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Alterações da postura da coluna vertebral no plano sagital

1.3. Postura

1.3.1. Alterações da postura da coluna vertebral no plano sagital

Uma postura desadequada não é considerada saudável porque envolve a não harmonia e a não eficiência, colocando sob stresse (tensão) excessivo os vários tecidos corporais (Mosculino, 2008). Músculos sob stresse excessivo, por qualquer motivo, poderão perder a capacidade de contração adequada ou causar um encurtamento excessivo (contratura). As contraturas originam perda de movimento, perda de estabilidade e envolvem o desenvolvimento de deformidades (Jacques, 2002). No plano sagital, os principais fatores que conduzem ao desequilíbrio postural, modulando a posição da cabeça e do tronco, são as alterações podais, as perturbações do sistema estomatognático e as alterações ao nível da pele (Bricot, 1999). As alterações posturais estáticas originam uma perturbação estática mais ou menos complexa que envolve forças contrárias (agindo nas superfícies articulares das vértebras) e solicitações músculo-ligamentares excessivas, o que pode conduzir ao aparecimento de lesões. Qualquer alteração das cadeias musculares posturais tem como consequência uma perturbação do tónus postural. O tónus postural, definido como o estado de permanente contração dos músculos do corpo, permite vencer a força gravítica e manter a postura corporal (Bricot, 1999; Mosculino, 2008).

Fatores relacionados com a composição corporal, tais como a estatura, o peso, a constituição física, a postura, variáveis relacionadas com a condição física e variáveis de composição corporal (Helliövaara, 1989; Plowman, 1992), estão associados a aumento do risco de desenvolvimento de alterações posturais (Araújo et al., 2014; Silva, 1999). A coluna vertebral está dependente do controlo e suporte proporcionado pelos ligamentos e músculos para a sua função e é também influenciada pelos músculos proximais dos membros (Jull, 1986; Ng, Richardson, Kippers & Parnianpour, 1998).

O sistema estomatognático, ou o aparelho manducatório pelas palavras de Bricot (1999), faz parte integrante do sistema postural na medida em que é uma área de união entre as cadeias musculares anterior e posterior. Desde a década de 90 que a relação funcional entre a coluna cervical e a torácica bem como a configuração das regiões torácica e pélvica foram consideradas fundamentais, em particular no que diz respeito à relação da coluna com a mandíbula e a postura corporal (Lippold, Danesh, Schilgen, Drerup & Hackenberg, 2006; Nobili & Adversi, 1996; Rocabado, 2006; Solow & Sandham, 2002; Valdez, 2002). A mandíbula e a língua estão associadas à cadeia muscular anterior, em que o osso hióide tem um papel fundamental. Por sua vez, através do crânio, a maxila interliga-se com as cadeias posteriores. A existência de núcleos do nervo trigémio ao longo do tronco cerebral e a presença de aferentes para as formações que intervêm no equilíbrio tónico postural são outras das razões consideradas e que justificam o papel fundamental do eixo mandíbula-crânio-sacro (Bricot, 1999).

Na prática clínica são relativamente comuns um conjunto de padrões de alteração postural da coluna vertebral. A cabeça protraída (mantida anteriormente) é um padrão frequente que resulta de uma redução da curvatura lordótica normal. Mais precisamente, verifica-se uma curvatura cervical inferior hipolordótica, projetando a cabeça anteriormente, e uma curvatura cervical superior hiperlordótica, elevando os olhos para a frente. Para que a cabeça e o pescoço não caiam em flexão, esta postura envolve a contração isométrica dos músculos posteriores do pescoço. Um outro padrão comum é a hipercifose da coluna torácica. A acentuação do padrão cifótico da coluna torácica tem como consequência uma limitação da cavidade torácica, reduzindo a capacidade de expansão pulmonar na respiração profunda. Esta situação está interligada com o padrão anterior, ou seja, a curvatura hipercifótica torácica leva à retificação da lordose cervical inferior e à acentuação da lordose cervical superior. Por último, destaca-se ainda o padrão de hiperlordose da coluna lombar. Neste caso, há uma acentuação da curvatura da coluna lombar (lordose ou hiperlordose) consequente da inclinação anterior da pélvis. Deste modo, o suporte do peso do corpo ocorre posteriormente. Este padrão associa-se ao aparecimento de outras alterações posturais como ao aumento da cifose torácica, à anteriorização ou arredondamento dos ombros para a frente e à postura de cabeça protraída (Mosculino, 2008). Lippold et al. (2006) apresentam um esquema com dois padrões posturais, no plano sagital, da coluna vertebral (Figura 2), que representa simplificadamente um padrão postural com acentuação das curvaturas da coluna (a) e um outro padrão onde há retificação dessas curvaturas (b).

Figura 2. Representação esquemática de dois padrões posturais, no plano sagital, de Lippold et al. (2006, p. 784). Em (a), verifica-se uma postura craniofacial distal e vertical, com acentuações das curvaturas torácica e lombar e aumento do ângulo pélvico; em (b), representa-se uma postura craniofacial mesial e horizontal, com retificação das curvaturas torácica e lombar e diminuição da angulação pélvica.

Roussouly e colaboradores (Roussouly, Gollogly, Berthonnaud & Dimnet, 2005; Roussouly & Nnadi, 2010) propõem uma classificação do alinhamento da coluna vertebral no plano sagital, a qual está representada na Figura 3. Esta classificação baseia-se na relação espacial dos corpos vertebrais para definição dos segmentos torácico e lombar da coluna, sendo denominado de ponto de inflexão o ponto onde esta alteração espacial acontece (Roussouly & Nnadi, 2010). O padrão postural Tipo I representa uma relação de 80:20 entre o comprimento da curvatura torácica (CT) e o comprimento da curvatura lombar (CL), estando o ponto de inflexão situado ao nível da terceira e quarta vértebras lombar (L3/L4). Verifica-se cifose toracolombar. O número de vértebras constituintes da lordose sacral é igual ou inferior a três. No Tipo II, a curvatura cifótica é menos acentuada e a curvatura lordótica tem uma aparência aplanada, apresentando uma relação de 60:40. A inclinação do sacro é menor que 35º e o número de vértebras na lordose lombar superior a três. Por sua vez, a tipologia III é caracterizada por uma inclinação do sacro entre 35,5º e 44,4º, estando o ponto de inflexão ao nível da décima segunda vértebra torácica e primeira vértebra lombar (T12–L1). A coluna vertebral está bem equilibrada, havendo um padrão postural no plano sagital neutro, com relação 50:50 entre CT e CL. Finalmente, no Tipo IV verifica-se um ponto de inflexão ao nível de T9–T10 e uma relação

Figura 3. Variações da postura sagital da coluna vertebral atendendo à relação ente o CT e o CL, segundo Roussouly e Nnadi (2010).

Araújo et al. (2014) fazem o paralelismo entre os parâmetros antropométricos e as variações da postura da coluna vertebral no plano sagital com base na classificação de Roussouly (Roussouly, Gollogly, Berthonnaud & Dimnet, 2005; Roussouly & Nnadi, 2010). O excesso de peso e a obesidade levam a uma retroversão pélvica, o que favorece o desenvolvimento de uma postura muito alterada da coluna no plano sagital, nomeadamente uma reduzida lordose lombar (Tipo I ou II). Por sua vez, o excesso de peso também está associado a uma postura do Tipo IV, o que aponta para a tendência de a gordura favorecer o aumento das curvaturas da coluna sagital. À medida que a MG aumenta, na obesidade, são adotadas alterações pélvicas que superam essa hipercurvatura e a pessoa obesa passa a apresentar uma postura hipolordótica do Tipo I (a única postura onde não se verifica nenhuma harmonia entre as curvaturas naturais da coluna vertebral). Concluindo, a retroversão pélvica vai sendo adotada devido às limitações funcionais decorrentes da obesidade (Araújo et al., 2014). Mosculino (2008) acrescenta que, nestes casos, o peso do abdómen atira o centro de gravidade do tronco inferior para a frente pelo que há um contrabalanço por parte do tronco superior, o qual se desvia posteriormente.