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Alienação na pendência de ação capaz de reduzir o executado à

2.3 Hipóteses de fraude à execução

2.3.4 Alienação na pendência de ação capaz de reduzir o executado à

A última hipótese trazida pelo CPC/2015, tendo em vista que o inciso V é cláusula genérica, que meramente esclarece a possibilidade de serem em fraude à execução outros atos que a lei assim determine, é a alienação de bem no curso de demanda – aqui tida em seu sentido mais amplo possível, podendo ser uma ação cível, de conhecimento, em suas mais variadas modalidades, como declaratórias, constitutivas, condenatórias e mandamentais, ou de execução, ou até mesmo uma ação penal114 – que poderá reduzir o réu à insolvência115.

De fato, embora não se trate de fraude à execução em sentido estrito, como nas hipóteses dos incisos I a III116, é a hipótese de fraude que mais provoca discussões e que mais

demanda atenção, ensejando, inclusive, edição de enunciado sumular por parte do Superior Tribunal de Justiça, o de nº 375, o qual será explorado adequadamente no item 3.3.1.

Importante destacar que a aplicação deste inciso se distingue de quando o bem já está afeto à execução, através de atos de constrição judicial, demanda de direito real ou reipersecutória ou através de tutela cautelar117.

Como já dito alhures, esta hipótese de fraude contra a execução somente poderá se caracterizar após a citação do réu/executado, pois é a partir deste momento que a relação

111 THEODORO JUNIOR, Humberto. op. cit., p. 449.

112 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial nº 1.209.807/MS, Relator Ministro Raul Araújo,

Quarta Turma, julgado em 15 de dezembro 2011.

113 BRUSCHI, Gilberto Gomes; NOLASCO, Rita Dias; AMADEO, Rodolfo da Costa Manso Real. op cit., p. 29. 114 ASSIS, Araken de. op. cit., p. 237.

115 THEODORO JUNIOR, Humberto. op. cit., p. 450.

116 MEDINA, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil Comentado. 3ª ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2015, p. 703.

processual envolvendo o réu passa a existir118. Está presente, a partir da citação, portanto, o

requisito da demanda preexistente para a caracterização da fraude.

Outra condição exigida para a caracterização da fraude é a insolvência do executado. A insolvência, conforme ensina Humberto Theodoro Jr., deve ser analisada em paralelo ao

eventus damni exigido pela fraude contra credores119, pois não se cogita declarar como

ocorrente em fraude à execução, ato que não diminua o patrimônio do devedor, ou que, se o faça, não o torne insolvente. O direito à propriedade (artigo 1.228 do CC) daquele que responde a demanda judicial permanece existente, vedando-se tão somente atos de disposição patrimonial incomuns, com fito de frustrar execução, presente ou futura. Assim, se um negócio jurídico não diminui o patrimônio do credor, ao contrário, o aumenta, não será o ato praticado em fraude à execução120.

A prova do evento danoso, contudo, sofre alterações em relação ao regime da fraude civilista. Como leciona Araken de Assis121, exigir do exequente que prove a inexistência de

bens penhoráveis – insolvência, portanto – seria um exagero flagrante, com todas as dificuldades inerentes à (quase impossível) prova negativa. Segundo este autor, bastaria a devolução do mandato executivo, juntamente com certidão, confeccionada por oficial de justiça, de que não foram encontrados bens penhoráveis para estar caracterizada a insolvência do executado, com o consequente prejuízo à execução.

O Superior Tribunal de Justiça entende em sentido semelhante. Em julgado da 2ª Turma, de relatoria do Ministro Castro Meira122, embora tenha impingido o ônus da prova ao

credor, a Corte considerou como requisito da insolvência para a caracterização da fraude a inexistência de outros bens penhoráveis ou a insuficiência dos até então apontados.

Caso o executado alegue que não é insolvente caberá a ele, por força do artigo 373, e, mais especificamente, do artigo 829, § 2º, indicar bens, livres e desonerados, à penhora, para que se comprove a possibilidade de satisfazer a execução em curso.

Questões diferentes surgem nesta temática relacionadas ao adquirente do bem alienado em fraude à execução, como, por exemplo: é necessária a existência de má-fé? Se sim, a quem incumbe a prova da má-fé? A averbação da ação, em conformidade com o artigo 828 do

118 Nesse sentido, já decidiu STJ: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial nº 944.250/RS,

Relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 7 de agosto de 2007.

119 THEODORO JUNIOR, Humberto. op. cit., p. 450.

120 Sobre hipótese de permuta imobiliária, em que não se diminui o patrimônio do devedor, cabe aqui citar, para

eventual consulta: CURY BICACLHO, Rodrigo. Permuta Imobiliária e Fraude de Execução. Revista dos

Tribunais. vol. 963/2016, p. 379, jan/2016.

121 ASSIS, Araken de. op. cit., p. 237

122 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial nº 907.941/MS, Relator Ministro Castro Meira,

CPC/2015, faz prescindir da investigação sobre boa ou má-fé? Na ausência do registro da penhora, seria possível cogitar a existência de fraude à execução? O regime de prova seria o mesmo para todos os tipos de bens?

Surge, portanto, mais um elemento na análise da fraude à execução: o adquirente. De fato, além do interesse do credor e do Estado-Juiz surge o interesse de um terceiro, completamente alheio à execução em curso, que verá bem de sua propriedade ser expropriado para satisfação de dívida de responsabilidade de terceiro.

A existência do terceiro-adquirente é, obviamente, um complicador, que gerou calorosas discussões, com algumas decisões privilegiando o crédito exequendo123 e outras

privilegiando a segurança jurídica e a primazia da boa-fé nos negócios jurídicos124.

Buscando pacificar a questão, o Superior Tribunal de Justiça editou, sob a égide do CPC/1973, o enunciado sumular nº 375: “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”. Entretanto, a edição da Súmula nº 375 não foi o suficiente para pacificar a celeuma doutrinária instaurada, sobretudo após a vigência do CPC/2015, o qual trouxe novos contornos à fraude de execução. De fato, até pouco tempo atrás, com o julgamento do tema repetitivo nº 243, havia dissenso dentro da própria Corte de Justiça Superior.

Esta questão é o cerne do presente trabalho, e será abordada adequadamente em capítulo próprio (item 3.3), sendo no presente momento meramente referida.