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Alteração do estado de tensões no maciço envolvente

5 M ODELAGEM N UMÉRICA

5.1 F ENÔMENOS ENVOLVENDO A ESCAVAÇÃO DE TÚNEIS EM SOLO

5.1.1 Alteração do estado de tensões no maciço envolvente

Sob um ponto de vista mecânico, o ato de se escavar subterraneamente um maciço de solo, previamente em equilíbrio, resulta na remoção das tensões ao longo da superfície escavada. Dessa maneira, à medida que avança a frente de escavação do túnel, o campo de tensões do maciço envolvente é significativamente alterado.

De modo geral, este mecanismo origina um movimento da frente de escavação em direção à cavidade criada, assim como também uma convergência das paredes, até que um novo estado de equilíbrio seja alcançado. Este novo estado de tensões pode ser atingido com uma mobilização parcial ou total da resistência do maciço, a qual pode ser complementada pela adição de sistemas auxiliares de suporte.

Em casos menos freqüentes, o equilíbrio final pode ser atingido sem a necessidade de uma estrutura de suporte. Nestes casos, o maciço é considerado autoportante, capaz de suportar o descarregamento ocasionado pela remoção das tensões no contorno da escavação, em condições de estabilidade e com deformações limitadas.

Para o caso de túneis em solos, de maneira geral, a instalação de sistemas de suporte é praticamente obrigatória, o mais próximo possível da frente de escavação, devido à necessidade de controle de grandes deformações ou simplesmente pelo fato do maciço ter sua resistência totalmente mobilizada (não autoportante).

As deformações permitidas ao maciço, antes e após a instalação da estrutura de suporte, acarretam em redistribuições de tensões para zonas vizinhas não escavadas, o que se denomina efeito de arco. Segundo Langer e Stockmann (1985), o arqueamento das tensões somente ocorre quando há mobilização de resistência ao cisalhamento do maciço envolvente. Esse fenômeno pode ser melhor compreendido ao se analisar uma faixa de solo situada acima da abóbada do túnel, como ilustrado na Figura 5.1. Os elementos A, B e C situam-se exatamente no perímetro da escavação, antes da execução da abertura; após a escavação, o elemento A se desloca mais do que o elemento B, o qual se desloca mais do que o elemento C. Essa diferença de deslocamento induz tensões de cisalhamento entre os elementos e, caso o maciço seja incapaz de mobilizar sua resistência ao cisalhamento, os elementos se deslocam por igual e o túnel entra em colapso.

Figura 5.1 – Mobilização da resistência ao cisalhamento devido ao efeito de arco, a partir de França (2006)

Eisenstein et al. (1984) salientaram que o arqueamento das tensões não ocorre apenas na seção transversal do túnel, como ilustrado na Figura 5.2. Mecanismos análogos também se desenvolvem em seções longitudinais verticais e horizontais, sendo responsáveis pelas transferências de tensões da região já escavada (ainda sem suporte) para a região ainda não escavada à frente e para o suporte (situado logo atrás).

Efeito de Arco Longitudinal

Plano Vertical (Perfil B-B)

z y

Efeito de Arco Longitudinal

Plano Horizontal (Vista em Planta)

y x

Efeito de Arco Transversal

Plano Vertical (Perfil A-A) z x A B B A

Figura 5.2 – Natureza tridimensional do arqueamento das tensões nas proximidades da frente de um túnel com suporte, a partir de Eisenstein et al. (1984)

Assim sendo, pode-se afirmar que o efeito de arco nas proximidades da frente de escavação de um túnel, o qual é responsável pela redistribuição das tensões no interior do maciço, é de natureza essencialmente tridimensional.

Em se tratando das tensões principais, o arqueamento também é observado na alteração das rosetas de tensões. Em um maciço com superfície horizontal, como o ilustrado na Figura 5.3, as tensões principais maiores e menores coincidem com os eixos vertical e horizontal. Após a escavação da abertura, as tensões cisalhantes mobilizadas pelo efeito de arco ao redor do túnel causam a rotação das direções das tensões principais, uma vez que os planos de cisalhamento nulo não mais coincidem com os planos vertical e horizontal.

Figura 5.3 – Ilustração da alteração das direções das tensões principais antes e após a escavação de um túnel, a partir de França (2006)

De acordo com Almeida e Sousa (1998) e França (2006), a influência da abertura do túnel é sentida adiante da frente de escavação, como ilustrado na Figura 5.4.

Na região adiante da frente de escavação, os deslocamentos ocorrem fundamentalmente na direção longitudinal. Com o avanço do túnel, esta componente longitudinal dos deslocamentos cresce e atinge um valor máximo no momento da passagem da frente de escavação, começando a diminuir com o afastamento da frente até se anular a certa distância. De maneira contrária, os deslocamentos radiais aumentam bruscamente no momento da passagem da frente de escavação, não variando após o afastamento da frente. As variações dos deslocamentos longitudinais e radiais podem ser observadas na Figura 5.5.

deslocamentos radiais deslocamentos longitudinais < 4 D zona de influência da frente (estado tridimensional) zona de estabilização (estado bidimensional) zona não perturbada (estado bidimensional) D

Figura 5.5 – Zonas características do maciço em relação aos estados de deformação, a partir de Almeida e Sousa (1998)

Observa-se que os deslocamentos longitudinais não são nulos durante o avanço da frente de escavação, mas que eles podem ser desconsiderados na situação final de equilíbrio se comparados aos deslocamentos radiais. Com isto, pode-se concluir que a escavação de um túnel origina nas proximidades da frente de escavação uma zona do maciço onde o estado de deformação é de natureza tridimensional, sendo o equilíbrio final atingido numa zona onde a influência da frente já não é sentida e em condições muito próximas de um estado plano de deformação.

Na maioria dos casos práticos, o efeito da escavação é sentido até aproximadamente dois diâmetros adiante e dois diâmetros atrás da frente de escavação, conforme afirmam Almeida e Sousa (1998) e França (2006).

O desenvolvimento da zona de influência da frente de escavação é determinado, fundamentalmente, pelas características do maciço e do sistema de suporte instalado, de acordo com Almeida e Sousa (1998) e Galli et al. (2004).

Segundo Shahrour e Ghorbanbeigi (1996), quanto menor a resistência do maciço, maior é o desenvolvimento da zona plastificada e conseqüentemente maior a distância necessária para o estabelecimento do equilíbrio final e da condição de estado plano de deformação. De maneira análoga, a influência da escavação é sentida tão mais adiante da frente quanto menor a resistência do maciço. De acordo com Almeida e Sousa (1998), havendo sistema de suporte, independentemente do comportamento do solo, a condição de deformação plana é alcançada a uma distância de sua instalação não maior do que um diâmetro. Em relação ao sistema de suporte utilizado, Shahrour e Ghorbanbeigi (1996) afirmam que quanto mais rígido e mais rápido ele for instalado, mais próximo do local de sua instalação ocorrerá o estabelecimento do equilíbrio final.