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As alíquotas do IPVA são as percentagens ou valores fixos que, multiplicados por sua base de cálculo, apuram o crédito tributário a ser recolhido pelo Poder Público. São estabelecidas por meio de lei ordinária estadual ou do Distrito Federal.

A Emenda Constitucional n. 42/03, em seu art. 155, §6, I, estipulou que as alíquotas mínimas do imposto fossem fixadas pelo Senado Federal. Para Silva154, tal previsão teve como intuito evitar a guerra fiscal entre os entes federativos, relativamente às empresas de grande porte como as locadoras de veículos ou transportadoras, de modo que estas não fossem

154

SILVA, Paulo Roberto Coimbra. IPVA – imposto sobre a propriedade de veículos automotores. São Paulo: Quartir Latin, 2011, p. 121.

aliciadas por melhores disposições tributárias para pagamento do imposto em outros pontos do território nacional.

Outra inovação, no bojo da Emenda, foi a possibilidade de as alíquotas serem dispostas em função do tipo e do combustível, muito embora tal conduta legislativa já se fizesse presente em alguns documentos estaduais.

Na seletividade, as alíquotas “variam em razão (e na proporção inversa) da

essencialidade do objeto almejado pela tributação155”. Desta feita, se o Estado pretende fomentar o consumo de fontes limpas de combustível, as alíquotas serão menores na medida em que menor for o seu potencial poluidor, tributando-se, de forma mais gravosa os combustíveis mais poluentes.

Frise-se que as alíquotas seletivas do IPVA devem estar em conformidade com os princípios elencados na Carga Magna, sob pena de instarem-se inconstitucionais. Assim, encontram limites no Princípio da Legalidade, Isonomia, Igualdade, não estando ao alvedrio do legislador ordinário.

A majoração excessiva, por exemplo, é restringida pela vedação ao confisco, expresso em sede constitucional.

Vidi e Branco156 lançam importante discussão quanto à inovação tecnológica que, a cada dia, coloca à disposição dos consumidores novas gamas de combustíveis menos poluentes, não sendo esses prestigiados pela legislação seletiva.

Os autores citam, como exemplo, os combustíveis “flex” que, a despeito de utilizarem o álcool com menor impacto ambiental, não são abarcados pela lei sob o argumento de que os contribuintes/consumidores, que também podem utilizar a gasolina, estariam burlando a isonomia e igualdade tributária.

Todavia, como bem salientam, os veículos movidos a gás natural veicular também podem fazer uso da gasolina assim como os elétricos e afins, não acolhendo razão os argumentos apontados pelos defensores de tal teoria, uma vez que o consumo do gás natural goza da diferenciação de alíquota, a menor, do imposto.

Ademais, sendo o IPVA um dos maiores arrecadadores de receita aos cofres públicos estaduais, admite-se que a oposição do Estado a esta previsão legislativa se dê em razão da evasão de divisas, oriunda da gradação das alíquotas.

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SILVA, Paulo Roberto Coimbra. IPVA – imposto sobre a propriedade de veículos automotores. São Paulo: Quartir Latin, 2011, p. 122.

156 VIDI, Rafael; BRANCO, Raphael Borghesi Marques. IPVA dos veículos bicombustíveis (“flex”) – problemática com relação à alíquota aplicável. In: Revista de Direito Público. Londrina, v. 4, no

Importante destacar que apenas alguns Estados da federação legislaram sobre o IPVA ambiental, destacando-se pelo pioneirismo: São Paulo e Rio de Janeiro. Vejamos suas especificidades.

3.4.1 Legislação do Estado de São Paulo

O Estado de São Paulo foi o primeiro ente federativo brasileiro a adotar a previsão de extrafiscalidade do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores, por disposição da lei n. 7.644/91 que alterou o art. 7º, II, da lei n. 6.606/89, instituidora do imposto no Estado, introduzindo a minoração da alíquota para os veículos movidos, exclusivamente, a álcool.

Era o que dispunha:

Ar. 7º. A alíquota do imposto, calculada sobre o valor venal é:

I - 5,0% (cinco por cento) para embarcações, aeronaves e automóveis de esporte e de corrida;

II - 4,0% (quatro por cento) para automóveis de passeio e camionetas de uso misto;

III - 3,0% (três por cento) para automóveis de passeio, de esporte e de corrida, e camionetas de uso misto, movidos exclusivamente a álcool; IV - 2,0% (dois por cento) para qualquer outro veículo inclusive motocicletas e ciclomotores;

V - 1,5 % (um e meio por cento) para os veículos de carga, categoria caminhões com capacidade superior a 1 tonelada;

VI - 6,0% (seis por cento) para automóveis de passeios movidos a "diesel"; VII - 1,0% (um por cento) para qualquer veículo indicado nos incisos precedentes com mais de 20 (vinte) anos de fabricação, excetuando-se as aeronaves. (grifo nosso)

A lei em comento foi, posteriormente, revogada pela Lei n. 13.296/08, que manteve a indução tributária, abarcando uma quantidade maior de fontes limpas de combustíveis a serem premiadas pela alíquota seletiva.

Figurando entre os Estados com a maior concentração de poluentes tóxicos no ar, salutar mostrou-se a conduta do legislador ao introduzir a seletividade do imposto aos combustíveis menos gravosos ao meio ambiente.

O aumento da frota de veículos aliado a tecnologia rudimentar dos motores comprometeu, sobremaneira, a qualidade do ar, na cidade que, a partir da década de 90, introduziu várias normatizações a fim de abrandar a problemática.

O desenvolvimento de uma matriz energética de energia limpa transformou o Estado no maior produtor de bioenergia do país157, o que resultou na criação da Comissão Especial de Bioenergia do Estado de São Paulo pelo Decreto n. 51.736/07.

Atualmente, representa, no país, o maior expoente em energia limpa comercializada para veículos automotores.

Do exposto, depreende-se que o mercado de consumo, notadamente fomentado pelo Estado através de Políticas Públicas, como é o caso, implica na transformação legislativa, a fim de respaldar o surgimento de uma nova realidade.

3.4.2 Legislação do Estado do Rio de Janeiro

De igual modo, o Estado do Rio de Janeiro, acompanhando o mercado de transição, adotou, de maneira semelhante, a previsão da norma tributária indutora para aquisição de veículos movidos a fontes limpas de combustível por meio da Lei n. 2.877/97.

Estabelece, em seu art. 10, a gradação da alíquota do IPVA, in verbis: Art. 10. A alíquota do imposto é de:

I - 5% (cinco por cento) para embarcações e aeronaves;

II - 4% (quatro por cento) para automóveis de passeio e camionetas, exceto utilitários;

II-A - 3% (três por cento) para automóveis de passeio e camionetas bi-combustíveis, movidos a álcool e/ou gasolina;

III - 3% (três por cento) para utilitários;

IV - 2% (dois por cento) para ônibus, micro-ônibus, motocicletas e ciclomotores;

V - 1% (um por cento) para caminhões com capacidade de carga superior a 1 (uma) tonelada e veículos de transporte de passageiros a taxímetro pertencentes a pessoas jurídicas;

VI - 2% (dois por cento) para automóveis movidos a álcool;

VII - 1% (um por cento) para veículos que utilizem gás natural ou energia elétrica;

VIII - 4% (quatro por cento) para demais veículos não alcançados pelos incisos anteriores, inclusive os veículos de procedência estrangeira. (grifo nosso)

Tal medida é basilar em um Estado que ocupa o 144º lugar158 entre as cidades com a maior poluição atmosférica no mundo, segundo resultado divulgado, em 2011, pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

157

GOLDEMBERG, José, et al. Bioenergia no Estado de São Paulo: situação atual, perspectivas, barreiras e propostas. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2008, p. 7.

158

World Health Organization (WHO). Outdoor air pollution in cities. Disponível em: <www.who.int/phe/health_topics/outdoorair/databases/OAP_database.xls>. Acesso em: 10 set. 2012.

A mudança da lei foi resultado de uma série de medidas adotadas pelo Poder Público frente aos males causados pelo elevado nível de resíduos tóxicos no ar, verificados na região metropolitana da cidade.

Em estudo divulgado em 2003, um grupo de pesquisadores atentou para a correlação existente entre os níveis de poluição na cidade do Rio de Janeiro com o aumento de doenças respiratórias causados na população.

Os resultados da pesquisa alertam159:

Uma maior articulação entre os diversos setores que gerenciam a vida urbana nestas metrópoles é fundamental para que sejam implementadas medidas mais abrangentes e eficientes, que busquem a melhoria da qualidade do ar. A diminuição da frota de veículos circulantes (...) é apenas uma delas, talvez das mais importantes.

No mesmo sentido, aponta o Relatório Anual de Qualidade do Ar do Rio de Janeiro160, publicado em 2009, que “a parcela de contribuição de emissão das atividades industriais (...) aliadas às de origem veicular, causam problemas de poluição do ar em várias áreas do Estado, principalmente nos aglomerados urbanos”.

Como se vê, tal realidade já faz parte do cenário estadual já há alguns anos, o que resultou na década de 90 na promulgação da lei supracitada, cujos resultados podem ser sentidos, decorridos quinze anos de sua promulgação, a partir de informações coletadas e divulgadas pelo Departamento de Trânsito do Estado, a partir de 2001.

Da análise dos dados, constata-se que, em dezembro de 2001, o Município do Rio de Janeiro contava com um total de 1.682.591 veículos; desses, apenas 290.101 diziam respeito a motores movidos a combustíveis com menor impacto ambiental, a saber, álcool e gás natural veicular.

Em um comparativo com julho de 2012, os dados revelam o aumento da frota total de veículos em 53, 27% em relação a 2001, contando, agora, com 2.578.955 automóveis. Do total, 1.207,631 circulam com fontes limpas de energia, significando um incremento de 316,28%.

159

GOUVEIA, Nelson, et al. Poluição do ar e efeitos na saúde nas populações de duas grandes metropóles brasileiras. In: Epidemologia e Serviços de Saúde. Volume 12, no 1, jan/mar 2003, p. 38.

160

Governo do Estado do Rio de Janeiro. Instituto Estadual do Ambiente (INEA). Relatório anual da

qualidade do ar do Estado do Rio de Janeiro. Disponível em:

Segundo Fernandes, presidente da Associação Latino Americana de GNV (ALGNV)161, à mudança da lei, em grande parte, se deve o fato de que, do total de conversões de veículos movidos a gás natural veicular realizadas em todo o país, quase 90% ocorresse no Estado do Rio de Janeiro.

Salienta Silva162:

A exoneração do IPVA para os veículos movidos a combustíveis menos poluentes visa induzir comportamentos importantes, senão imprescindíveis, à concreção de um dos fins do próprio Estado, qual seja, promover ou viabilizar o desenvolvimento autossustentável, primando pela preservação ambiental. Nessa hipótese, o Estado abre mão de parcela de suas receitas em prol de outro valor traduzido em interesse público constitucionalmente acolhido, mediante o estímulo à aquisição/propriedade e conseguinte utilização de veículos movidos a combustíveis menos poluentes, inibindo maiores degradação ambientais.

Com efeito, a análise prática da transição legislativa mostra que o Estado, enquanto incentivador de condutas ambientalmente desejáveis por meio da extrafiscalidade do IPVA, alcança sucesso na medida em que tais incursões influenciam a tomada de decisão da população, ao passo em que esta reproduz o modelo comportamental que se pretende atingir.