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3 O ESPAÇO COMO CATEGORIA DE ANÁLISE

4 QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO

4.4 Alguns clássicos da literatura sobre Qualidade de Vida no Trabalho

Os principais modelos de análise e gestão da qualidade de vida no trabalho utilizados na academia e nas organizações contemplam fatores considerados relevantes na manutenção e desenvolvimento de ambientes de trabalho em que a humanização das relações e o respeito às necessidades do trabalhador são considerados.

Os autores contemplados serão Lippit (1978), Huse e Cummings (1985), Theriault (1980), Werther e Davis (1983), Westley (1979), Hackman e Oldham (1975) e Walton (1973), cujo modelo será utilizado nesta pesquisa.

Lippit (1978), em seu modelo de análise, considera que a obtenção da qualidade de

vida no trabalho consiste no atendimento das necessidades dos indivíduos e da organização.

Contudo, segundo este autor, a organização só atinge seus objetivos se considerar as

necessidades dos indivíduos. São quatro os fatores-chave de manutenção da qualidade de vida no trabalho indicados pelo autor: o trabalho em si; o indivíduo; a produção do trabalho; e as

funções e estrutura da organização.

No fator o trabalho em si, Lippit considera o feedback de performance, a clareza dos objetivos de trabalho, a redução de controles, o aumento da responsabilidade e o

envolvimento do indivíduo no processo de tomada de decisão como elementos-chave para a obtenção da satisfação no trabalho.

No fator o indivíduo, considera a possibilidade de aprimoramento da auto-imagem e de aprendizagem, o clima propício à amizade e a coerência entre objetivos de vida e de trabalho como elementos imprescindíveis na promoção da satisfação.

No fator a produção do trabalho, considera elementos-chave a possibilidade de aumento de responsabilidade, a colaboração intergrupal, a possibilidade de realizar um

trabalho menos fragmentado (mais completo), as recompensas pela qualidade e pela inovação e a presença de objetivos mensuráveis.

No fator as funções e estrutura da organização, considera elementos relevantes o clima propício à criatividade e à comunicação adequada, o respeito ao indivíduo e o avanço e desenvolvimento organizacional.

Huse e Cummings (1985) procuram englobar numa única abordagem a maioria dos aspectos apresentados nas abordagens anteriores. Para eles, o conceito de qualidade de vida

no trabalho contempla a interação entre as pessoas, o trabalho e a organização, visando a

assegurar o bem-estar do trabalhador, a participação nas decisões e na solução de problemas do trabalho e a eficácia organizacional. Para esses autores, um programa de QVT deve considerar: a participação do trabalhador nas decisões, o redesenho dos cargos, os sistemas

de recompensas inovadores (remuneração flexível e eqüitativa) e a melhoria no ambiente de trabalho.

Theriault (1980) coloca a remuneração como o foco central de seu modelo. Para ele, os programas de QVT devem enfatizar a remuneração, pois ela assegura certa segurança aos indivíduos, considera as diferenças individuais e favorece a democracia industrial, na qual a participação constitui-se em um componente básico. Para o autor, um programa de QVT que considera a importância da remuneração deve reconhecer a significância, a inter-relação e a questão cultural que permeiam as transações entre os empregados e a organização.

Werther e Davis (1983) consideram como fatores que afetam a QVT: a supervisão, as

condições de trabalho, os sistemas de recompensas e projetos de cargos e a participação ativa no processo de mudança e implementação de um programa de QVT. Contudo, o fator

que mais envolve o trabalhador é a natureza do cargo.

Para Westley (1979), os problemas enfrentados pelos trabalhadores podem ser

organizações e é gerador de insegurança; o econômico que se refere à distribuição de renda e é fonte de injustiça; o psicológico, que se relaciona à fragmentação do trabalho e é gerador de alienação; e o sociológico, que se refere à estruturação sociotécnica do trabalho e é gerador de anomia. Para ele, o enriquecimento do trabalho, a estruturação sociotécnica e a participação nos lucros são fontes de solução dos problemas enfrentados pelos trabalhadores.

Hackmam e Oldham (1975) propuseram o modelo das “dimensões básicas da tarefa”, que tem sido considerado um dos instrumentos mais abrangentes na mensuração da satisfação no trabalho, largamente utilizado nas pesquisas nacionais que contemplam a natureza do trabalho como uma dimensão relevante da qualidade de vida no trabalho.

No que se refere ao conteúdo do trabalho como determinante da satisfação no trabalho, esses autores defendem o argumento de que as características do trabalho promovem a emergência de estados psicológicos capazes de determinar a motivação e a satisfação do indivíduo no trabalho.

Três estados psicológicos teriam um impacto importante na satisfação de uma pessoa em seu trabalho: o sentido que ela encontra no trabalho desempenhado; o sentimento de responsabilidade que ele vivencia em relação aos resultados obtidos; e o conhecimento de seu desempenho no trabalho.

Para Hackman e Oldham (1975), quatro características do trabalho contribuem para lhe conferir sentidos:

¾ variedade de habilidades: grau em que a tarefa requer, para a sua execução, o

envolvimento e o uso de várias habilidades e talentos de um mesmo indivíduo;

¾ identidade do trabalho: grau em que um trabalho permite a realização de algo do início

¾ significado do trabalho: grau em que o trabalho possa ter um impacto significativo no

bem-estar ou no trabalho de outras pessoas, seja na organização ou no ambiente social; e

¾ inter-relacionamento: possibilidade de lidar diretamente com outras pessoas, inclusive

clientes.

Quanto ao sentimento de responsabilidade, a característica do trabalho que contribui para seu surgimento é a autonomia, ou seja, o grau em que um trabalho oferece uma margem de liberdade e de independência para a programação do trabalho e a determinação dos procedimentos de sua execução.

O conhecimento de seu desempenho no trabalho ocorre através das possibilidades maiores ou menores de se obter feedback extrínseco (informações claras sobre seu desempenho por intermédio de superiores, colegas ou clientes) e feedback intrínseco (informações sobre o desempenho oriundas da própria execução das atividades de trabalho).

Segundo Hackman e Oldham (1975), é possível analisar o potencial motivador de um trabalho a partir da identificação de suas características. Além das variáveis relacionadas ao conteúdo do trabalho, esses autores reconhecem a importância dos fatores de contexto na satisfação no trabalho, que podem contribuir para um compromisso maior ou menor do trabalhador com a organização. São eles: possibilidade de crescimento pessoal e profissional; respeito, apoio, competência e tratamento justo por parte da supervisão; estabilidade e segurança no trabalho; compensação financeira (salário, gratificações e benefícios); e ambiente social (relações interpessoais, grupais e intergrupais).

As relações entre características do trabalho e estado psicológico, dependendo de suas possíveis configurações, contribuem para a maior ou menor satisfação e para o melhor ou pior desempenho, além de impactar os índices de absenteísmo e rotatividade nas organizações. Além disso, segundo esses autores, as relações entre as características do trabalho, o estado

psicológico e os resultados de satisfação são moderados pela necessidade de crescimento das pessoas. Nessa perspectiva, uma pessoa com maior necessidade de crescimento seria mais sensível a um trabalho com tarefas mais enriquecidas que um indivíduo com fraca necessidade de crescimento.

Hackman e Oldham (1975) concordam que nas relações de trabalho as necessidades, ou estados psicológicos, estão condicionadas pelas características do trabalho que, se modificadas, geram menor ou maior satisfação. Contudo, esses pesquisadores admitem que a necessidade de crescimento das pessoas modifica a forma como percebem a importância das características do trabalho como relevantes para sua satisfação. Nesse sentido, colocam a necessidade de crescimento em uma ordem diversa das necessidades de dar sentido ao trabalho, de autonomia e responsabilidade, alterando a relação entre as características do trabalho e a satisfação das necessidades.

Avaliando-se as contribuições dos diversos pesquisadores apresentados e retomando um dos objetivos desta pesquisa, que consiste em verificar a satisfação das pessoas com deficiência em relação a aspectos relevantes para a manutenção da qualidade de vida no trabalho, optou-se por trabalhar com o modelo de Walton (1973), por considerar que sua perspectiva está mais alinhada com as preocupações desta pesquisa, colocando a questão da qualidade de vida no trabalho em um contexto de trabalho que busca regulamentar os direitos de minorias e assegurar saúde, segurança e garantia no trabalho, fatores considerados essenciais para a inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho.

Para Walton (1973), a denominação qualidade de vida no trabalho (QVT) está inserida no contexto das relações de trabalho desde o início do século XX, na busca da legalização das condições de trabalho das mulheres e das crianças, da regulamentação das relações de trabalho e das lutas do movimento sindical para assegurar saúde, segurança e garantia no trabalho. Esse autor discute a amplitude do conceito e a dificuldade de isolar e

identificar os atributos que interferem na qualidade de vida no trabalho. Propõe, então, oito categorias, ou indicadores, que, segundo ele, contemplariam o constructo.

¾ Compensação justa e adequada (remuneração): significa eqüidade interna e externa

tanto em termos de salário direto quanto indireto (benefícios).

¾ Condições de segurança e saúde no trabalho (condições de trabalho): implica

condições de trabalho que assegurem a manutenção da segurança e da saúde do trabalhador, envolvendo a jornada e a carga de trabalho, equipamentos disponibilizados para a execução do trabalho e ambiente saudável (preservação da saúde do trabalhador).

¾ Uso e desenvolvimento de capacidades: implica o aproveitamento do talento humano,

isto é, significa autonomia, uso de habilidades variadas e participação no processo total de trabalho.

¾ Oportunidade de crescimento e segurança (oportunidades de crescimento

profissional): implica a possibilidade de desenvolver carreira e ter segurança quanto à

manutenção do trabalho, isto é, abarca as políticas da instituição relacionadas ao desenvolvimento, crescimento e segurança de seus empregados.

¾ Integração social na organização: significa apoio dos grupos primários, igualdade de

oportunidades, ausência de preconceitos e cultivo ao bom relacionamento.

¾ Constitucionalismo (direitos na instituição): significa garantia no cumprimento das

normas e procedimentos que se relacionem às leis e direitos trabalhistas, respeito à privacidade, liberdade de expressão e adesão a padrões de igualdade.

¾ Trabalho e espaço total da vida (equilíbrio trabalho e vida): possibilidade de

¾ Relevância do trabalho na vida (relevância do trabalho): investiga-se a percepção do

empregado em relação à imagem da empresa, à responsabilidade social da instituição na comunidade e à relevância do trabalho desempenhado.

O modelo teórico de Walton (1973) será utilizado como perspectiva de análise para verificar como as pessoas com deficiência percebem aspectos considerados relevantes para a manutenção da qualidade de vida no trabalho. Primeiro, porque a intenção é verificar a influência das condições externas (dimensão ambiental) na satisfação das pessoas com deficiência, uma vez que elas se constituem em uma obstrução importante para a inserção dessas pessoas no mercado de trabalho. Segundo, será considerada a satisfação das pessoas com deficiência em relação aos fatores de qualidade de vida no trabalho, o que inclui sua percepção dessas condições. Terceiro, apesar de a inserção de pessoas com deficiência não impactar diretamente na modificação da forma como o trabalho está dividido na sociedade capitalista, ela propicia uma nova configuração de forças neste campo, pois introduz no mercado formal de trabalho pessoas que historicamente estiveram fora dele, na maioria das vezes, em condições de vida muito precárias.

No próximo capítulo, serão apresentados os procedimentos metodológicos adotados para a consecução desta pesquisa.

5 METODOLOGIA

Este capítulo apresenta os pressupostos que nortearam as escolhas metodológicas da pesquisa e os procedimentos adotados em suas duas etapas empíricas: a realização do survey que contempla a inserção de pessoas com deficiência em empresas brasileiras; e o estudo de caso que investiga a inserção dessas pessoas em uma grande instituição financeira. Além disso, são apresentados o modelo heurístico proposto e as hipóteses (suposições) de pesquisa.