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SUMÁRIO

2. QUADRO TEÓRICO

2.1. CANÇÃO E TRADUÇÃO

2.1.1. Algumas Questões Terminológicas

Primeiramente, é importante pontuar que a ‗tradução de letra de canção‘ nada tem a ver com a ‗tradução de canção‘ propriamente dita. Encartes de CDs, sites na Internet, seções especiais em revistas, livretos e legendas de filmes oferecem tradução de letras, porém são traduções livres e/ou literais, impossíveis de serem cantadas na melodia da canção. Tais traduções têm o intuito apenas de permitir que o leitor/ouvinte entenda o que o artista está cantando. Trata-se, portanto, de uma tradução para ser lida apenas.

O termo ‗versão‘ refere-se, popularmente, ao produto final da tradução de uma determinada canção. Contudo, o termo ‗tradução de canção‘ pode se referir tanto ao produto final quanto ao fazer tradutório, às implicações envolvidas, à totalidade do processo. Considerando, portanto, que ‗versão‘ não é necessariamente ‗tradução de canção‘, será utilizado aqui o termo ―canção traduzida‖, ou mesmo ―versão traduzida‖

13 Todas as citações em língua estrangeira serão doravante traduzidas pelo autor desta pesquisa para a língua portuguesa sem a notação ―tradução minha‖. Os excertos originais serão disponibilizados em notas de rodapé, como segue: The audience‘s possible ignorance of a language is not a fatal bar to their enjoyment.

para designar os objetos de estudo desta pesquisa. Ao longo deste trabalho, o termo ‗tradutor de canção‘ poderá ser, por vezes, substituído pelo termo sinônimo ‗versionista‘. O termo ‗letrista‘ se referirá simplesmente ao profissional ‗autor de letra‘, como define o dicionário Aurélio14.

É importante ressaltar, ainda, que uma versão pode ser apenas a regravação de uma determinada canção, mas em outro estilo – como as canções cover. Pode ser também a criação de uma letra totalmente diferente da original para uma mesma melodia – como as paródias. Portanto, paródia e versão cover não se referem à ‗tradução de canção‘ nos termos propostos pelo presente estudo.

O termo ―cover‖ se refere à prática de regravação de uma canção por um outro artista que não seja o cantor original, podendo acrescentar novos arranjos, ritmos, estilos. As versões cover, como enfatizam David Beard e Kenneth Gloag (2005), ―geralmente se referem a canções já bem conhecidas e, portanto, disponíveis tanto para revisitação como para reformulação‖, e afirmam que ―um processo de transformação ou tradução pode ser evidente‖15

(p. 27). Quando regravada em outro estilo, a canção passa por uma tradução, mas de um gênero musical para outro. A paródia, em termos musicais, é um tipo de imitação que geralmente adiciona um tom cômico, satírico, irônico, crítico, e pode aproveitar apenas a melodia da canção original, ou seja, pode-se criar uma nova letra que nada tenha a ver com a mensagem original. Existem muitas outras definições e variações para o termo paródia, a depender da área, por exemplo, a dramática, a literária... e do momento histórico, uma vez que, como defendem alguns autores, as definições variam com o tempo (e.g. Hutcheon, 1985; Rose, 1993; Müller, 1997). A paródia pode, também, apenas imitar o estilo de um artista em uma obra completamente nova. Por haver pouca semelhança com a canção original, as editoras estrangeiras geralmente recusam paródias e, quando as aceitam, o autor da letra não recebe por direitos autorais. Um exemplo disso é a paródia da cantora e compositora Rita Lee para o clássico dos Beatles I want to hold your hand, contida no álbum Multishow ao Vivo (2009), intitulada ―O bode e a cabra‖. Este é um caso em que o autor utilizou apenas a melodia da canção original, e escreveu uma nova letra com uma mensagem completamente diferente. Ivan

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Fonte: Dicionário Aurélio Eletrônico Século XXI, versão 3.0, 1999.

15 But cover versions tend to relate to songs already familiar and therefore available for either revisiting and/or reworking. A process of transformation or translation can be evident.

Cláudio, jornalista da revista Isto é, chamou a obra de ―recriação absurda‖ e lembrou que Rita Lee teve seis letras recusadas para seu álbum especial em 2001 com o repertório dos Beatles, inclusive uma outra ‗versão‘ para I want to hold your hand intitulada ―O amor é tão clichê‖ (p. 107).

Outro termo comumente utilizado para se referir à tradução de canção é ‗adaptação‘. A questão é controversa e torna-se difícil definir com precisão a diferença entre adaptar e traduzir uma canção. De uma forma geral e sucinta, ‗adaptação‘ sugere maiores liberdades por parte do tradutor e, muitas vezes, permite eliminação de palavras importantes, alteração de sentidos ou recursos que o compositor original utilizou. John Milton (2009), em um breve artigo, faz um paralelo entre Estudos da Tradução e Estudos da Adaptação e explica que uma adaptação geralmente contém omissões, reescrituras, adições, e só pode ser reconhecida como obra do autor original se o objetivo da enunciação for mantido (p. 51). Seria plausível dizer, então, que quanto mais a versão traduzida se afasta do significado da letra original, mais próxima está de ser definida como ‗adaptação‘. Por outro lado, em se tratando de canções, há um vínculo principal entre os textos fonte e alvo, que é a música. A música é a parte integrante do conjunto da canção (letra + música) que será mantida ―na íntegra‖ na versão traduzida. Nesse aspecto, não haveria distanciamento entre canção fonte e alvo. Por esse motivo, poderia ser sugerido, então, uma ‗acepção mais ampla de tradução‘, mais ‗livre‘, deixando de lado qualquer relação com o termo ‗adaptação‘.

O estudo sobre tradução de canção apóia-se sobre gêneros distintos relacionados, o que oferece uma gama de termos e áreas afins, a citar, por exemplo, tradução de óperas, árias, recitais, musicais, hinos religiosos, canções infantis, baladas, dublagens de canções em filmes ou em peças teatrais, entre outros. Naturalmente, cada gênero possui características específicas e as regras norteadoras para o processo tradutório diferem em alguns pontos de um para outro.