adequada e a proteção da saúde das pessoas na família, a sabedoria popular e tradicional do uso de plantas medicinais e de outras práticas realizadas principalmente pelas mulheres, tal como afirma Siliprandi, foram muito desprezadas com a crescente “medicalização” da saúde. As mulheres ativistas da causa ambiental e agroecológicas combatem o uso de agrotóxicos e valorizam os saberes não institucionalizados, que acabam se perdendo contemporaneamente, objetivando resgatar e valorizar tais práticas. (SILIPRANDI, 2015, p. 312)

As mulheres atuam como lideranças políticas, na comunidade que pertencem e em organizações, nos papéis de como educadoras e influenciadoras de outras mulheres e pessoas. Saindo do papel de apenas esposas, essas ativistas se

apresentam como presidentes de cooperativas rurais e, os grupos de produtoras cada vez se tornam mais comuns.

As mulheres representam, no mundo, cerca da metade dos 2,5 milhões de pequenos agricultores, criadores, habitantes das florestas e pescadores, cujos conhecimentos e trabalho cumprem papel fundamental na sustentabilidade dos diversos sistemas alimentares, particularmente nos países em desenvolvimento. (PACHECO, 2009, p. 04)

A necessidade que a agroecologia possui pelo auxílio e das ações feministas é intensa, devido ao expressivo número de mulheres produtoras e que estão saindo da dicotomia público- privada padrão e, exercendo liderança e iniciativas sustentáveis na produção alimentar.

Importante frisar que, as mulheres historicamente e também atualmente (de modo mais ameno) são os seres humanos que sofrem as consequências diretas da degradação ambiental. Normalmente são as mulheres que cuidam dos doentes, cozinham, cuidam do ambiente da casa, da horta, vivem mais em contato com a natureza e o cuidado das pessoas, o que leva a preocupação mais intensa com a preservação ambiental.

A Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) é a organização mais importante no Brasil para a agroecologia e, possui o grupo de trabalho específico das mulheres, desde 2004, que promove a igualdade entre os gêneros, no sentido de dar voz as opiniões femininas nas causas ambientais. Nos encontros nacionais as mulheres conquistaram um importante direito de opinião, com a paridade de gênero. Afirma Siliprandi:

A Articulação Nacional de Agroecologia é uma rede da sociedade civil brasileira, criada em 2002, que congrega diferentes instituições de técnicos e agricultores, assim como representantes de movimentos sociais(sindicais, de luta pela terra, de consumidores, de mulheres, entre outros) de todas as regiões do país, que se propõem a promover a agroecologia como um componente estratégico do desenvolvimento rural sustentável e democrático (...), declara que “a igualdade das relações entre homens e mulheres é condição essencial para o alcance da sustentabilidade da produção agroecológica familiar”. (SILIPRANDI, 2015, p; 26)

A relação pertencente as mulheres e a produção alimentar perpassa também o direito à terra e aos meios de produção, ter as condições técnicas e financeiras suficientes, além do conhecimento para que o direito de manter suas famílias com dignidade alimentar e construir um desenvolvimento sustentável com base na agricultura seja alcançado. Um exemplo são as ONGs que atuam nessa promoção de direitos, como explana Altieri:

As ONGs, como o Bangladesh Rural Advancement Committee (BRAC) e a Proshika, assistem hoje a mais de 30 mil criadores de peixes, dos quais quase 60% são mulheres, na utilização de açudes e valas sazonais antigamente abandonadas. A adoção pelas mulheres da piscicultura integrada, não apenas lhes fortalece socialmente, como também melhora a alimentação de suas famílias. O BRAC fornece crédito a mulheres que, em alguns casos, nunca haviam tido acesso a esse benefício; sua taxa de inadimplência é de apenas 2%. (ALTIERI, 2004, p.47)

Quando é fornecido o amparo financeiro para as ativistas agroecológicas, a preservação ambiental é o resultado. Outro exemplo característico do Brasil é a luta pela preservação das sementes crioulas, que é contra a expansão dos cultivos transgênicos e atua diretamente pela diminuição do uso dos agrotóxicos.

A produção de alimentos advinda da investigação empírica das mulheres, durante anos e resultado de observações entre gerações de famílias quanto ao clima, local e às necessidades das pessoas, é um saber utilizado nas práticas da agroecologia.

O principal escopo, a produção limpa de alimentos e uma agricultura o mais sustentável possível, com a voz e voto das mulheres nas decisões mostra-se mais possível de ser atingido. Alguns importantes exemplos são a ação das mulheres na Rede Xique-Xique, são 392 mulheres que se auto- organizaram no Rio Grande do Norte, mobilizando na área da agroecologia e economia solidária.

Do mesmo modo, no sertão de Pernambuco a partir de 2006, quando começaram a participar de um trabalho orientado pela perspectiva agroecológica, parafraseando Pacheco, estruturadas por meio de associações, feiras agroecológicas, em ações que promovem o intercâmbios de experiências e conhecimento. Além do objetivo de comercializar, ações como o Movimento das

Mulheres Camponesas, compreendem as lutas por participação e reconhecimento das mulheres como sujeitos políticos. (PACHECO, 2009, p. 06)

A perspectiva feminista na agroecologia atua na desconstrução dos papéis de gênero e, reconhecendo as diferenças biológicas dos seres humanos, promovendo a equidade respeitando-se as diferenças intrínsecas de cada gênero. O lado positivo do local pré-determinado as mulheres, torna-se um espaço de alternativas de eficiência ao desenvolvimento sustentável e a saúde.

A proposta agroecológica e a contribuição das mulheres para a mesma possibilita uma melhor análise, contribuindo para perceber e alcançar mudanças imprescindíveis nos estilos de vida e produção das agricultoras e agricultores.

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