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3.2.1 Déficits olfativos em adultos

As alterações de olfato ocorrem, usualmente, de uma das três maneiras a seguir descritas. A primeira forma delas é caracterizada pela redução da intensidade, resultando em um decréscimo da sensibilidade olfativa (hiposmia ou anosmia). Outro tipo ocorre quando o cheiro inalado não tem o mesmo odor ou cheiro como é lembrado (parosmia). A última forma de alteração é a percepção de um cheiro quando não há nenhum tipo de odor

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no ambiente (fantosmia ou alucinação olfatória, com a diferença de o primeiro durar alguns poucos segundos a mais que o segundo) (43).

Outros termos também utilizados para descrever alterações do olfato incluem disosmia (qualquer redução ou distorção do olfato), cacosmia (para a percepção de um cheiro ruim independente ou não da presença de um estímulo com este cheiro) e euosmia (parosmia agradável a odores selecionados). Tanto 'cacosmia' quanto 'euosmia' fazem parte de uma 'parosmia' (43).

Os déficits de olfato podem ser classificados em três categorias quanto a sua etiologia: perdas condutivas decorrentes da obstrução das vias nasais, danos no neuroepitélio olfativo, caracterizando uma causa neurossensorial, ou disfunção central. Nenhuma destas categorias é mutuamente exclusiva (2). Existe uma tendência em se classificar estas distorções do sentido do olfato como centrais ou periféricas. Isto parte de algumas observações de que certas causas centrais (afecções que comprometam o sistema nervoso central, como tumores do lobo frontal, por exemplo) podem gerar alterações diferentes de causas periféricas (como rinite, ou perda do epitélio nasal por infecção respiratória aguda). Entretanto, essa correlação ainda é assunto de controvérsia (44).

Em alguns casos, o tipo de perda pode orientar a busca da causa. Na etiologia periférica por lesão do epitélio nasal, as distorções olfativas podem ser assimétricas (ou seja, maior, ou única, em uma das narinas) (43).

As alterações olfativas podem ser decorrentes de muitos fatores, sendo que cerca de dois terços destas alterações em forma crônica são decorrentes de infecções em vias aéreas superiores, traumatismo cranioencefálico e desordens dos seios nasais e paranasais. Entre outros importantes fatores que podem influenciar a acuidade olfativa encontram-se a idade, tabagismo, sexo, desordens intracranianas, neoplasias intranasais ou intracranianas, epilepsia, doenças psiquiátricas, entre outras (33).

A disfunção olfativa é uma característica importante encontrada em doenças neurodegenerativas, como a Doença de Parkinson (DP) e a Doença de Alzheimer (DA). A maioria dos pacientes com DP e DA não têm conhecimento deste déficit olfativo, embora ele esteja presente em 85 a 90% dos pacientes em estágio inicial da doença. Há evidências de que a perda olfativa preceda os sintomas clássicos de DP e DA em muitos anos (33).

13 3.2.1.1 Correlações anatomoclínicas

Na DP e DA ainda existe uma grande controvérsia sobre a correlação anatomoclínica do déficit olfativo. Isto porque vários estudos mostraram as mais variadas alterações anatômicas nas vias olfativas incluindo atrofia macroscópica, alterações de conectividade, perda neuronal, acúmulos proteicos potencialmente tóxicos (alfa-sinucleína, proteína tau e beta-amilóide, entre outras), e até mesmo aumento de células dopaminérgicas (45–48). Estas alterações foram encontradas tanto em regiões periféricas (epitélio olfativo) como centrais (bulbo, córtex primário e córtex secundário) (49,50).

Em relação ao traumatismo cranioencefálico (TCE), é descrito que as alterações olfativas podem ser decorrentes de contusões sinonasais ou fraturas nasais, do retalhamento de filamentos do nervo olfatório ou confusão intracraniana e hemorragia em regiões olfatórias do cérebro (51). O mecanismo mais comum de alteração olfativa através de TCE é a lesão do nervo olfatório a nível da placa cribiforme, uma vez que os golpes ou contraforças repentinas podem lesar facilmente as fibras deste nervo. Assim como no adulto, a alteração de olfato na criança está associada com traumatismos mais severos (52). Já a rinossinusite crônica pode ter em sua etiologia tanto fatores condutivos como sensorioneurais, dentre eles a obstrução nasal causada por pólipos, o edema da mucosa respiratória e as inflamações do neuroepitélio olfatório (53). Outros fatores associados à rinossinusite podem afetar a função olfativa, como tabagismo e idade.

A idade, por sua vez, é um outro fator que influencia na acuidade olfativa, pois há um decréscimo da superfície do epitélio olfatório com o passar dos anos, sendo esta a principal razão dos distúrbios olfativos em pessoas mais velhas (54). Além disso, Pinto et al (3) relatam que, com a idade, a maior exposição a agentes poluentes e tóxicos pode contribuir tanto para danos diretos ao SNC quanto para a perda da capacidade regenerativa do sistema olfatório.

Esta influência da idade mostra que o melhor desempenho olfativo ocorre no adulto jovem. Ele se desenvolve na criança à medida que esta se desenvolve e vai entrando em contato com um maior número de aromas, atinge seu ápice na idade adulta e, com o envelhecimento, começa a haver o decréscimo desta capacidade. A figura abaixo demonstra este fato (FIGURA 6).

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Figura 6- Performance olfativa ao longo da vida Fonte: modificado de Sorokowska et al (30)

3.2.2 Alterações de olfato na população pediátrica

A percepção de informações olfativas se desenvolve desde a primeira infância. Pesquisas indicam que o ser humano é capaz de reagir a estímulos olfatórios já desde a vida fetal. Lactentes e crianças pequenas são capazes de cheirar e distinguir os odores, o que lhes fornece importantes informações sobre alimentação e meio ambiente (28). Elas são também capazes de distinguir os cheiros naturais da mãe e aromas artificiais (55). Durante toda a vida, o contato com um número cada vez mais variado de aromas estimula o desenvolvimento deste sentido e, por esta razão, a capacidade de nomear e relembrar odores é menor na criança do que no adulto (28).

Nos adultos, é bem estabelecida a correlação entre o déficit olfativo e a existência de algumas patologias neuropsiquiátricas, e a avaliação do olfato é vista como uma ferramenta diagnóstica para muitas destas patologias. A identificação precoce destes déficits pode garantir ao indivíduo maior qualidade de vida, uma vez que permite uma intervenção precoce e um tratamento mais eficaz.

Na população pediátrica, atualmente, patologias neurológicas e neuropsiquiátricas têm sido incluídas no leque de desordens que podem levar a alterações de olfato. Exemplos disto são a Síndrome de Kallmann e outras patologias mais comuns, como as desordens do

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desenvolvimento, incluindo autismo e déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), nas quais a correlação com o déficit de olfato vem sendo estudada (27).

Entretanto, estes estudos são escassos na literatura e, embora o valor da população pediátrica com déficits olfativos seja menor do que na população adulta, sabe-se que o aprendizado olfativo é bastante significativo durante a infância e, portanto, a identificação de déficits olfativos nesta faixa etária pode ser importante para o desenvolvimento normal da criança (15).

Assim, testes que detectam alterações no olfato são importantes tanto para o diagnóstico precoce de algumas patologias, quanto para o entendimento de aspectos ainda pouco conhecidos das alterações do neurodesenvolvimento (27).

Contudo, embora existam exames olfativos para adultos, faltam ferramentas para avaliar o olfato em crianças pequenas (28) e, no Brasil, estes testes são inexistentes. Nestas lacunas existentes na literatura, encontra-se o objetivo deste trabalho, em buscar uma ferramenta diagnóstica eficaz e aplicável à população pediátrica.

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