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Alfabetização Científica: o que pensam os sujeitos?

3.3 A relação entre FECC e Alfabetização Científica

3.3.1 Alfabetização Científica: o que pensam os sujeitos?

A concepção demonstrada pelo coordenador da FECC quanto à definição ou seu entendimento sobre Alfabetização Científica, ainda é imbuída de caráter pessoal mesclado a conceitos teóricos adquiridos na sua vivência no campo científico. Entretanto, de forma inversa, concepções diferentes são evidenciadas pelos alunos e professor orientador, sendo carregadas de um viés prático, definições adquiridas com a experiência e não com leituras, o que leva esses sujeitos a considerarem alfabetização científica sinônimo de iniciação científica.

Cabe mencionar que alfabetizar cientificamente é usar a ciência para ler o mundo de forma crítica (CHASSOT, 2000; 2003). É atuar de forma situada e competente na sociedade e no meio ambiente, usando o conhecimento produzido pela ciência como auxílio e motor, embora não sistematizado, na aquisição de habilidades. Enquanto a iniciação científica é introduzir o indivíduo na cultura da produção e do método científicos de forma sistematizada, o que requer uma base mínima de conhecimentos e maturidade intelectual para que ocorra. No caso dos alunos pesquisados, é possível perceber esse amadurecimento, tendo em vista os projetos que realizam e seus resultados.

O coordenador da FECC não se sente confortável em usar o termo alfabetização científica por discordar que se alfabetize alguém na ciência. De acordo com ele:

“[...] para mim alfabetizar significa partir do princípio que ninguém sabe até então, né! [...] a gente já é pesquisador assim que nasce, nós estamos pesquisando sempre [...] para mim não existe uma alfabetização científica, existe sim uma assimilação de técnicas para você poder ter um aperfeiçoamento científico [...] a gente não está alfabetizando, e sim a gente está sistematizando aquilo que ele faz de natureza [...] eu falo de iniciar, não alfabetizar, iniciar cientificamente dentro do método, aí são as técnicas [...]” (CoF)

É comum essa discordância de termos também entre os autores que versam sobre educação científica43, entretanto, utiliza-se aqui o termo alfabetização por ser atualmente o mais aceito e mais comum na literatura, além dos teóricos usados como base neste trabalho, a saber, Demo (2010), Chassot (2000; 2003) e Sasseron e Carvalho (2011), serem adeptos deste mesmo termo.

Ainda assim, mesmo em desacordo com o termo, a concepção de ciência do coordenador não é mecânica ou técnica como é comumente apresentada em cursos de iniciação científica, mas caminha para uma reflexão que só se sobressai quando a alfabetização científica está presente. Veja-se:

“[...] ciência é geração de conhecimento [...] é essa possibilidade de reflexão [...] é construção cidadã para o bem da sociedade [...] a ciência não deve ser tão restrita e ela deve ser considerada e internalizada pelos professores como reflexão, possibilidades e crescimento.” (CoF)

43 Entre as diferentes concepções encontradas na literatura, destacam-se algumas como: Mortimer e

Vieira (2010), que apresentam o termo letramento científico. Também em alguns trabalhos de Carvalho (2009; 2010) aparece o termo enculturação científica. Cazelli (2001) e Perdomo (2001) por sua vez, utilizam o termo alfabetismo científico.

Para Demo (2010), o desafio da escola é tornar-se casa da ciência, centrando-se na produção própria, o que está além de sua função reprodutora. Essa produção própria de alunos e professores da educação básica, refletida teoricamente, visando assim o melhoramento de sua realidade, é defendida e estimulada pela FECC.

Ao entrevistar o professor orientador, percebe-se que as atividades e projetos realizados na escola não são concebidos conscientemente para fins de alfabetização científica, de forma sistematizada, até porque o termo não é comum para os entrevistados (alunos e professor orientador). Entretanto, a alfabetização científica está subentendida em cada ação realizada ou mesmo nas palavras dos sujeitos.

“O conceito provavelmente literal eu não sei, o que a gente sabe é a prática que é [...] instigar os nossos alunos a tentarem observar também [...] no dia-a-dia e a partir daí, buscar soluções ou buscar explicações para aquilo que está acontecendo.” (PrO)

A alfabetização científica não está sistematizada como parte do currículo, mas assim como a interdisciplinaridade e a contextualização, ela deve ser empregada no ambiente escolar, tendo em vista as necessidades impostas pelas mudanças do mundo atual, como a globalização, as problemáticas ambientais, a expansão das informações e da produção de conhecimentos, as crises políticas, econômicas, sociais e culturais que se fazem constantes.

A ciência e seu ensino têm papel fundamental no processo de alfabetização científica, por que “o conhecimento científico tem especificidades que fazem dele um instrumento valioso para o indivíduo viver na sociedade moderna, possibilitando uma mudança na qualidade da interação entre o ser humano e o mundo em que ele vive.” (ZANCUL, 2011, p. 63) A concepção de ciências e de ensino de ciências do PrO demonstra isso:

“Ciências é basicamente o que a gente vive no dia-a-dia e uma forma de tentar explicar os fenômenos que nós encontramos no nosso dia-a-dia [...] é querer também entender o ambiente ao redor [...]” (PrO)

No caso dos alunos, ainda são incipientes e, por vezes equivocadas, suas conceituações sobre alfabetização científica e sobre ciências. Quando questionados, apresentaram definições vagas e que se referiam à formação científica ou em ciências, remetendo a visões mecanicistas e/ou tecnicistas tão comuns no meio científico e acadêmico.

Quadro 8 – Concepções dos alunos

Concepções dos estudantes sobre

Alfabetização Científica.

“[...] incentivo para a pessoa seguir a carreira científica [...] ter um conhecimento de como aplicar o método científico, de como proceder, de como seguir um determinado processo para fazer uma descoberta, para mais na frente conseguir chegar num objetivo [...]” (Urano)

“Está ligada... a abrir as portas [...] àqueles alunos que apenas conhecem a ciência pela sala de aula, mas eles querem viver, têm aquela curiosidade de viver a ciência prática” (Mercúrio) “[...] proporciona a oportunidade para a pessoa ter noção do seu potencial [...] revelar esse potencial de pesquisa, de desenvolvimento científico [...] contribuir na vida de outras pessoas [...]” (Urano)

Concepções dos estudantes sobre

Ciência.

“Não é só apenas uma matéria que se ensina na sala de aula [...] é algo que fica na vida [...]” (Mercúrio)

“É a gente estudar a natureza, saber como a natureza se comporta e buscar entender a natureza de forma que esse entendimento possa ser utilizado para o bem da humanidade, para o futuro do ser humano [...]” (Urano)

Fonte: Elaborado pela autora.

Entretanto, é possível ver em suas ações e nos seus objetivos ao realizarem os projetos e participarem da feira de ciências, que a alfabetização científica se faz presente, mesmo que subentendidamente, pois suas práticas

estudantis não encerram um fim em si mesmo, estão voltadas para as situações do cotidiano que esses alunos vivenciam e tentam, de alguma forma, contribuir para sua mudança ou melhoramento.