• Nenhum resultado encontrado

CAPITULO II: UM OLHAR SOBRE AS DISPOSIÇÕES DO PNAE PARA ALIMENTAÇÃO,

2.1 ALIMENTAÇÃO ESCOLAR: COMPREENSÃO E COMPLEXIDADES DO COMER

2.1.1. Alimentação escolar e o PNAE

A alimentação escolar traz várias discussões e debates em sua temática, desde a alimentação enquanto um direito humano até o processo de aquisição de produtos da agricultura familiar. Tornando-se um tema complexo, pois dialoga no processo da cadeia do alimento, desde onde se planta até onde estes produtos viram comida e, assim, é servida para os escolares.

Neste olhar, o alimento enquanto elemento indissociável na educação escolar demonstra que o PNAE traz elementos inter-relacionados de relevância no contexto escolar e, fora dele também, no caso, um mercado alternativo para os agricultores familiares do município. Assim, a Lei nº 11.497/2009, estabelece um diálogo aprofundado no conhecer o alimento, trabalhando com a segurança

alimentar e, ainda, da aproximação com o produtor, quanto ao desenvolvimento sustentável, colocando entre suas diretrizes o resgate da alimentação adequada e saudável; o trabalho de educação alimentar e nutricional, desenvolvendo a valorização de hábitos alimentares e à aquisição de gêneros alimentícios sustentáveis da agricultura familiar local ou regional (MALUF, s/d, pg. 24).

A análise para a alimentação escolar necessita de uma ação reformista, objetivando novos olhares sobre a temática. Esta ação reformista é referenciada por Sonnino e Morgan (2010, pg.74), no sentido de construir gradualmente uma posição ativa do poder público, na promoção de ações intersetoriais, que possam conectar a cadeia do alimento até este chegar à escola, assim mediando produtor e consumidor.

Conforme Sonnino e Morgan (2010, pg.73), as refeições escolares desenvolveram novos rumos para a reforma da alimentação escolar, em que o processo de aquisição de alimentos aparece como uma oportunidade de mercado alternativo para venda de alimentos dos agricultores familiares, fomentando o desenvolvimento de novas cadeias de alimentos locais (circuitos curtos). Para estes autores, observa-se a agregação de valor para o alimento produzido localmente “de qualidade”, porém nem todo alimento produzido localmente é um alimento de qualidade ou sustentável (SONNINO e MORGAN, 2010, pg.74). Estes autores verificam a existência de uma reforma alimentar, em que um novo processo de alimentação escolar está em curso, um processo que vinculada diretamente o consumo escolar à produção do alimento, assim surgindo um sistema de alimentação baseado na qualidade, com novos valores culturais.

Menasche (2002, pg.4), num estudo realizado no Estado do Rio Grande do Sul, sobre os riscos à mesa pela inserção dos alimentos industrializados e transgênicos, traz a observação sobre um contexto alimentar obscuro (desconhecido), referente à procedência e trajetória do alimento e sua composição até chegar à disposição dos consumidores. A autora coloca que, diante disso, ocorre um processo de distanciamento entre produtor e consumidor com relação aos alimentos consumidos.

Considerando o comentário da autora, é observado que o PNAE traz uma ação que contempla esta incorporação da aproximação entre produtor e consumidor, dialogando dentro de uma mesma política, em que o benefício é mútuo para os dois lados, tanto para os escolares quanto para os agricultores familiares.

Assim, esse processo do distanciamento da cadeia do alimento se reduz, tornando mais próximo os consumidores, os alunos.

A retomada do elo entre produtor e consumidor, com caminhos mais estreitos e curtos, possibilitou a agregação significativa da aquisição de alimentos “naturais” em oposição ao artificial. Segundo Menasche (2002, pg.13), o alimento “natural” é “aquele fresco, caseiro, tradicional, puro e saudável”, já o alimento artificial é “aquele processado, industrializado, distante e moderno”. Assim, percebe- se um novo entendimento do significado do alimento na escola, em que o programa promove a valorização e preocupação com os alimentos para os escolares.

Maluf (2009, pg.3) questiona sobre o papel da escola ao fornecer comida. Caberia a um ambiente escolar dispor de cozinha e não possuir uma biblioteca? Qual é o propósito de frequentar a escola para os escolares? Apenas vão para assistirem as aulas? Ao mesmo tempo, o autor lembra que é necessário ponderar que a cozinha serve como um ambiente educativo, não se limitando apenas a ser um ambiente de preparação de refeição.

Considerando o autor, entende-se que a alimentação apresenta-se como uma importante variável de análise, pois como é uma linguagem, em que se têm prescrições, proibições, significados, que acompanham o alimentar e o consumo do ser humano. O comer dos indivíduos tem uma relação construída por base de diferenças. O comer de cada indivíduo vai depender de seu estado nutricional, do fator idade, da situação social (classe), do contexto do ambiente, das questões culturais, o que gera uma identificação pessoal ou em grupo em torno do ato de se alimentar. Nessa dimensão, a alimentação simboliza o contato diário com a vida e com a participação social dos indivíduos no mundo (identidade) (ROTENBERG; VARGAS, 2004, pg.86; MACIEL, 2001, pg.146).

Abreu (1995, pg.17), ao tratar da merenda escolar, apresenta uma discussão quanto ao fato de o PNAE ter por objetivo que a alimentação servida nas escolas atenda 15% das necessidades nutricionais diárias dos alunos. O autor reflete que esse percentual refere-se ao período que o escolar permanece na escola, para se pensar a alimentação fornecida no intervalo das aulas. Para o autor, se pensarmos que para alguns alunos a merenda escolar é a “única” refeição diária, torna-se insuficiente a ação do Programa. Neste sentido, estima-se que 85% das necessidades nutricionais dos escolares não são atendidas, assim não atuando adequadamente sobre a “fome do dia” (ABREU, 1995, pg.9).

De acordo com Abreu (1995, pg.17):

“A merenda só pode deixar de ser "comida para carente" se as políticas públicas de alimentação escolar, reconhecendo a situação de pobreza e miséria da maioria dos alunos da escola brasileira, garantirem o fornecimento de mais de uma refeição diária, sendo uma delas administrada quando a criança entra na escola” (ABREU, 1995, pg. 17).

A merenda escolar, dentro do PNAE, traz uma proposta de fornecer uma parte dos nutrientes alimentares que os alunos necessitam enquanto permanecem na escola. Serve, assim, como uma ação promotora de saúde ao processo da educação, em que suas ações dirigem a educação alimentar, a hábitos alimentares saudáveis e à educação de consumidores (SILVA; BOCCALETTO, 2010, pg.25, ABREU, 1995, pg.9).

Na sequência, será abordada a contextualização da alimentação escolar enquanto uma ação de saúde, estabelecendo um diálogo com os aspectos nutricionais, biológicos e sociais da alimentação, abordando o saudável na alimentação escolar via o PNAE.